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LEGALIZAÇÃO DO ABORTO
A legalização do aborto e a luta por um movimento de mulheres socialista
Pão e Rosas
@Pao_e_Rosas

Nesta sexta-feira (03), aconteceu a atividade “A luta pelo aborto na Argentina, ideias para trazer a maré verde para o Brasil” na UFRN, organizada pelo Grupo de Mulheres Pão e Rosas e a Juventude Faísca.

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A massiva mobilização de mulheres jovens e trabalhadoras no país hermano conquistou a aprovação do projeto de lei da legalização do aborto no último dia 13 de junho na Câmara dos Deputados. A ampla construção da mobilização para o dia 08 de Agosto se alastrou pela América Latina e promete arrancar manifestações de apoio até mesmo nos Estados Unidos e na Europa. Esta maté verde fez com que o como, o porquê, e o quem da luta argentina passassem a rondar a cabeça de toda e qualquer mulher que exige seu direito de decidir sobre seu próprio corpo e não quer pagar com a vida por sua decisão. E por isso decidimos organizar a conferência, já que a luta das mulheres e homens argentinos é exemplo, devemos pensar quais lições devemos tirar para pensar a realidade brasileira e a necessidade de um movimento de mulheres socialistas, com independência de classe, para ser parte de responder aos ataques golpistas e que seguirão pelas mãos de qualquer candidato que se eleger.

A atividade começou com uma breve exposição de Marie Castaneda, militante do MRT, que discorreu sobre a situação brasileira. Ainda que a discussão relativa ao aborto seja tratada como uma enorme polêmica, em realidade trata da vida das mulheres, na qual quatro mulheres morrem todos os dias ao buscar socorro em hospitais por complicações no aborto. Tampouco é algo distante da realidade da vasta maioria da população, já que uma em cada 5 mulheres já fez aborto, são nossas irmãs, tias, sobrinhas, mães, amigas, primas, conhecidas. A diferença existente é que as mulheres trabalhadoras, pobres e negras são as que pagam pelo crime com a própria vida. Enquanto a incidência de abortamento é maior entre mulheres de renda de até um salário mínimo, este cai a partir dos 5.

Estes números demonstram que o debate não pode ser levado ao campo da escolha individual entre fazer aborto ou não, mas sim se mulheres devem seguir morrendo por não ter direito à decisão, à escolha. Isso também evidencia a necessidade do aborto ser um direito, não apenas que deixe de ser crime, já que isso não impediria que as mulheres seguissem morrendo já que o acesso a esse direito seguiria não existindo de forma gratuita. Do dia 3 ao 6 de Agosto o STF realiza 2 audiências públicas a respeito a ADPF 442 (arguição de descumprimento de preceito fundamental), sem caráter deliberativo, uma iniciativa que é apresentada pelo PSOL, alimentando confiança no judiciário golpista. A audiência no STF, ainda que não possa deliberar nada, levou a Igreja e setores conservadores a se manifestarem contra a legalização do aborto e com um discurso que ele deve ser proibido até mesmo nos casos que hoje são garantidos por lei: quando existe risco de vida materna, em casos de fetos anencéfalos e em casos de estupro.

Para poder defender efetivamente este direito elementar à vida das mulheres, é necessário encarar com seriedade o que foram os 13 anos de governo do PT e os últimos dois anos sob governo golpista. Enquanto o PT é mandatário e implementador da passividade e trégua das Centrais Sindicais, foi este o partido que enquanto esteve no poder atacou os direitos das mulheres e colocou nas mãos das igrejas Católica e Evangélica, os rumos da discussão de gênero e sexualidade nas escolas e também o próprio direito ao aborto. Seguem com sua demagogia até hoje, em um país no qual 97,5% das cidades não possuem casas-abrigo para mulheres vítimas de violência, uma realidade sofrida por 40% das mulheres brasileiras. Para citar apenas três exemplos mais crus: em 2007 foi o então deputado petista, Luis Bussuma, que escreveu o Estatuto do Nascituro, projeto que visava proibir o direito ao aborto nas situações em que já é permitido por lei. Em 2009, Lula assinou o Pacto Brasil-Vaticano, onde entregava a discussão de gênero e sexualidade às igrejas. E em 2010, Dilma publicou a Carta ao Povo de Deus, onde determinava que o aborto também estaria a cargo da concordância com a Igreja, ou seja, não seria aprovado, para citar apenas três exemplos. Entender qual foi o caminho trilhado pelo PT para a direita é fundamental para pensar como combater o golpe institucional orquestrado por esta mesma direita e a burguesia com objetivo claro de poder deliberar sobre as eleições presidenciais, escolhendo a dedo quem será o presidente, impedindo a população de ter o direito de decidir em quem votar e mantendo a prisão arbitrária de Lula. Essa mesma direita golpista aplicou a Reforma Trabalhista, o congelamento dos gastos em saúde e educação que ataca toda a classe trabalhadora, e com mais força ainda as mulheres.

A exposição de Brenda e Tomás partiu de um histórico da construção da luta pelo direito ao aborto legal, seguro e gratuito na Argentina e buscou colocar como se construiu desde as bases e com uma concepção de confiança nas próprias forças, não nas burocracias e no parlamento a maré verde que inundou o país. A realidade de muitíssimos anos do governo de Cristina Kirchner, uma mulher, nos quais não se avançou nos direitos das mulheres, mas sim se abriu mais espaço ainda para a Igreja e para a direita, coloca hoje as mulheres nas ruas. A batalha pela legalização do aborto se dá nas ruas e as movimentações de pressão de igreja e de Bergoglio, o papa argentino, não param, por isso Tom deu destaque para a importância das manifestações que estão sendo convocadas em todo o Brasil e para a própria atividade, uma iniciativa que ocorria ao mesmo tempo em Nova York, nos Estados Unidos, também realizada pelo Grupo de Mulheres Pão e Rosas.

Relataram que o aborto sempre foi condenado pelo código penal, em 1921 se incluiram algumas exceções (risco de vida para a mulher e estupro apenas) e isso segue vigente até hoje, com atuação contínua e permanente da Igreja Católica para que as mulheres seguissem morrendo por abortos clandestinos. A origem do movimento de mulheres volta aos anos anteriores à última ditadura militar, quando começaram a se formar as primeiras agrupações feministas e de diversidade sexual. Em 1974, Perón proibiu os contraceptivos por meio de um Decreto presidencial, o que gerou revolta e resposta do movimento de mulheres e partidos de esquerda como o então PST (Partido Socialista dos Trabalhadores), esta proibição se manteve até 1976, apesar das demandas terem sido expressas em 1975 pelo ano internacional das mulheres, mas não se unificaram com as massivas mobilizações de julho do mesmo ano, da primeira greve geral contra Perón. Em 1984, no 8 de março, após fim da ditadura militar, um ato na Praça de Maio exigia “Aborto livre”; “Nós parimos, nós decidimos”.

O surgimento dos Encontros Nacionais de Mulheres em 1986 originou um espaço importante onde se organiza a luta das mulheres na Argentina, debatendo anualmente as demandas das mulheres e também a situação nacional, ainda que estes só começaram a se massificar em 2003.

Em 1994, a Igreja Católica tentou novamente decidir sobre os corpos na Argentina. Durante a Convenção Constituinte que permitiu a reeleição presidencial de Menem e a reforma da Constituição, a Igreja propôs incorporar a defesa da vida desde a concepção. Isso fazia retroceder enormemente a questão dos direitos sexuais e reprodutivos, o que também provocou a mobilização de muitíssimas mulheres. Quatro anos mais tarde, Menem aprovou por Decreto O Dia Da Criança Que Nascerá (Día del Niño por Nacer) que até hoje segue vigente.

O debate sobre o direito ao aborto se instalou na sociedade argentina, em especial a partir dos locais de trabalho e estudo, onde com espaços de autoorganização a luta ganhou novos contornos e popularidade. Com a enorme crise econômica e política de dezembro de 2001, a necessidade de se organizar concretamente se impôs porque a discussão sobre o aborto havia vindo para ficar. A Assembleia Pelo Direito Ao Aborto começou a se organizar após essas jornadas e refletiram diretamente no Encontro de Mulheres de 2003 em Rosário. Neste estiveram presentes as trabalhadoras de Brukman e Zanon, duas fábricas colocadas sob controle operário, colocando uma saída para os trabalhadores frente à crise.

A discussão não se dá em torno de decisões individuais ou controles morais, mas sim em impedir que mulheres morram. Quando se faz um discurso em defesa da vida ao se colocar contra a legalização do aborto, na verdade se opta por condenar à morte mulheres trabalhadoras, pobres e imigrantes.

Entre 2003 e 2004 se criou a Campanha Nacional Pelo Direito ao Aborto, uma coalizão federal heterogênea que reunia, naquele momento, mais de 300 agrupações feministas, organizações políticas e personalidade. Sua consigna fundacional era “Educação Sexual para decidir, anticonceptivos para não abortar, aborto legal para não morrer”, a consigna do movimento que se coloca nas ruas hoje, esta coalizão elaborou o projeto de Interrupção Voluntária da Gravidez que hoje está em votação.

Tom pontuou especificamente que apesar da Argentina ser um país que tem algumas das mais avançadas legislações, isso não significa uma melhora substancial material na vida das trabalhadoras e trabalhadores LGBTs. Três exemplos citados foram a lei da HIV, a Lei de Identidade de Gênero e a Lei de Educação Sexual, uma prova real de que a igualdade perante a lei não é a igualdade perante a vida.

Entre 2007 e 2016 o projeto foi apresentado em seis oportunidades e NUNCA foi colocado em votação. O governo de Cristina Kirchner o manteve arquivado e em 2011, em uma reunião com José María Arancedo, titular da Conferencia Episcopal Argentina ratificou sua oposição à legalização do aborto.

No último dia 6 de março, este foi apresentado pela sétima vez consecutiva, com 72 assinaturas dos diferentes blocos, sendo a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores a unica bancada 100% unificada na votação e que é construída à serviço da construção da campanha pela legalização do aborto nos locais de trabalho e estudo.

Na próxima quarta-feira ocorrerá a votação no Senado, para a manifestação se esperam 2 milhões de pessoas. Ainda assim, a conquista do direito não está dada, por isso não se poupam esforços para construir.

Um grande exemplo desta construção foi a Assembleia de Mulheres de Madygraf realizada no último sábado, na Zona Norte de Buenos Aires. Madygraf é uma fábrica gráfica sob controle operário desde 2015 e está no coração da zona industrial. Nesta assembleia, operárias e trabalhadoras debateram como ser parte de organizar e tomar a linha de frente da luta pelo direito ao aborto, aprofundando a defesa da separação da Igreja e do Estado e como colocar a força da luta das mulheres, jovens e trabalhadoras, à serviço de combater os ataques do governo do direitista Macri contra a classe trabalhadora e que atinge com mais força justamente as mulheres, como os tarifaços, o acordo com o FMI e a Reforma da Previdência. A medida é parte da política de exigência feita pelo Pão e Rosas e pelo PTS (organização irmã do MRT e que impulsiona o Pão e Rosas na Argentina) às Centrais Sindicais, que ignoram a luta das mulheres e não movem uma palha nem para conquistar o direito ao aborto, nem para resistir aos ataques.

No começo deste ano, tornaram-se públicas cifras milionárias de subsídio estatal para a Igreja, sob o governo de Cambiemos (Macri), o kirchnerismo se apressou em denunciar, como se fosse algo inédito feito pelo Estado argentino, que em realidade o faz sistematicamente desde sua fundação e expressa assim a impossibilidade de um Estado laico.

O governo, o PJ e a própria Igreja sentiram a pressão do movimento de mulheres na manhã do dia 14 de Junho, quando a votação foi noite adentro com vigília e se conquistou a aprovação na Câmara dos Deputados e se preparam melhor para a próxima batalha. As mulheres do Pan y Rosas são intransigentes: a Igreja e o Estado não devem decidir sobre os nossos corpos.

A experiência do movimento de mulheres com Cristina Kirchner e Dilma Roussef precisa delimitar os lados, ou se defendem os interesses da Igreja e da burguesia, ou das mulheres trabalhadoras. A ilusão do discurso feminista da “amplitude do poder”, na qual muitas feministas comemoram Merkel ou Lagarde estão em espaços de poder, na verdade são uma falácia, porque ainda que o gênero nos una, a classe nos separa.

As mulheres são maioria da classe trabalhadora e ao passo que esta precisa ser o peso de suas demandas pelo direito à vida, isso também significa que estas podem ser desassociadas da exploração, do desemprego e das mazelas produzidas pelo capitalismo, elevadas ainda mais para as mulheres trabalhadoras.

O Fundo Monetário avança sob a argentina e arma receitas que devem ser aplicadas por Macri e sua equipe. Christine Lagarde já deu ordens para que assim seja. No Brasil, sofremos também com os impactos do golpista Temer e do imperialismo, que está em uma ofensiva na América Latina. As consequências de um ajuste orquestrado pelo FMI são nefastas, como mostra o caso Grego, então precisamos entender e levar para o movimento de mulheres quem são eles e quem somos nós.

No Brasil, construir um movimento de mulheres responsável e que queira realmente servir para ser parte de construir uma alternativa dos trabalhadores, de independência de classe e imperialista passar por se propor superar o PT pela esquerda, denunciar e exigir das Centrais Sindicais e da UNE e batalhar para que essa discussão chegue em todo local de trabalho e estudo, a de que as mulheres trabalhadoras e trabalhadores precisam se organizar para responder aos ataques, mas também para lutar por uma sociedade sem opressão e exploração, os sindicatos e as entidades estudantis precisam ser reconquistadas pelos trabalhadores e estudantes para servirem como ferramentas de organização, e não como local para parasitas, os burocratas.

"O Pão e Rosas é uma organização internacional, aqui na Argentina como no Brasil, e em diversos países da América Latina, Estados Unidos e da Europa, impulsionando a luta pela legalização do aborto contra as instituições do regime, porque consideramos que o movimento de mulheres pode avançar muito além da batalha por nossos direitos: podemos organizar a luta contra os ataques dos capitalistas. Precisamos de uma organização internacional dos trabalhadores, porque nossos feminismo é socialista e revolucionário" foi a ideia com a qual Brenda fechou sua reflexão.

Assim, nos inspiramos na Revolução Russa, quando as trabalhadoras deram início à maior revolução da classe trabalhadora da história e que conquistou inclusive o direito ao aborto, atacado pelo stalinismo posteriormente. Acreditamos na necessidade de superar o capitalismo para poder conquistar a emancipação da classe trabalhadora e que são os trabalhadores a classe revolucionária que tem de dirigir este processo, composta majoritariamente por mulheres.

Convidamos todas e todos a se somarem ao bloco do Pão e Rosas e da Faísca nesta quarta-feira em Natal (RN), as 17h, em frente ao Midway Mall.

Convidamos também para a reunião do Pão e Rosas e da Faísca que acontecerá na segunda-feira a tarde na UFRN, onde será realizada uma oficina de faixa e lambes de construção da campanha.

Para entrar em contato com o Pão e Rosas:

https://www.facebook.com/PaoeRosasBrasil/

Para conhecer porque nosso feminismo é socialista: http://www.esquerdadiario.com.br/spip.php?page=gacetilla-articulo&id_article=24208

 
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