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DEBATE
PSOL do Rio Grande do Sul: um projeto para administrar a crise capitalista?
Thiago Flamé
São Paulo
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Nessas eleições tuteladas pelos golpistas, pela Lava Jato e a tirania judicial, é tarefa de qualquer candidatura de esquerda denunciar a prisão arbitrária de Lula e defender que possa ser candidato, para que não se viole o mínimo direito democrático do povo decidir em quem votar, atacado por um punhado de juízes eleitos por ninguém e cheios de privilégios. E isso, sem apoiar o voto em qualquer candidatura do PT, que abriu caminho ao golpe institucional quando governou com a direita, assumiu e acobertou métodos de corrupção próprios deste sistema capitalista e atacou os trabalhadores, principalmente com os ajustes no segundo mandato de Dilma Rousseff em 2015.

No RS o PSOL deveria fazer isso, mas segue por outro caminho. Em seu programa publicado, assim como nas entrevistas e no debate de governadores pela televisão, parece que disputa uma eleição "normal": não denunciou contundentemente estas eleições manipuladas pelo golpismo, nem a prisão arbitrária de Lula.

Precisamos enfrentar os golpistas da direita, encarnados nas figuras de Sartori e do tucano Eduardo Leite. Abrimos um debate com o PSOL gaúcho, a partir do programa de Roberto Robaina e de suas recentes intervenções, e a necessidade de se conformar uma alternativa política de esquerda que se enfrente com o regime e não repita os passos do PT no Brasil.

Uma posição de neutralidade frente as greves

Há sinais políticos que valem todo um programa. No debate da TV Band, quando perguntado sobre as greves dos servidores, Robaina afirmou: “evidentemente que as greves devem ser tratadas negociando, em primeiro lugar, negociando exaustivamente. E tratando de ter uma política econômica que evite as greves”. Ao invés de defender incondicionalmente as greve dos servidores - que, por exemplo, no município de Porto Alegre se enfrentam com a reforma da previdência do golpista Nelson Marchezan - o que Robaina fez foi propor uma política que "evite" as greves, como se o problema da crise do estado fosse um problema de gestão. Chama atenção como a resposta é bastante semelhante a de Miguel Rossetto (PT) (com quem polemizamos aqui) e de Jairo Jorge (PDT) (que já denunciamos sua atuação aqui http://www.esquerdadiario.com.br/Jairo-Jorge-congelou-salarios-ameacou-professores-e-foi-denunciado-por-corrupcao-em-Canoas). Ou seja, Robaina trata as greves dos trabalhadores como a centro-esquerda que se propõe "gestora progressista" do Estado.

Nesta pergunta, a direita destilou seu ódio, defendendo abertamente o corte de ponto dos trabalhadores, enquanto Sartori cinicamente defendeu sua administração atual. Os servidores que assistiam ao programa provavelmente consideraram este um momento crucial para se colocar junto a suas categorias contra a "política Sartori", o que só pode ser feito com uma política que atacasse os capitalistas. Entretanto, o candidato do PSOL preferiu se colocar como um bom gerente, inofensivo aos interesses dos capitalistas do estado, que com uma boa política econômica e como um bom negociador, vai resolver os conflitos. Também anuncia que “quando o estado não tem condições de dar o reajuste é preciso negociar”. O que ele não fez foi defender abertamente as reivindicações e a necessidade das greves triunfarem, chamando o apoio da população à greve dos municipários em curso contra Marchezan, o que seria o mínimo para uma candidatura de esquerda.

As greves dos servidores de 2015 e de 2017, que se enfrentaram com o parcelamento de salários e os ataques do governo Sartori, colocaram a questão de como derrotar a política de Sartori, e ao mesmo tempo revelaram o tamanho da crise do estado. Nessa situação um "negociador progressista" teria pouco o que fazer. Colocar-se ao lado dos servidores significaria deixar de pagar a dívida com a União e romper abertamente com a lei de responsabilidade fiscal e com a própria justiça golpista como consequência. Um caminho impensável pelo caminho institucional ao qual se resume o programa do PSOL, um caminho que só é possível com a mobilização da classe trabalhadora e do povo gaúcho e não pela via da negociação ou de pressão parlamentar.

Um programa econômico que na pratica vai levar a mais ajustes

Também neste tema de como enfrentar a crise no estado, o que propõe o PSOL pouco se diferencia do candidato do PT, Miguel Rosseto. Rosetto promete uma “redentora” retomada do crescimento no Rio Grande do Sul por obra de alguma boa gestão no Piratini, como se a grave crise econômica do estado fosse desaparecer pela “vontade” do gestor. Enquanto isso, nacionalmente, Haddad fala em aplicar um ajuste "menos rigoroso que o dos golpistas", falando em reforma da previdência e trabalhista, fazendo com que no quesito "pagar a conta da crise", ainda que com uma forma própria, esteja de mãos dadas com os golpistas para honrar as dívidas do Estado, em especial a fraudulenta dívida pública aos banqueiros internacionais. O que não está dito no discurso do candidato petista no RS é que até que "chegue o crescimento" (numa situação de profunda crise econômica internacional, e no interior do país, com milhões de desempregados), a ordem do dia num governo petista seria o mesmo programa do Sartori: parcelamento, cortes e privatização, mas com um estilo e um ritmo diferentes. Assim vemos em Minas Gerais, em que o atual governador de Fernando Pimentel (PT) vem parcelando e atacando professores, semelhante a Sartori. A gestão do estado capitalista em tempos de crise deixa pouca margem de atuação para as “boas gestões” reformistas.

O programa que o PSOL levanta para combater a crise fiscal do estado se baseia na recuperação dos valores da lei Kandir, na cobrança mais efetiva aos sonegadores, na suspensão do pagamento e auditoria da dívida estadual e na taxação das grandes fortunas. A proposta do PSOL é que todos esses pontos sejam executados pela via da atuação institucional.

A recuperação dos valores da lei Kandir depende da benevolência do STF golpista em emitir decisão favorável ao estado e, portanto, desfavorável ao governo federal. Colocar esperanças de recuperação econômica em um projeto assim não é nada mais do que uma maneira de dizer, ao final “eu fiz o que pude”. Isso porque os estados acessarem esses recursos não é uma questão de legalidade ou ilegalidade, é uma questão política e de prioridade orçamentária em meio à crise econômica. O STF não atua isento de interesses políticos, não se guia pelo quão justo é uma ou outra decisão e por isso a profunda crise do RS não tem comovido esses sujeitos de toga. Os recursos da Lei Kandir que deixaram de ser repassados aos estados vem sendo parte de encher os bolsos dos banqueiros com o pagamento da dívida pública nacional – esse sim pago em dia sem nenhuma objeção do STF.

Para cobrar de forma mais efetiva os sonegadores Robaina propõe utilizar os mecanismos da estrutura administrativa do estado, como se o problema dos grandes sonegadores fosse uma questão de eficiência dos mecanismos de cobrança estatais.

Mas não: trata-se de atacar os privilégios dos capitalistas. Os altos valores da sonegação envolvem poderosos interesses mafiosos entrelaçados dos grandes empresários, da justiça, dos bancos e das cúpulas da máquina administrativa. Para buscar uma solução pela raiz ao problema da sonegação, é preciso desarticular essas máfias e impor o confisco dos bens dos grandes sonegadores para atacar efetivamente esse rombo no orçamento público do RS.

O problema da dívida estadual é também crucial. A cada renegociação como a que Sartori quer aprovar, a dívida atinge novos patamares – a última renegociação que nos trouxe até a crise atual foi feita durante o governo FHC e nenhum governo desde então mexeu nesse vespeiro. A dívida estadual é um mecanismo que tira dinheiro dos impostos estaduais direto para o pagamento da dívida pública nacional.

Não será uma auditoria ou suspensões temporárias no seu pagamento – como as que determinou o STF ao longo de 2017 – e como propõe o programa do Psol gaúcho, de suspender o pagamento para auditar, que vão resolver esse problema estrutural. Isso foi provado pelos fatos. A conclusão que surge desse problema é a necessidade de romper com o conjunto desse mecanismo e declarar o não pagamento da divida com a união. Não pagar a dívida estadual com a União abriria uma forte crise com o governo federal, projetaria o RS como um centro de resistência dos trabalhadores a esse roubo e colocaria na ordem do dia uma ampla mobilização nacional em apoio a essa luta regional para impor o não pagamento do conjunto da dívida pública brasileira. As greves e a mobilização popular, aqui, cumprem um papel central para avançar no problema.

Esta é uma concepção oposta daquela apresentada por Robaina durante o debate, onde as greves devem ser negociadas e “geridas” corretamente, e não vistas como pontos de apoio fundamental para que não sejamos nós a pagar pela crise. Concepções como essas apresentadas pelo PSOL estão mais próximas do fracassado projeto petista de administração do Estado burguês do que de um projeto que se enfrente com os golpistas, a direita e os empresários. Caso de fato chegasse ao governo do estado, com o programa que levanta, o PSOL se veria na mesma situação que o Syriza na Grecia. Suas medidas seriam barradas pela resistência da classe dominante e sem ter se preparado para nenhum enfrentamento, sem ter um programa capaz de responder na raiz dos problemas, que alternativa o PSOL poderia oferecer?

A nível internacional, o caminho apontado pelo PSOL de Roberto Robaina já foi testado pelo Syriza na Grécia, uma das referências internacionais do PSOL gaúcho, e acabou num governo de ajustes. Diante da crise econômica, a União Europeia impunha condições draconianas para a manutenção da Grécia na zona do Euro. O Syriza tinha sido eleito com um discurso oposto aos ajustes da União Europeia. Uma vez no governo, convocou um plebiscito popular sobre o ajuste imposto pela EU, que foi rechaçado por 60% da população. O que fez o governo Syriza? Terminou aceitando o acordo rechaçado pela maioria da população, por que não tinha uma força social organizada capaz de enfrentar os bancos europeus, com medidas de fundo como a estatização do sistema financeiro, para enfrentar a fuga de capitais. Em apenas seis meses passou do discurso “antineoliberal” para ser o agente dos principais ajustes da Alemanha contra os trabalhadores gregos e imigrantes.

Trata-se de uma importante lição: ou construímos uma política anticapitalista, baseada na luta da classe trabalhadora, ou terminaremos sempre reféns de reformismos que geram impotência frente às ofensivas autoritárias do capitalismo.

O PSOL na segurança publica: um programa para fortalecer a policia

Quando o candidato do PSOL desenvolve seu programa para a segurança pública, a confiança nas instituições do estado burguês é ainda maior. Neste tema de segurança pública, qualquer programa de esquerda deve partir de que o problema da violência social é decorrente do desemprego, da pobreza, da precaridade da educação, da falta de cultura e lazer para a juventude e o povo das periferias. Porém, nem isso foi levantado por Robaina.

O discurso do PSOL está centrado em “equipar melhor a polícia” e mudar a política de drogas (embora não chegue a defender abertamente a legalização de todas as drogas, como é necessário). Sua grande proposta é centrar a atuação policial nos crimes mais graves, nos crimes contra a vida. E defende isso sem nem denunciar a polícia, que é quem mais comete “crimes contra a vida” nas periferias do RS e do país todo. No seu programa para a segurança podemos ler, logo no ponto propostas que poderiam vir de qualquer candidato da direita: “a) repressão qualificada; b) aperfeiçoamento e investimento institucional; c) informação e gestão do conhecimento; d) formação e capacitação continuada.” São propostas pensadas para colher alguns votos entre policiais e os setores mais conservadores, e que fizeram o PSOL parecer uma voz a mais entre todos os candidatos da ordem que propõe diferentes caminhos de fortalecimento do aparato de repressão estatal. Uma esquerda comprometida com os interesses da classe trabalhadora e do povo negro deveria lutar para combater a polícia e não fortalecê-la.

A confiança na lava-jato e a adaptação ao golpe institucional

O PSOL gaúcho confia na Lava Jato e seus juízes cheios de privilégios, com salários que chegam a R$ 100 mil por mês, para enfrentar a corrupção. Em 2016 fez coro com o golpe institucional, sempre na busca de um caminho institucional para resolver os problemas que só a mobilização da classe trabalhadora e um programa de enfrentamento com as classes dominantes podem resolver. A ironia é que a “esquerda Lava Jato”, campeã dos elogios ao juiz Sérgio Moro, acabe repetindo o programa petista dos anos noventa e se prepare para seguir pelo mesmo caminho desse partido ao se colocar na perspectiva de administrar com responsabilidade o Estado capitalista.

Não à toa o PSOL gaúcho, a candidatura de Robaina e dos candidatos do MES no Rio Grande do Sul, como a Luciana Genro, Pedro Ruas e a Fernanda Melchionna, não denunciam com toda contundência o enorme veto autoritário à candidatura de Lula, capitulando a uma das alas mais reacionárias do atual regime político, representada na Lava-Jato e no judiciário. Não apoiamos o voto no PT, mas denunciamos que meia dúzia de juízes eleitos por ninguém definam em quem o povo pode ou não votar, atacando o mínimo de expressão popular permitida nesta democracia dos ricos, que é a escolha do voto. O fortalecimento do poder autoritário do Estado que se mostra nessas eleições manipuladas, seguramente se voltará contra a classe trabalhadora e povo quando nos erguermos para enfrentar os ataques do próximo governo, e isso deveria ser amplamente denunciado pela esquerda e pelo PSOL no RS.

Precisamos de uma esquerda anticapitalista e socialista nessas eleições manipuladas pelo Judiciário e o golpismo, que denuncie o golpe institucional e o caráter proscritivo das eleições com Lula preso, que denuncie o poder da casta de juízes que cada vez mais assume o controle do país. Uma esquerda que combata o golpe, mas sem se adaptar ao programa do PT, que se coloque na linha frente da luta das mulheres e que levante um programa capaz de dar uma saída dos trabalhadores para a atual crise econômica. Isso passa por levantar demandas democráticas contra o golpe em curso, como a eleição e revogabilidade dos juízes, e os julgamentos de corrupção por juri popular; que defenda a necessidade de uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, para colocar em pauta os principais problemas do país, como o não pagamento da dívida pública, que submete toda a economia nacional e orçamento público a essa sangria, além da reversão de todas as privatizações para colocar todos recursos em estatais geridas pelos trabalhadores e com controle popular. É nessa perspectiva que nós do MRT colocamos nossas candidaturas nessas eleições.

 
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