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MOVIMENTO OPERÁRIO
Da crise de representatividade política à crise de representatividade sindical
Marcello Pablito
Trabalhador da USP e membro da Secretaria de Negras, Negros e Combate ao Racismo do Sintusp.

Em meio à onda de greves que percorreram o país depois de junho, alguns analistas buscaram entender com olhares bem atentos, como estas manifestações e o rechaço às instituições contida nelas se relacionavam com a “crise de representatividade sindical” expressa em greves “rebeldes”, em que os operários transgrediam a “ordem sindical”, passando por cima de suas direções tradicionais.

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As jornadas de junho de 2013 trouxeram a tona várias demandas sociais como a saúde, a educação, o trabalho e questionaram também as principais instituições políticas de nosso país e os partidos da ordem como o PT, PSDB e PMDB que atuam para perpetuar uma democracia dos ricos contra os trabalhadores e o povo pobre. Em meio à onda de greves que percorreram o país depois de junho, alguns analistas buscaram entender com olhares bem atentos, como estas manifestações e o rechaço às instituições contida nelas se relacionavam com a “crise de representatividade sindical” expressa em greves “rebeldes”, em que os operários transgrediam a “ordem sindical”, passando por cima de suas direções tradicionais. Com as medidas de ajuste de Dilma implementadas em negociação ou diretamente acordadas pela burocracia sindical da CUT, CTB, Força Sindical ou UGT a tendência é que estes elementos de desgaste da burocracia sindical aumentem e para este momento será muito valioso recuperar as lições de auto-organização e democracia operária.

A crise de representatividade com as instituições políticas atingiu os sindicatos?

Os sindicatos guardam um peso político muito importante em nosso país, expressão do importante peso econômico e social de uma classe trabalhadora gigantesca de mais de 90 milhões de assalariados. Apesar desse peso, a chamada “crise de representatividade sindical” veio se expressando na queda do número de deputados federais oriundos da chamada “bancada sindical”, de 74 em 2002 para 46 em 2014, o questionamento das direções burocratizadas que explodiram, ainda de forma embrionária, nas greves dos garis do Rio de Janeiro, garis do ABC, dos rodoviários de Porto Alegre, no período posterior a junho. No inicio de 2015, exemplos mais recentes como a greve contra as 800 demissões na Volks, em que os operários demonstraram sua disposição de luta apesar do freio imposto pela direção do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a duríssima greve dos professores do Paraná, o recente plebiscito na Mercedes de São Bernardo do Campo em que rejeitaram por ampla maioria o acordo feito entre o sindicato e a patronal e a queda na votação obtida pelo PT nas eleições do ano passado no berço da CUT, certamente teriam deixado ainda mais preocupados os mesmos analistas com esta “indisciplina operária”. Nas greves em questão, que vieram na esteira do maior ascenso de greves desde 1995, os trabalhadores questionaram não os sindicatos, como ferramentas históricas de luta da classe operária, mas dirigiram sua fúria fundamentalmente contra os dirigentes sindicais burocratizados, encastelados na direção dos sindicatos ou de centrais sindicais há anos recebendo fortunas do governo repassadas através do imposto sindical, estes sim, associados diretamente ao regime político carcomido na democracia dos ricos.

A burocracia sindical cumpre um papel funcional à estabilidade da “democracia dos ricos”

A desconfiança dos trabalhadores em relação a políticos vindos do movimento sindical como Vicentinho, Paulinho da Força e tantos outros foi se acumulando ao longo de anos de traições, em que estes burocratas sindicais eram vistos sentados na mesma mesa que os patrões e o governo negociando a Reforma da Previdência no governo FHC, o valor do salario mínimo e a retirada de direitos. Isso somado ao fato de que as principais sindicais como a CUT, Força Sindical ou CTB são ligada diretamente aos partidos do regime como o PT, Solidariedade e PC do B.

Isso ocorre porque como dissemos nas Notas sobre os sindicatos e atuação dos revolucionários, ao reconhecer legalmente o papel dos sindicatos e centrais sindicais como instituições, o Estado burguês busca atrelar e disciplinar os sindicatos ao regime, através do imposto sindical e de leis como a CLT. Atrelada ao Estado, a burocracia sindical cumpre um papel de controle e contenção social, desmobilizando os trabalhadores, um papel criminoso e extremamente funcional à manutenção da ordem social dominante. Foi isso o que vimos mais uma vez, em junho de 2013, quando a burocracia sindical cumpriu conscientemente um papel de freio ao impedir que a classe trabalhadora brasileira confluísse ativamente com a juventude no auge das manifestações. Neste ano, em meio aos ajustes do governo e ao maior pico de desgaste de Dilma e do PT, a CUT e a CTB chamam os trabalhadores a se mobilizarem pela reforma politica, contra o suposto golpismo da direita e em defesa da democracia, ou seja, buscando preservar o governo e a estabilidade politica necessária aos interesses da classe dominante. Por outro lado as centrais sindicais pró-patronais, como a Força Sindical, chegam a falar em impeachment fazendo coro com a oposição burguesa ao governo, mas terminam se alinhando e reconhecendo medidas tomadas por Dilma e pela patronal contra os trabalhadores, “para retomar o crescimento”, como o PPE (Programa de Proteção ao Emprego), ou a aprovação da infame PL4330.

A verdade é que apesar das suas diferenças, nenhuma das centrais sindicais deseja que as manifestações saiam do controle e que os trabalhadores possam determinar seus próprios destinos, pois isso significaria romper os acordos da burocracia sindical com o governo e com a patronal.

No Brasil, esta relação entre a burocracia sindical com o regime político começam a transbordar até mesmo em meio às delações premiadas dos escândalos de corrupção da Lava Jato, como as declarações de Ricardo Pessoa, presidente da UTC que declarou abertamente ter feito doações de R$ 200 mil ao candidato Luiz Sérgio do PT e R$ 500 mil para Paulinho da Força, com a “contrapartida” de que usassem sua relação com os sindicatos da CUT e Força Sindical para assegurar que não houvesse greves “selvagens” como as de Jirau que impedissem a construção das obras do PAC. Ou seja, para que usassem seus assentos na direção dos sindicatos e das centrais sindicais não para denunciar as mortes e terríveis condições de trabalho, mas para assegurar a estabilidade necessária aos lucros das empreiteiras como OAS, Andrade Gutierrez e Camargo Correia.

Burocracia sindical como “peça da estabilidade do regime”, até quando?

A burocracia sindical em nosso país, no período de ciclo de crescimento brasileiro pôde "passivizar" a luta social e sindical com um pacto social entre governo e patrões que com seus elevados lucros e benefícios do governo Lula e Dilma podiam conceder reajustes salariais acima da inflação, gerar empregos enquanto o governo estimulava os negócios capitalistas (construção civil, concessões, financiamentos do BNDES etc.) e o consumo - lucros para bancos, empresas e serviços. Agora, com a crise econômica atuando e com o desgaste do governo Dilma e do PT, a burocracia terá muito menos margem para enganar e disciplinar os trabalhadores, abrindo a possibilidade de lutas e processos antiburocráticos, antipatronais e antigovernamentais, exigindo que a burocracia mostre sua verdadeira cara, barrando e traindo as lutas para manter sua aliança estratégica com a patronal (Força Sindical, UGT, CTB etc.) e o governo (CUT), mesmo que se veja obrigada a convocar alguma mobilização - controlada para manter o controle - contra medidas parciais do governo e da patronal. Ou seja, ao contrário de nesses casos elogiar e "parabenizar" esses burocratas, devemos estimular a desconfiança dos trabalhadores, propondo métodos de luta e frente única para elevar a "crise de representatividade sindical" ao patamar consciente da ruptura com essa burocracia. A esquerda deve se preparar para ser a "preparadora" dessa ruptura - de longo prazo, com diversas táticas e momentos - e não continuar com a estratégia oportunista de "criticar e exigir da burocracia", mas sem se mostrar disposta e capaz de tomar a direção, construir novos dirigentes e organizações (de base, coordenações etc.) de "uma nova direção combativa, democrática, classista e tendente a revolucionária".

Generalizar as experiências das greves nacionais contra o atual regime sindical

No combate necessário à burocracia sindical, seria um erro igualar os sindicatos, que são ferramentas fundamentais de luta da classe trabalhadora à atuação de suas direções burocráticas, o que levaria a subestimar que, mesmo nos sindicatos burocratizados podem se organizar os setores mais conscientes da classe trabalhadora, pois ainda que de forma instintiva, os trabalhadores sabem que não podem combater o capitalismo e os ajustes de Dilma lutando individualmente. Neste momento será fundamental dentro dos sindicatos generalizar lições dos processos anti-burocráticos que percorreram lutas operárias nacionais em que através dos organismos de democracia operária, como as assembleias e comandos de greve, a base disciplinava seus dirigentes sindicais fazendo pesar a força da auto-organização dos trabalhadores.

Frente ao papel que a burocracia sindical vem adotando crescentemente como auxiliar do governo e dos patrões, abre-se uma importante oportunidade para que os setores anti-governistas reunidos na CSP-Conlutas, nas Intersindicais e sindicatos e oposições dirigidos pela esquerda buscassem ter uma política consciente para incidir na “crise de representatividade sindical”. Seria necessário lutar por um polo classista, anti-governista e anti-burocrática que se dirija às bases das centrais sindicais exigindo que suas direções rompam com o governo e organizem um plano de luta efetivo em torno de um programa que unifique os batalhões da classe trabalhadora para revogar as MPs 664, 665, o PL 4330 da terceirização, e o PPE.

Infelizmente no Congresso da CSP-Conlutas não conseguimos votar políticas que neste momento fariam uma enorme diferença em relação a outras centrais sindicais como forte denuncia da arrecadação do imposto sindical e do atrelamento dos sindicatos ao Estado, e pela unificação das fileiras operárias través de uma campanha intransigente pela efetivação dos trabalhadores terceirizados e precários. Adotando uma política assim, certamente a CSP-Conlutas se destacaria como uma alternativa para os trabalhadores frente às centrais governistas e patronais contribuindo para passar por cima da burocracia sindical e retomar os sindicatos como ferramentas da luta de classes.

 
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