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SÍRIA
A queda de Raqqa: a guerra civil na Síria depois do Estado Islâmico
Claudia Cinatti
Buenos Aires | @ClaudiaCinatti

As Forças Democráticas Sírias declararam definitivamente a queda de Raqa. Qual o significado político e militar da guerra civil síria e a situação na região?

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Tradução: André Arruda

Nesta terça-feira, 17 de outubro, as Forças Democráticas Sírias declararam definitivamente a queda de Raqa, a capital do califato proclamado pelo Estado Islâmico (EI) em 2014. Ainda que a conquista de Raqa tenha um valor propagandístico, sobretudo para o combate entre os Estados Unidos e o EI, seu significado militar é limitado e não tem alcance em si mesmo para colocar um fim na sangrenta guerra civil síria, que já está cursando seu sétimo ano.

A cidade, hoje reduzida a escombros depois de uma dura batlaha que durou quatro meses e cobrou a vida de milhares de civis atingidos pelos bombardeios norteamericanos, foi o símbolo do horror do EI, onde foram realizadas decapitações e execuções com um alto impacto público.

O Estado Islâmico tomou o controle de Raqqa em Março de 2013, deslocando e cooptando diversas frações "rebeldes" do Exército Livre Sírio e da rente Al Nusra (ligada à rede Al Qaeda) que haviam derrotado as forças do regime de Assad, durante as etapas iniciais da guerra civil.

Com a proclamação do Califato o EI alcançou o pico de sua ofensiva militar, atraiu dezenas de milhares de combatentes para suas fileiras, provenientes de 84 paises. Se calcula que cerca de 3.000 eram originários de paises europeus.

Entretanto, desde o início de 2015 o EI entrou em uma decadência sem retorno sob a ofensiva dupla da aliança entre Moscou, Irã e o regime sírio de Bashar el Assad e dos aliados dos Estados Unidos, em particular as milícias curdas radicais localizadas nas Unidades de Proteção Popular, que logo após terem derrotado o EI em Kobane aprofundaram a sua colaboração tática com o bando norte-americano.

A derrota em Raqqa foi precedida pela expulsão do EI da cidade de Mosul, depois de uma batalha sangrenta com o exército iraquiano. Hoje, o califado deixa virtualmente de existir. Calcula-se que as milícias do Estado Islâmico tomaram o controle de alguns pequenos territórios ao redor da fronteira entre a Síria e o Iraque e de bolsões localizados no sul, na província de Deir al-Zour, sob o controle do regime sírio com apoio da Rússia e do Irã.

A crescente debilidade do EI, longe de colocar um fim no conflito, pode abrir uma nova etapa na multifacetada guerra civil na Síria, caracterizada por alianças alternantes e contraditórias e pela intervenção de potências e atores regionais que resolvem suas rivalidades através de milícias locais.

Tudo indicaria que, por agora, o regime ditatorial de Assad conseguiu sobreviver com a ajuda da Rússia, Irã e das milícias de Hezbollah. Ainda que não com volume de forças suficientes para ditar os termos de uma eventual negociação de pós-guerra.

Mesmo com seu toque provocador pessoal, Trump manteve essencialmente a política de Obama: priorizar a derrota do EI, aceitar de vez a divisão das tarefas com Rússia-Irã, intervir com bombardeios aéreos e manter de pé a aliança tática com as milícias curdas.

A narrativa é mais complicada. Iraque declarou guerra à independência do Curdistão Iraquiano, impulsionada pelo Partido Democrático do Curdistão e consolidada num referendo realizado no dia 25 de setembro. Diante da possibilidade de se proclamar um Estado Curdo soberano se opõe uma série de fatores que, por sua vez, estão se enfrentando em outros campos, entre eles: a União Patriótica do Curdistão, o outro partido curdo do Iraque, Iraque, Irã, Turquia e os Estados Unidos. No mesmo momento em que as milícias da YPG celebraram o triunfo em Raqqa, o governo iraquiano avançava com seu exército sobre a cidade de Kirkuk, o centro do Curdistão Iraquiano e uma das zonas petroleiras mais ricas do país.

Na Síria, mas sobretudo no Iraque, a população sunita, marginalizada da distribuição de poder, fomentou milícias radicais como o Estado Islâmico, ainda que não mais do que como um meio para combater seus próprios inimigos. De fato, várias análises da composição do EI indicam que haveria uma maioria de oficiais do velho exército de Saddam Hussein em suas fileiras. Novamente, entre as forças que hoje controlam Mosul e Raqqa - o exército iraquiano chiita e os curdos - não existem setores sunitas significativos.

Em última instância, as condições que levaram à emergência do Estado Islâmico persistem e tem se agravado. A ocupação norte-americana do Iraque e a sua política de "troca de regimes" exacerbou a guerra intra-islâmica entre os chiitas e sunitas, utilizando este enfrentamento a seu favor. Trump revitalizou suas velhas alianças com a monarquia saudita e Israel. O intuito de Trump de degradar e eventualmente abandonar o acordo nuclear com o Irã é uma resposta a estas opções estratégicas, que também incluem um crescente militarismo como forma de reverter a hegemonia decadente norte-americana.

 
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