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ARTE & CULTURA
Produção artística de combate
Afonso Machado
Campinas

Vivemos numa época maluca em que a miragem vale mais do que aquilo que podemos tocar. A reprodução da imagem desperta um interesse maior do que a coisa que ela representa.

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Assim pessoas flutuam horas e horas através de mensagens nos celulares, conversando em tempo real com quem está num outro local, trocando fotos , vídeos e textos curtíssimos que registram fatos(sobretudo de ordem pessoal). Curiosamente muitos não trocam ideias com quem está a meio metro de distância. É exatamente o que rola quando cinco pessoas saem para jantar juntas e, aguardando a bebida e a comida na mesa, mergulham em seus celulares e não se comunicam entre si. O mesmo pode se suceder num ônibus quando duas pessoas, que pertencem ao mesmo Partido político ou estudam na mesma Faculdade, mal se cumprimentam. Será que este profundo estado de alienação social só poderá nos levar a conclusões políticas e culturais pessimistas? Não! A questão é que as novas mídias possuem dialeticamente outras possibilidades políticas. Neste sentido a arte política ganha uma projeção inédita na história da humanidade.

O acesso à informação e aos bens culturais(refiro-me especificamente a músicas, filmes, textos etc) não envolve grandes barreiras hoje em dia. Qualquer trabalhador pode ter acesso e compartilhar informações artísticas, de modo que a busca pela diversão, pela distração, encontra seu pequeno oásis no celular. Entretanto, não se pode perder de vista a natureza da relação política que as massas estabelecem com imagens e sons no contexto digital. É perigoso dissociar informação de formação. Informar-se não representa nenhum obstáculo no Brasil contemporâneo: a overdose de fatos sociais é uma realidade cotidiana que vem embalada através das novas mídias. O problema surge quando nos indagamos sobre quais são os instrumentos teóricos que a população possui para interpretar aquilo que os seus sentidos experimentam. A visão adquire um peso maior do que os outros sentidos. Historicamente falando encontramos a raiz da questão no processo fotográfico, na revolução cinematográfica e finalmente na explosão da informática. Sem munição crítica as piores mentiras, as invenções mais cabeludas, as mais escandalosas histórias da carochinha e os produtos estéticos mais rasteiros empenhados na manipulação política, são percebidos como coisas naturais, como coisas verdadeiras.

É um grande paradoxo o fato das tecnologias digitais aproximarem o conhecimento das pessoas ao mesmo tempo em que a imensa maioria não possui ferramentas adequadas para ler/interpretar o que se passa. Porém, seria pura bundamolice cairmos em diagnósticos apocalípticos. Como já foi defendido em outras ocasiões nesta mesma coluna, as transformações radicais que as técnicas de reprodução trouxeram para a arte(e devemos a Walter Benjamin e Bertolt Brecht esta sacada) implodiram as barreiras entre produtor e espectador, entre escritor e leitor. Mobilizar trabalhadores para fazer arte é uma necessidade política que corresponde à realidade técnica do nosso tempo. Promover experiências estéticas de choque, que visam a reflexão crítica e o estranhamento no cotidiano, é uma atitude politicamente consequente no interior do mundo digital.

Militantes da cultura são chamados na chincha para lidar com as possibilidades progressistas, com as novas práticas artísticas que podem se desenvolver neste mundo de pequenas e grandes telas. Tudo leva a crer que prazer e combate, crítica e distração não podem ser percebidos como coisas contrárias. Lutar para que os momentos de lazer não sejam a prolongação do trabalho alienado, exige naturalmente uma atenção especial às potencialidades políticas das intervenções artísticas. Um passo decisivo já foi dado por alguns artistas e militantes que arrancaram a palavra “arte” das alturas da estratosfera. O atual momento impõe cada vez mais a necessidade de concebermos a atividade artística enquanto atividade social: assim como uma bicicleta ou um secador de cabelo a obra de arte é um produto. Certo, nem todas as atividades produtivas são adequadas para expressar sentimentos e ideias. Todavia se situamos o fazer artístico no plano da produção social, então poderemos sair do velho labirinto idealista em que as obras de arte surgem como belos objetos que caem do céu.

É claro que quando nos referirmos ao significado histórico de romances, pinturas e peças de teatro, acabamos focando nossa atenção nos problemas da consciência e da representação da realidade; ou seja, como uma determinada obra tematiza por exemplo a exploração capitalista. Mas atentos ao recado de Benjamin, precisamos nos perguntar como nossas práticas culturais e artísticas não apenas referem-se às relações de produção mas como elas se inserem no interior destas mesmas relações. É aquele operário tapeado com mentiras fascistas na internet, que precisa estar inserido em novas relações de produção cultural(e somente no contexto das organizações políticas da classe trabalhadora que este processo pode se realizar de modo independente). Logicamente que a mensagem e a maneira como a opinião política do artista é expressa na estrutura da obra, são questões da maior importância. Devemos ter em mente que o combate à alienação social exige um compromisso com o conhecimento crítico, comunicado inclusive através da arte. Penso que já começamos a fazer isso. Temos muito trabalho/arte a produzir.

 
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