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RACISMO
O racismo na propaganda: Qual o limite do racismo?
Lourival Aguiar Mahin
São Paulo

Campanha racista de papel higiênico causa revolta nas redes sociais.

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Cerca de um mês após a denúncia contra as campanhas racistas da marca DOVE, que pertence ao grupo UNILEVER, uma campanha da marca de papel higiênico Personal, que pertence a empresa Santher (responsável também pela toalha de papel Snob, guardanapos Snob e Santherpel, lenço de papel Kiss, absorvente e protetor diário Sym, fraldas descartáveis Personal Baby e lenços umedecidos Personal Baby) causou novo desconforto. Anunciada nesta segunda, 23, o mais novo lançamento da sua linha, que é o primeiro papel higiênico preto produzido no Brasil, se utilizou da uma famosa frase da luta pelos direitos civis, “Black is Beautiful” (preto é lindo, em uma tradução livre) vinculada ao lançamento deste produto.

Historicamente a frase está ligada a uma campanha de valorização da beleza negra e aumento da autoestima dos negros, que nos EUA dos anos 60 tinham suas características físicas relacionadas com valores negativos. Reafirmar a beleza das pessoas negras era uma forma de resistência aos padrões de beleza brancos. O Slogan foi criado por militantes negros norte-americanos do movimento pelos direitos civis nos EUA e foi utilizado por personalidades como Angela Davis, Fela Kuti e Nina Simone, inspirou músicas e temas de álbuns, com o “Negro é lindo” de Jorge Ben e chegou ao outro lado do atlântico, sendo incorporado pelo movimento de consciência negra de Steve Biko na África do Sul.

O caso gerou enorme repercussão após o escritor Anderson França, o Dinho, publicar um texto sobre a campanha em seu perfil no Facebook. O Escritor acusou a marca de se apropriar de uma expressão usada por militantes negros durante a luta dos direitos civis nos anos 60.

"Numa atitude racista e irresponsável, consciente e deliberada, (a Santher) decidiu que essa expressão deve remeter a papel higiênico, cuja função qualquer pessoa conhece", escreveu. Ele ainda classificou o episódio como "um dos mais graves ataques racistas praticados por uma empresa brasileira".

Na página do produto no Facebook, que foi fechada para comentários e avaliações, internautas estão criticando a campanha, postando emojis de vomito e explicando o por que a frase não pode ser usada neste contexto. Todos os posts com o antigo slogan foram removidos.

A dramaturga negra Maria Shu escreveu em seu perfil no Facebook: “Na década de 60, punhos cerrados se ergueram ao ar para eliminar a noção de que as características naturais de pessoas negras — como cor da pele, traços faciais e cabelo — eram feias. A frase (e a ideia) eternizou”. Prosseguiu dizendo “Agora, a Personal pega esta mesma frase e esvazia o seu significado para promover um papel higiênico preto. Um tremendo desrespeito aos revolucionários da década de 60. Um desrespeito descomunal a nós negros, que bebemos dessa fonte para nos fortalecermos. Respeitem a nossa história. Respeitem a nossa luta!”.

A atriz negra Zezé Motta, que está no elenco de O Outro Lado do Paraíso, também comentou sobre a campanha:

“Não estou aqui para julgar uma atriz que faz campanha enrolada em um papel higiênico preto. Cada um faz e aceita o trabalho que melhor lhe convém”, iniciou Zezé, que comentou uma passagem pelos EUA no período da luta pelos direitos civis “Reparava que os negros americanos andavam de cabeça erguida. Não tinha essa postura subserviente que eu sentia no Brasil e em mim mesma. Essa viagem teve essa importância de fazer com que eu enxergasse meu país de fora. Voltei ao Brasil.
E cheguei pensando: Agora ninguém me segura”.

“Para uns pode parecer bobagem, mas para mim e para milhares de negras que viveram em plena década de 70, ‘Black is Beautiful’ foi algo extraordinário, passamos a nos aceitar, a nos empoderar. E não posso achar interessante uma campanha de papel higiênico preto (tá, tudo bem, sem nenhum problema, pois preto é uma cor, até aí, nenhuma ‘criatividade’ como essa me choca mais), ser VENDIDA COMO BLACK IS BEAUTIFUL. RESPEITO, POR FAVOR”, pediu a atriz.

A posição da empresa

A companhia colocou um banner em seu site com um pedido de desculpas público por eventuais ofensas feitas pela campanha.
Veja o comunicado da Santher e Neogama na íntegra:

“A mensagem criativa da campanha para o produto Personal Vip Black foi selecionada com o objetivo de destacar um produto que segue tendência de design já existente no exterior e trazida pela Santher para o Brasil. Nenhum outro significado, que não seja esse, foi pretendido.

Refutamos toda e qualquer insinuação ou acusação de preconceito neste caso e lamentamos outro entendimento que não seja o explicitado na peça.
Desta forma, Santher e Neogama vem a público informar que tal assinatura foi retirada de toda comunicação da campanha e apresentar suas desculpas por eventual associação da frase adotada ao movimento negro, tão respeitado e admirado por nós."

A marca respondeu rápido e retirou o slogan da propaganda, com medo de receber boicote a sua marca, como ocorreu com a marca Dove, que realizou uma campanha, em vídeo transmitido no Facebook, que continha uma mulher negra que se transformava em branca após a utilização do sabonete, como se a pele negra fosse uma sujeira. O desrespeito presente na propaganda da Personal, ao relacionar uma frase historicamente importante para a criação de uma nova visão sobre a beleza negra com um papel para limpar a bunda apenas nos deixa a sensação de que o recado que a marca quer deixar é que está “se cagando” para a história e luta dos negros. O Dinho também comentou sobre isso:

"Essa expressão, quando dita e repetida pelo militante negro da década de 1960, saía de uma garganta quase sufocada pela bota de um policial branco em Montgomery. Saía pela boca que golfava sangue no chão, baleada por racistas da KKK na Carolina do Sul. Saía com esforço dos pulmões de jovens que iam aos shows de James Brown, “Say it Loud, I’m Black, and I’m Proud” (“diga bem alto: eu sou negro e eu me orgulho”, em tradução livre), na noite da morte do Rev. Martin Luther King Jr. Pessoas morreram para que essa expressão fosse reverenciada até hoje.”

Se faz necessário um profundo debate sobre racismo na comunicação, que deve olhar para as demandas negras com maior atenção e respeito. Nós devemos combater pela raiz o racismo contido nas propagandas, que segue minando a autoestima de negras e negros cotidianamente e que segue atingindo centenas de negras e negros no mundo. Abaixo as empresas racistas!!!

 
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