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RACISMO
Folha comemora aumento de negros ricos tentando esconder o racismo profundo no Brasil
Marcello Pablito
Trabalhador da USP e membro da Secretaria de Negras, Negros e Combate ao Racismo do Sintusp.

Pesquisa feita por consultoria privada sob encomenda do jornal Folha de S. Paulo mostra crescimento de 5,4% de negros na chamada “classe A” e de 1,2% na B. Os dados procuram vender a imagem de uma mudança gradual, estrutural e contínua, enquanto os negros são os que mais pagam pelos ataques na crise e amargam com o racismo em diversos níveis na sociedade capitalista.

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A matéria de capa da Folha de hoje apresenta dados levantados pela LCA Consultores com base em pesquisa do IBGE, a Pnad contínua anual. De acordo com os números, em 2017 foram 464 mil negros que ingressaram nas “classes” A e B. A “classe A”, de acordo com os critérios do instituto, é composta por famílias com renda acima de R$ 14.200, enquanto a B seria de famílias com renda entre esse valor e R$ 4.000.

A tentativa da Folha é de dizer que o racismo está gradualmente diminuindo no país, e que a conscientização de empresas quanto à necessidade de promover políticas de igualdade, bem como a implementação de cotas, seria suficiente para levar esse avanço adiante até que, um belo dia, o racismo acabaria. Não é à toa que essa mentira, uma cortina de fumaça ideológica promovida por um jornal profundamente comprometido com os interesses dos capitalistas, surge nesse momento.

A própria matéria dá indícios dos interesses por trás dessa propaganda. Os números da pesquisa do IBGE mostram que, enquanto houve esse aumento de negros nos estratos superiores, as próprias “classes” A e B retraíram 2,7% e 0,7% - o equivalente a 800 mil pessoas –, enquanto a “classe” E (famílias com renda mensal de até R$ 714) aumentou em 1,5 milhão de pessoas, o equivalente a 9%. Ou seja, com a crise a miséria aumenta no país e igualmente a concentração de renda, sendo que hoje 6 bilionários brasileiros concentram a mesma riqueza que metade da população, e 1% da população ganha 36 vezes mais que a metade mais pobre do país.

Sobre isso, é claro, a reportagem se cala, mas todos sabemos que a imensa maioria dos que estão nessa metade debaixo da sociedade, com os piores postos de trabalho e os menores salários, são negros. Com o aumento da desigualdade, quem mais sofre são os negros, e o próprio IBGE já indicou que a desigualdade salarial entre negros e brancos segue crescendo. Enquanto a média salarial de brancos é hoje de R$ 2.814 para brancos, é de R$ 1.507 para os negros, que não chega a 54% do valor do salário dos trabalhadores brancos. No caso das mulheres negras, essa desigualdade é ainda maior, pois racismo e machismo se combinam para intensificar a exploração. Não à toa, entre os cargos de trabalhadoras terceirizadas da limpeza, que além de salários baixíssimos têm inúmeros direitos trabalhistas desrespeitados cotidianamente, as mulheres negras são imensa maioria. Isso sem falar no maior exército de empregadas domésticas do mundo, uma categoria extremamente precarizada.

Todos os ataques do governo golpista de Temer – defendidos ferrenhamente pela Folha – como a reforma trabalhista, o congelamento de gastos com saúde e educação, a lei da terceirização ou a reforma do ensino médio, atingem de maneira particularmente grave o povo negro, que sempre paga o preço mais alto pela crise. Não é apenas nos salários e empregos, mas também nos números escandalosos da violência policial e dos presídios superlotados, que se vê como a pior parte da exploração capitalista é reservada aos negros.

O que a Folha quer fazer é tapar o sol do racismo que queima o nosso couro com a peneira de uma fachada de “inclusão” que é uma ínfima porcentagem de negros ocupando espaços na classe dominante. Nos EUA e na África do Sul, por exemplo, para tentar conter a revolta do povo negro, políticas de concessão foram feitas e, se permitiu a alguns negros uma ascensão social, do ponto de vista da classe dominante cumpriu o papel estratégico de criar uma “elite negra”, mas mantendo o pilar do racismo, sem o qual é impensável o capitalismo nesses países e no mundo – que dirá no Brasil, o país mais negro do mundo fora da África. Por isso, em sua matéria, entrevistam pessoas com Rachel Maia, que diz ser uma “executiva especializada em experiência de consumo”. Nos EUA, um exemplo dessa elite é Barack Obama, que governou o país por dois mandatos presidenciais e manteve intocado o racismo no país, sendo que durante seu governo explodiu o movimento “Black Lives Matter” (vidas negras importam) em protesto contra os monstruosos assassinatos racistas cometidos pela polícia americana.

Por isso, temos que ler por trás das matérias e das tentativas da Folha de encobrir o racismo no Brasil com uma propaganda interessada. As cotas são uma conquista obtida por meio de muita luta do povo negro, e as defenderemos com unhas e dentes. Mas não nos basta, e nosso objetivo jamais será criar uma “elite negra” enquanto o racismo se mantém oprimindo e intensificando brutalmente a exploração sobre o conjunto dos trabalhadores, e especialmente negros. Nosso caminho é que trabalhadores negros e brancos estejam aliados, combatendo o racismo e o capitalismo, sabendo que derrubar esse sistema baseado na desigualdade e na miséria é um passo imprescindível para acabar de vez com essa ideologia opressora que surgiu junto com o capitalismo e merece morrer junto com ele.

 
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