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EDUCAÇÃO
Religião nas escolas: um aprofundamento do machismo, racismo e LGBTfobia
Amanda Navarro
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Ontem, conforme noticiado pelo Esquerda Diário foi aprovado o decreto que permite o ensino religioso nas escolas em seu modelo confessional. Em teoria, significa que a escola poderá oferecer aulas sobre religião e que o professor, que pode ser alguém pago ou associado à alguma instituição religiosa, poderá ministrar as aulas incluindo ensino sobre valores e aspectos da religião em questão. Na prática, o que isso significa? As escolas poderão adotar o modelo e escolher qual é a religião que será ensinada na disciplina ofertada, fazendo alusão aos dogmas desta religião, transformando a sala de aula num verdadeiro culto à religião.

O decreto também expõe que o ensino religioso é facultativo, ou seja, é opcional, sem acarretar consequências acadêmicas na formação do aluno. Entretanto, não podemos ignorar que de todas as denúncias sobre intolerância religiosa, a religião que encabeça a lista no Brasil são aquelas de matrizes africanas, como candomblé e umbanda. Cerca de 26,7% são candomblecistas e 25,8% umbandistas, logo mais de 50% das denúncias feitas sobre intolerância religiosa que contemplam agressões físicas aos indivíduos, destruição aos templos religiosos e perseguição, ocorrem com aqueles que seguem as religiões de matrizes africanas.

As religiões de matrizes africanas, como umbanda e candomblé, são vítimas de ignorância e, principalmente, de racismo. São inúmeros os ataques, como apedrejamento e ateamento de fogo em terreiros que acontecem no Brasil, todos motivados por racismo sobre essas religiões e seus praticantes. Assim, pode-se imaginar quão perseguida seria uma criança que seja aluna de uma escola que oferte o ensino religioso confessional de bases cristã: sofreria ainda mais perseguições, em plena sala de aula e por alguém pago pelo Estado.

Assim, na prática, o ensino religioso confessional pode aprofundar ainda mais o racismo nas salas de aulas, que já brutaliza as vidas em termos subjetivos e materiais de diversas pessoas. Crianças que possuam características que claramente demonstram que são frequentadores de terreiros de umbanda ou candomblé, por exemplo, serão cada vez mais perseguidas, seja por vias de agressões verbais ou físicas.

Ainda este ano, antes da aprovação deste decreto absurdo, ocorreu um caso em Belém, onde estudantes foram impedidos pela diretora e dona da escola, chamada Ana Trindade, de apresentarem em aula sua pesquisa sobre uma entidade da umbanda: a pomba gira. Quando os alunos contra-argumentaram, a diretora respondeu: “Pombagira? Credo! Sangue de Jesus” e completou “Eu tenho que dizer pra vocês: aqui dentro da minha escola vai funcionar, vai se realizar e vai se apresentar o que eu achar que é de Deus. Nada de Pombagira aqui dentro”.

Recentemente também vimos, no Rio de Janeiro, ataques brutais a terreiros, onde os agressores obrigavam os praticantes da religião a destruírem o próprio templo, enquanto proferiram palavras racistas de puro ódio. Alguns vídeos foram divulgados nas redes sociais, onde os agressores filmaram sua própria ação.

É fato que notícias e cenas como essas não deixarão de se repetir quando os alunos afrontarem e expuseram o preconceito de base racista que envolve essas religiões, pois existe uma hegemonia cristã em vigor, e com certeza continuará marginalizando e atacando as religiões de matrizes africanas. Esse decreto aprofundará ainda mais o racismo latente, fortalecendo tais posturas em sala de aula.

A QUESTÃO DE GÊNERO E SEXUALIDADE NAS ESCOLAS

O decreto que permite o ensino religioso confessional também terá sua consequências nas questões de gênero: com a permissão de propagação de crenças e dogmas religiosos, podem incluir, por exemplo, questões sobre como as mulheres devem se comportar e como devem reproduzir seus papéis sociais de gênero.

Dados oficiais sobre aborto, entretanto obviamente subestimados, uma vez por ser criminalizado torna-se ainda mais difícil termos a real dimensão deste problema, afirmam que em média 4 mulheres são internadas por dia no SUS por complicações em abortos clandestinos. Somos também o país com 18% de gestantes adolescentes, e 66% destas gestações são indesejadas. Assim, em meio a gigantesca importância que se configuram os debates de gênero dentro das escolas, principalmente em torno da educação sexual dos adolescentes, o STF julga mais importante gastar milhões de reais com propagandas reacionárias e massacrando ainda mais as crianças e a juventude com uma ideologia que rechaça, oprime e humilha mulheres.

Os debates de gênero são fortemente barrados nas escolas, com grande apelo público das camadas mais conservadoras de políticos e figuras públicas reacionárias, que tendem a reforçar as ideologias de opressão às mulheres. Para o debate de identidade de gênero, a resposta dessas figuras foi a mesma: nenhum tipo de fomento para suscitar entre jovens o importante debate sobre LGBTfobia, sobre perseguição e opressão nos ambientes familiares, de trabalho e estudo. O país que mais mata pessoas trans e onde a cada 25 horas acontece uma agressão motivada por LGBTfobia, o STF quer cristalizar ainda mais as religiões e conservadorismos, frente a necessidade de debates de caráter urgente em vários espaços, principalmente os escolares.

Assim, ao invés de oferecermos a juventude ferramentas para avançarmos enquanto sociedade nos direitos democráticos como aborto, saúde da mulher e da adolescente, às agressões aos LGBTs, estamos caminhando para o oposto disso, com a permissão do debate que vai na contramão.

O complemento direto do "Escola sem Partido" é o Escola com padres e militares. Esse projeto precisa ser fortemente combatido pelos trabalhadores da educação, pela juventude, pais e mães, que desejam a liberdade de ensino, o respeito à diferentes adesões religiosas contra a imposição estatal de uma religião única, além do debate sobre os direitos das mulheres e da população LGBT.

 
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