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GOVERNO BOLSONARO
Entre o presidencialismo de coalizão e o presidencialismo de coerção
Thiago Flamé
São Paulo

Qual o significado das eleições para a presidência da câmara para o governo Bolsonaro e a reforma da previdência, dessa disputa de velhos oligarcas como Renan, Rodrigo Maia ou o sinistro Davi Alcolumbre? Desenvolvemos aqui algumas reflexões iniciais.

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Entre a multidão de análises que circularam entre sábado e domingo refletindo o resultado das eleições no Congresso, impressiona a falta de um consenso mínimo entre os analistas. Vitória do governo? "Vitória de Pirro"? Fortalece a reforma da previdência, enfraquece? Entre esses polos opostos se dividem as análises.

Para colocar um exemplo, trazemos duas análises que apontam caminhos opostos de interpretação. Reinaldo Azevedo é dos que defende que foi uma "vitória de Pirro" para o governo a eleição do Senado, que Bolsonaro impôs seu candidato, mas a um custo tão alto, que o preço seria pior que uma derrota. No pólo oposto, para Luis Nassif, a vitória do governo foi enorme, teria mostrado a força da Lava Jato, de Moro em aliança com o Bolsonarismo. Os próximos passos dessa aliança seriam a disputa pela PGR e pelo próprio Supremo.

O que explica análises tão díspares do mesmo fato é o grau de complexidade que a disputa alcançou e os inúmeros interesses diferentes, e até contraditórios, envolvidos. É impossível analisar se o governo vence ou é derrotado nessas eleições do legislativo sem incorporar na análise os diferentes polos de poder que integram o condomínio bolsonarista no governo. Bolsonaro e o núcleo ideológico do governo, e os dois superministros, Paulo Guedes e Moro. Dos dois lados, oligarcas, corruptos, que buscam as melhores condições para se aferrar ao poder e descarregar a crise sobre as costas da classe trabalhadora.

Guedes e os generais, como coloca Azevedo, torciam em silêncio pela vitória de Renan, antes do que um tresloucado Davi Alcolumbre da estirpe de um Severino Cavalcanti, do qual não se sabe o que esperar. Guedes particularmente apostava em ter uma interlocução direta com o Senado (na Câmara Rodrigo Maia já lhe garante isso) pela via de Renan e escantear de uma vez por todas Onyx do comando da articulação política. Do outro lado, como coloca Nassif, o Bolsonarismo blocado com a Lava Jato obtém uma vitória importante no Senado, ainda que não vemos um bloco coeso entre essas duas alas, como vê Nassif. Foi deslocado o grupo de oligarcas do MDB que controla o Senado como se fosse uma dinastia, mas não em proveito de nenhuma nova politica, mas sim do que existe mais sombrio e retrógrado na política brasileira, o bolsonarismo representado na figura até então desconhecida de Davi Alcolumbre. O governo ganha, mas o governo perde. Poderia ser mais confuso?

Duas formas de governabilidade em disputa

Na Câmara venceu o tradicional presidencialismo de coalisão, no qual o governo tem que compor com diferentes partidos para passar seus projetos, pagando um preço alto em cada negociação. É o sistema que tem imperado desde a constituinte de 1988 até o governo Temer, a chamada velha política que Bolsonaro tanto critica, cada vez mais degradada, corrupta e pulverizada, com o chamado baixo clero, mais fisiológico que qualquer outra coisa, com um peso crescente.

A eleição no Senado, e nisso concordamos com Nassif, significou uma escalada dos métodos autoritários da Lava Jato indicando outra forma de governabilidade. Bolsonaro já apontava nesse sentido quando se recusou a negociar com as direções partidárias o apoio ao governo e o fez com líderes de bancadas temáticas. Nisso não há nada de nova política, são os herdeiros diretos da ditadura, o DEM veio da Arena e o PSL é povoado de militares golpistas – corruptos, autoritários e repressores, como sempre foi a elite escravista brasileira.

As denúncias contra Renan vindas da justiça se avolumaram na reta final e os métodos autoritários da Lava Jato se impuseram, mobilizando a internet, vazamento de conversas gravadas, e Alcolumbre no estilo de golpe dentro do golpe, pisoteou o regimento interno no Senado e passou por cima, na prática, de uma decisão do STF. Não foi a vitória de nenhuma “nova política”, mas dos mesmos métodos autoritários que serviram para tirar Dilma da presidência e manipular as eleições com a prisão de Lula. Poderíamos chamar essa forma de presidencialismo de coerção, por que ao invés de conquistar a maioria com propina e cargos, seria através da chantagem, das denúncias de corrupção e da imposição pura e simples que essa maioria seria alcançada, o que evidentemente não excluiu as propinas para os amigos. Mesmo com esse conjunto de métodos a votação foi apertada, apenas 41 votos, um a mais que metade.

No Senado era onde o governo Bolsonaro tinha uma base de apoio menos sólida e se impôs na marra. Não se pode descartar que os próximos passos na agenda do presidencialismo de coerção seja intensificar os ataques jurídicos aos opositores e ao próprio Renan se esse abandonar seu apoio a reforma da previdência, mas o fundamental a se ter em conta é o deslocamento da oligarquia tradicional que certamente vai oferecer resistência para manter suas posições. Isso não significa o fim do balcão de negócios no Senado, mas que as negociações se darão agora em outros termos.

Na Câmara, Rodrigo Maia já anunciou um longo processo de negociação para a aprovação da reforma da previdência. Apesar disso, essa negociação pode ser facilitada pelo fato de que um grande número de deputados não apoia diretamente o governo, mas sim apoia a reforma da previdência.

Passado o momento mais alto da disputa, veremos agora como se encaixam as peças no novo tabuleiro. O caminho tradicional, do presidencialismo de coalizão pode dar seus frutos lentos na Câmara, onde a oligarquia se unificou com o baixo clero para garantir Rodrigo Maia. A situação no Senado impõe dificuldades para um retorno a negociações com a velha oligarquia do MDB, uma negociação agora mais custosa tanto pelos rancores dos derrotados como por quanto se mobilizou de Lava Jato e opinião pública, e ao mesmo tempo essa negociação se fará mais necessária para obter maioria para a reforma, salvo se os métodos de presidencialismo de coerção aumentarem ao já utilizado, o que levaria a uma situação imprevisível.

Também as disputas de bastidores que seguem se desenvolvendo em torno do caso Flávio Bolsonaro e da ligação dos Bolsonaro com as milícias, podem fazer mais uma vez as diferenças no interior do governo virem ao primeiro plano novamente. Existe uma grande unidade em torno da reforma da previdência, mas no marco de projetos de poder conflitantes entre si.

O papel da oposição no Congresso foi vergonhoso. Em nome de um lugar na mesa diretora, o PCdoB (além do PDT de Ciro Gomes) apoiou Maia no Congresso e o PT Renan do Senado, ambos favoráveis à reforma da previdência. O PSOL na Câmara, de olho em ocupar o espaço do PT, formou um bloco que incluiu até um partido burguês e golpista como o PSB. A conciliação de classes e os métodos da oposição parlamentar serão impotentes, e já estão sendo, para enfrentar Bolsonaro, a Lava Jato e a extrema direita. Os postos no parlamento deveriam ser utilizados para fortalecer a mobilização fora do parlamento.

O que vai prevalecer no próximo período imediato, a unidade reacionária para a aprovação da reforma, ou as disputas de poder? Veremos nos próximos dias, mas se uma boa notícia tivemos na última semana, ela não vem do Congresso, nem dessas disputas de bastidores e sim do terreno da luta de classes: da GM de Gravataí uma mobilização dos operários fez a empresa retroceder dos seus ataques, no Metrô de São Paulo uma nova mobilização pode estourar contra os ataques de Doria e da direção da empresa. Seja do caso de um governo mais forte e unificado para aprovar os ataques, seja numa situação melhor em que o governo esteja atravessado ainda por fortes disputas, temos motivos para acreditar que a reforma da previdência, chamada de a “mãe de todas as reformas”, não vai passar sem resistência.

 
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