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JULGAMENTO DE LULA NO STF
Um julgamento para cada réu, o STF brasileiro como a cara da arbitrariedade e do golpe
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi

Correu o mundo a notícia da negativa do STF brasileiro em conceder habeas corpus a Lula, autorizando a prisão do líder nas pesquisas de sucessão presidencial. A decisão de ontem pontua mais um episódio de climax em uma série que coloca no chinelo o melhor de House of Cards em chicana e arbitrariedade para atender a interesses políticos, econômicos e pessoais. Mas o processo como um todo vai muito além das habilidades de seus atores, ele mostra a crescente divisão do Supremo como parte da polarização social e política do país, e como este atua, em meio a esta divisão como uma alavanca crucial no golpe institucional.

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Foto: Dida Sampaio/Estadão

O processo contra Lula é autoritário e arbitrário, mas não é um ponto fora da curva. Ele exemplifica em sua diferença com outros processos, como o STF e o judiciário brasileiro sentencia conforme os interesses do golpe institucional e sua continuidade.

A decisão de ontem, completamente contrária às decisões da mesma corte em relação a Aécio Neves, ex-candidato presidencial do PSDB, ou do oligarca Renan Calheiros do PMDB, teve um objetivo: continuar a obra golpista iniciada em 2016. Naquele momento tratava-se de tirar Dilma Rousseff para garantir ataques mais duros e rápidos à classe trabalhadora do que aqueles que o PT já vinha fazendo. Agora, trata-se de garantir melhores condições para candidatos que defendam aprofundar a mesma agenda de privatizações, Reforma da Previdência e outros ataques no pleito de outubro de 2018. Para este objetivo querem impedir que a população brasileira possa votar em quem ela quiser, inclusive em Lula, agente da conciliação com a mesma burguesia e burocracia estatal que hoje o persegue, apesar dos governos do PT terem garantindo um crescimento inédito dos bilionários lucros dos capitalistas.

De quebra, em meio a toda a operação Lava Jato, são destruídas estatais e "gigantes nacionais" privadas para abrir caminho a empresas imperialistas, registre-se.

A votação contra Lula é muito diferente de como o STF e especialmente Cármen Lúcia tratou casos cruciais para a agenda do golpe institucional

O processo contra Lula, tal como toda operação Lava Jato está viciado de autoritarismos: com procuradores que diziam "não ter provas mas ter convicções" (Dallagnol), e foi ontem coroado por ministros do Supremo tribunal dizendo "que não li a primeira instância e não li a segunda instância" e que votavam pela "refundação do país" (ministro Barroso), ou por inovações no pensamento sofístico como a produzida pelo ministro Moraes: "reconheço os direitos fundamentais, mas eles são relativos". Ou ainda Rosa Weber que votava pela estabilidade da decisão de uma maioria que só existiu porque ela não votou segundo o que declarava que teria sido seu voto. Algo verdadeiramente interessante. Com a decisão de Rosa provou-se vitoriosa a tática da presidente da corte, Cármen Lúcia, votar o habeas corpus mas não a questão constitucional que impede prisão antes de decisão de terceira instância, ponto constitucional que Rosa declara votar junto aos outros cinco ministros que defenderam o habeas corpus, invertendo a apertada maioria de ontem por 6 a 5.

A autorização para prisão de Lula foi aplaudida pela Rede Globo e todos grandes jornais do país, nem falar pela cúpula do Exército, que havia tecido diversas ameaças de uso de violência para dar corpo a sua chantagem aos ministros.

Mas esta decisão, com todo direito a manobras de pauta por Cármen Lúcia, é completamente diferente de como ela agiu no julgamento de Aécio Neves, preservando este importante ator de um dos mais tradicionais partidos burgueses do país. Ela reuniu-se repetidas vezes com o senador como documentou a imprensa brasileira e proferiu o voto decisivo para desempatar a votação, garantindo que ele não poderia ser afastado do Senado sem este mesmo Senado autorizar isso, o que nunca aconteceria ou aconteceu.

E mais, o próprio procedimento com Aécio, poupado em outubro de 2017, foi radicalmente diferente do adotado em junho de 2016 pelo mesmíssimo STF no que tange a outro golpista, Eduardo Cunha. Primeiro o STF recusou-se por meses a fio a pautar as diversas acusações, com fartas provas, dos crimes cometidos por ele, garantindo seu papel de condutor do impeachment. De repente, aprovado o impeachment na Câmara com extrema rapidez e sem consultar a Câmara ele foi preso e retirado da Câmara. Ele já não era mais necessário e ainda poderia dar uma cara de "neutralidade" para o judiciário que, afinal, não perseguiria só o PT.

Pode-se listar intermináveis "dois pesos, duas medidas" do STF. Impediram por via de liminar de Gilmar Mendes (agora defensor do habeas corpus) que Lula virasse ministro de Dilma enquanto era somente réu e não tinha nenhuma condenação, e, ao mesmo tempo, autorizou que Temer nomeasse diversos réus como ministros.

Outro caso completamente díspar da atuação de Cármen Lúcia foi quando Renan Calheiros foi afastado da presidência do Senado em dezembro de 2016 por decisão liminar de um ministro do STF. Renan e o Senado se rebelaram e não cumpriram a ordem, Cármen Lúcia ajudou a acalmar os ânimos em diversas reuniões até que o STF inventasse um novo procedimento em que ele réu pudesse permanecer na Presidência do Senado, sem ao mesmo tempo ser parte da sucessão presidencial. Essa manobra tinha um objetivo golpista maior do que a pele de Renan: garantir que ele presidisse a pronta votação da PEC 55 que congelou os gastos na saúde e educação por 20 (!) anos.

Mais golpismo significa maior divisão no STF como parte da polarização social e política

A lista poderia prosseguir quase infinitamente. Mas além do uso arbitrário e golpista do STF como um grande garantidor dos ritmos de como se desenvolve o golpe institucional, de quando e como se pauta as coisas, e de qual inovação jurídica é alcançada conforme as necessidades, há algo novo nas manobras dos últimos dias. O nível de polarização do Supremo, com xingamentos, ironias, falas acusando de ter sido manobrado mostram que o papel de grande árbitro desempenhado pela instituição está dividindo-a, fazendo-a expressar diferentes alas do regime político dentro de si.

Essa divisão é expressão da crescente divisão que se vê em todo regime, dividindo o judiciário em guerras de abaixo-assinado pró e anti-Lava Jato, a Câmara e o Senado, e dentro de diversos partidos. Uma divisão que, apesar dos altos índices eleitorais de Lula, ainda não palpita nos locais de trabalho pela sistemática atuação das centrais sindicais (em especial da CUT) de impedir a oposição com métodos da luta de classes aos ataques de Temer e dos empresários e contra estas investidas autoritárias a direitos políticos elementares como o do sufrágio.

Isso porque preferem canalizar toda a raiva existente para os votos no candidato petista que Lula indicar em outubro, que só poderá ser o representante tradicional da conciliação de classes do PT, se as massas não emergem como fator independente em meio à polarização política e social crescente no país.

A batalha das togas dos últimos dias anuncia novas tensões em outras esferas.

 
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