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TRIBUNA ABERTA
Em meio ao descaso do governo, APIB convoca povos indígenas para autodemarcarem suas terras
Anaís Goedert, estudante da Letras USP
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Certamente, 2015 não tem sido um ano tranquilo para todas as comunidades indígenas do Brasil. Isso porque a gestão de Dilma desde seu primeiro mandato, tem se mostrado uma das mais omissas em relação aos direitos básicos destes povos. Inicialmente, é preciso lembrar, que foi o governo que menos homologou territórios indígenas (T.I.s) desde a redemocratização.

Além disso, a tramitação da PEC 215/2000 no Congresso, que pretende passar do Poder Executivo para o Legislativo a função de demarcar T.I.s, quilombolas e unidades de preservação, mostra-se mais uma de suas negligências, uma vez que é inconstitucional e fere diretamente os direitos dos povos indígenas no Artigo 231 da Constituição Federal de 1988. Sabemos que o Congresso Nacional é composto em sua maioria por membros da bancada ruralista e de partidos que não representam de forma alguma a voz dos povos tradicionais, mas sim os interesses de latifundiários, empresas de minério, transnacionais e construtoras que possuem grande interesse nas muitas obras de infraestrutura que o governo federal vem construindo.

Durante as campanhas para as eleições de 2015, Dilma se reuniu com diversas lideranças indígenas, afirmando seu compromisso em garantir os direitos destes povos e se pronunciou contra a PEC 215, ainda que o executivo não tenha real poder de veto. Porém o que temos visto é que, mesmo neste curto período do segundo mandato, as coisas não têm funcionado desta forma. Não é de hoje que o executivo brasileiro promete e não cumpre o combinado.

A Usina Hidrelétrica de Belo Monte é um bom exemplo disso. Atualmente, com boa parte da obra finalizada, aguarda apenas licença de operação. Porém seu funcionamento é inviável, uma vez que boa parte das contrapartidas socioambientais prometidas pela empresa Norte Energia, uma das responsáveis por Belo Monte, não foram cumpridas. Desde o início das obras em 2011 até o momento, a taxa de desnutrição infantil nas aldeias da região aumentou 127% e continua não existindo transporte público ou sistema de esgoto ligado às casas do reassentamento dos grupos afetados por sua construção.

Desde o começo de 2015, apesar de não ser amplamente divulgado pelas grandes mídias, ocorreu uma série de ataques às comunidades indígenas em diversas regiões do país. Em abril ocorreram os assassinatos de duas lideranças na Bahia e uma no Maranhão, motivadas por conflitos com madeireiros e fazendeiros. Outro triste exemplo foram os pedidos de reintegração de posse em aldeias. Em São Paulo, a comunidade Guarani Mbya da Aldeia Itakupé enfrentava na justiça o ex-deputado Antonio Tito Costa pela posse das terras no Pico do Jaraguá, que teve sua reintegração temporariamente suspensa pelo STF. A reintegração de posse da comunidade Guarani-Kaiowá da Tekoha – lugar onde se é – Apyka’i (MS) poderá levar os indígenas novamente para a beira da BR-463. Casos graves de ataques às comunidades indígenas são frequentes na história do Brasil, porém atualmente estão se intensificando e tornando-se mais explícitos. Como o massacre contra os Guarani-Kaiowá da Tekoha Kurusu Ambá (MS) em 24 de junho, que deixou duas crianças desaparecidas durante uma semana, muitos feridos e diversas famílias sem roupa, água ou comida por conta dos incêndios de seus barracos causados por fazendeiros.

Todos esses ataques nos mostram aquilo que já é um retrato do Brasil desde os períodos coloniais. Mas a violência, preconceito e descaso tanto da população quanto do governo voltam a atingir com mais força os povos indígenas este ano, de modo que futuramente eles possam perder todos os seus direitos nas mãos da bancada ruralista. Com a negligência do governo, a omissão da FUNAI em demarcar as terras e garantir o direito fundamental desta parcela da população, a situação de vida de todos estes povos pode se tornar mais vulnerável. Com isso favorecem o avanço do latifúndio, a construção de usinas e ferrovias sem planejamento socioambiental, o desmatamento incontrolável, a perda da diversidade em nossa fauna e flora e o aumento da violência nestas regiões, que levarão não só as comunidades indígenas, mas outros povos tradicionais a perderem suas casas e seus costumes.

Todavia, contra todas estas medidas, a população indígena vem dando uma resposta à altura. Em abril deste ano, ocorreu em Brasília o XI Acampamento Terra Livre (ATL), que reuniu mais de 1500 lideranças indígenas de 200 povos diferentes. O resultado do evento foi o envio de uma carta à Dilma exigindo a demarcação de 20 T.I.s, e que o governo trabalhasse na inviabilização de iniciativas anti-indígenas no Congresso Nacional. Em resposta, a presidente homologou três territórios na região Norte, o que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB considerou como uma “perene submissão do governo Dilma aos interesses do latifúndio e do agronegócio… nas regiões Sul, Centro-oeste e Nordeste do país… onde estão hoje instaladas situações de conflito, violência e criminalização de lideranças indígenas…”.

Diversas ocupações de fazendas realizadas por indígenas estão espalhadas hoje pelo país, representando a insatisfação destes povos com a lentidão do processo demarcatório e a resistência contra a perda de seus direitos. Com base nisso, a APIB lançou uma nota pública no dia 25 de junho, convocando todos os povos indígenas do país a autodemarcarem suas terras, mesmo que isso lhes custe a vida.

A violência totalmente explícita que ocorre no Mato Grosso do Sul com os Guarani-Kaiowá e contra diversas lideranças indígenas no país, é um caso de calamidade pública que vem sendo ignorado pelas grandes mídias. Cabe a todos nós não deixar que um genocídio ocorra. Em meio a tantos ataques do governo, cortes na educação, saúde e cultura, é possível dizer que estamos todos juntos no mesmo barco, e que só resta à juventude e aos trabalhadores lutar junto com os indígenas e os demais povos tradicionais para reverter esta situação.

 
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