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ARTE
Exposição 4 – Sou otimista e tenho fome
Marcelo Magalhães
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Sou otimista, não conseguir ser de outra forma. O coração nunca foi gelado, e mesmo quando coberto por neve, viveu os amores abafados dentro de sua própria caverna. Eu engoli a primeira coisinha sincera que voou na minha frente. Já devorei até a pequena poeira que é revelada pela luz que atravessa a janela, a pequena poeira dançando fez minha felicidade faminta lamber os lábios. Então percebo que sou otimista, mas não me doou por satisfeito, nem só com poeira, amor e ilusão se alimenta a artista. Devoro então, um prato inteiro de imagem de sorrisos, frases certeiras que explodem no céu em momentos oportunos, estudantes que fazem a revolução, todas as fases da lua, eu devoro tudo e todas as fases da lua, pois a minha felicidade desesperada de fome comeu a possibilidade do amor, e me pegou amando. Vai! Morde o pescoço magro da situação, e sente a pele, os ossos e o sal que habita essa situação. É que eu sou otimista e minha felicidade com força, engole e mastiga nervosa a imagem da mãe que tapa o rosto da criança com a fronha de travesseiro – mãe e criança atravessam a cena do assassinato. Mãe e criança atravessam a rua para chegar à escola. A mãe na favela sabe que criança tem que ir pra escola, e ela leva a criança depois de tiroteio pra escola. Ela sim, mais que eu, ela tem uma felicidade faminta e guerreira. E a felicidade tem que invadir a escola, e a ocupação tem que ocorrer em todos os lugares. Ocupar todos os espaços com a nossas fomes. A minha felicidade dá dentada solta no ar ao ver a foto da menina negra que segura à cadeira e não deixa o braço do estado levar dela o seu direito de sentar, de quicar, de rebolar, quando e si ela quiser. A Minha felicidade come com garfo, com faca, de colher, com as mãos, com os pés, come nua, come com os olhos, com a barriga. Ela aprendeu a comer qualquer coisa para continuar viva, mesmo vivendo em ambiente com pouco, com quase nada. Onde o alimento era o fruto proibido, minha felicidade comeu escondida, por trás, embaixo da cama, na casinha do cachorro, na biblioteca, na escola. Ela aprendeu a se virar na rua, e a observar que na esquina existe uma casa que entre as arvores há a esperança de alguém dourada, que protege a casa e a esquina. Sou otimista, vi derreter das velas do altar a fé, e não importa o altar e nem a vela, mas sim a fé – único alimento de muitos. Há felicidades que só comem fé. É a fome que olha pro muro branco e faz ecoar pela cidade a frase abafada e calada que revela: muro branco na cidade é cidade calada. Muro pintado de cinza é cidade silenciada, sufocada. A Minha felicidade tem fome, eu tenho uma felicidade esfomeada, pois as pessoas na sala de jantar já estavam todas caladas antes mesmo da internet chegar. A minha felicidade tem fome e quer sempre dá o bote. Tem vezes que quebra a cara, mas toda a oportunidade perdida é possibilidade tentada. E precisamos tentar.

Revisão: Samanta Tavares

 
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