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A precarização do ensino na USP e a reforma curricular, ou "Universidade sem partido"
Guilherme Hurba
Lana Cocci
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A USP desde 2014 não tem feito contratação de professores universitários com dedicação exclusiva. Esses professores foram contratados para o ensino, pesquisa e extensão, que são os três pilares que garantem a qualidade de ensino da universidade.

Isso tem afetado principalmente as licenciaturas e o curso de pedagogia, já que estão tendo que contratar professores provisórios para preencher essa lacuna da não contratação de professores titulares. Mas o que isso afeta concretamente na qualidade da educação?

Esses professores precisam dar aula em diversas outras universidades e não conseguem ter tempo para preparar aula, realizar ações, projetos para além da disciplina que está sendo dada em sala considerando aspectos políticos e sociais. Esse maior envolvimento com as política públicas, acessibilidade de questões da educação também para fora dos muros da USP só acontece quando há uma dedicação exclusiva do professor universitário.

Diante desse cenário, no primeiro dia de volta às aulas desse semestre, chegou pro conjunto dos estudantes a reforma curricular, Deliberação 154/2017 que o CEE (Conselho Estadual de Educação) estava querendo implementar já no dia 25 de Agosto. Essa reforma consiste em revisar 200 horas de ensino do ciclo básico (fundamental e médio) em todas as licenciaturas e 600 horas para a pedagogia SUBSTITUINDO matérias que já existem, e não como um complemento para suprir uma falha do ensino básico nas escolas públicas.

Essa reforma do CEE que afeta as três estaduais paulistas (USP, UNESP E UNICAMP) não vem sendo debatida nem com os professores, muito menos com os estudantes das licenciaturas e pedagogia, demonstrando um carácter totalmente autoritário e antidemocrática no que diz respeito a mudanças que afetam toda a comunidade universitária.

Nas licenciaturas, essas matérias de revisão do ciclo básico não correspondem a quaisquer demandas ou debates de currículo dos cursos, uma vez que a deliberação diz que elas serão trazidas diretamente para o currículo, sem uma conexão com as particularidades de cada curso, ou seja, é um ensino de caráter tecnicista que precariza mais as licenciaturas em relação a bacharelados, uma vez que o ensino específico atual que é voltado não só pra formação docente, mas também de pesquisador, terá maior redução, já que se trata de uma substituição para abrir as 200 horas de revisão do ciclo básico.

As licenciaturas hoje possuem a disciplina LIBRAS por EAD (Educação à distância), que consiste em um ensino que pouco envolve os estudantes a aprender, discutir e tirar dúvidas nas aulas, sendo uma concepção de educação totalmente voltada pro ensino técnico, para a "transmissão de conhecimento", como se a educação não envolvesse toda uma complexidade que jamais será tratado em uma aula a distância comparado a presencial.

Além disso, essa disciplina está com falta de professores, mesmo sendo a distância, o que nos faz refletir sobre a impossibilidade da USP garantir professores presenciais que ministre essas aulas de revisão do ciclo básico que a reforma curricular está propondo.

Na pedagogia, o CEE apresenta as 600 horas de revisão sugerindo que as disciplinas do primeiro ano sejam substituídas por matérias atuais como História da Educação, Filosofia da Educação, Sociologia da Educação, Fundamentos Econômicos, Psicologia da Educação e Didática. Essas matérias são atualmente fundamentais para a formação crítica do pedagogo, educador, professor refletir sobre diferentes aspectos da educação e concepções de mundo, só assim conseguimos garantir uma formação mais ampla que seja capaz de analisar o sistema atual de educação considerando as ideologias e políticas existentes, o que na prática hoje vem sendo massacrada pelo escola sem partido, onde apenas a ideologia capitalista dominante tem oportunidade para existir.

Por isso também entendemos que essa reforma representa a "universidade sem partido", porque além da deliberação, o CEE está exigindo dos professores uma planilha específica das disciplinas dizendo que autores devem ser mais ou menos trabalhados, ou seja, uma intervenção maior do Conselho Estadual de Educação. Vale lembrar que o banco mundial está nesse conselho, no mesmo momento em que vivemos uma crise orgânica, social, econômica e política no país onde a direita conservadora vem ganhando cada vez mais força e espaço.

O CAPPF ( Centro Acadêmico da Faculdade de Educação) desde a primeira semana de aula tem feito uma série de debates e ações contra a reforma curricular. Uma primeira reunião de estudantes pra discutir primeiras impressões sobre a reforma, em seguida organizamos em conjunto com professores e funcionários da FEUSP uma plenária dos três setores em que conseguimos aprofundar melhor o debate.

Começamos incessantemente a fazer passagens e panfletagens por toda a USP, principalmente os cursos de licenciatura e pedagogia, e ao mesmo tempo fortalecendo o debate em cada curso a partir do acúmulo de debate que fizemos em várias atividades na Faculdade de Educação.

A FEUSP, com assembleia somando mais de 120 estudantes, e as Cênicas paralisaram no dia 25 de Agosto, que seria data limite da reforma entrar em vigor em primeira instância, mas com toda a mobilização conseguimos com que essa data fosse adiada para 25 de Novembro. Nesse dia de paralisação tivemos o início da Semana de Estudos Africanos e uma mesa pra discutir a reforma curricular com mais de 100 estudantes, na qual conseguimos ganhar mais um aliado para essa luta, o Deputado Carlos Gianazzi, que esteve presente e iniciou uma pressão no parlamentar com ações no judiciário para questionar essa reforma.

Em meio a uma necessidade de apresentar uma contrareforma, o CAPPF está promovendo uma discussão de qual currículo queremos na universidade, essa semana de estudos africanos começou a ser organizada em conjunto com estudantes de diversos cursos em resposta a um currículo atual em que a educação é totalmente eurocentrada.
Depois disso, no dia 14 de Setembro, o curso de Letras também paralisou.

Nessa última quinta e sexta-feira Diretores do Centro Acadêmico da Faculdade de Educação estiveram em um debate na UNICAMP pra discutir e fortalecer a discussão sobre a reforma curricular, além de conversar com os estudantes passando nas salas de aula.

É essencial que nesse momento todos os Centros Acadêmicos e DCE tenham como pauta principal a luta contra a reforma, pois estaríamos muito mais avançados nessa luta, se não fosse a negligência das direções como o DCE (PSOL E PCB) e muitos CA’s que em grande parte são dirigidos pelo Levanta Popular da Juventude e pelo Balaio – Núcleo de estudantes petistas da USP.

Enquanto essa reforma está vindo para destruir a formação de milhares de professores das licenciaturas e pedagogia, que são cursos onde tem maior taxa de ingressantes de escola pública, mulheres e negros, esses setores do movimento estudantil citados acima, se preocupam em levantar a campanha "diretas pra reitor", que em nada ajuda na mobilização dos estudantes e ao mesmo tempo apresenta uma grande confiança em uma estrutura de poder que é totalmente antidemocrática.

O ataque que está sendo feito nos mostra algo, mudar o reitor não significa garantir alterações na universidade enquanto existir um conselho universitário que representa os interesses empresariais e não as demandas da população que mantém de pé a universidade, além de que esse conselho tem uma representação mínima de estudantes e funcionários, sendo que a maior parte de cadeiras é de professores com supersalários.

É importante que nesse debate todo o movimento estudantil pense em que reforma curricular nós queremos, uma reforma que leve o combate eficiente a todas as opressões e pense na educação não apenas como uma mera "transmissão do conhecimento" ou uma mercadoria, e que pela educação questionadora a gente consiga se opor a toda forma de exploração. Precisamos também exigir que o livro de contas da USP seja aberto, para que saibamos para onde vai o dinheiro público, e que a gente consiga avançar nos debate que dizem respeito a permanência estudantil, ampliação de bolsas para pesquisa, e todos os outros serviços que são essenciais para uma universidade pública de fato. Para isso, precisamos avançar na discussão sobre dissolução do conselho universitário, para que a universidade seja gerida pelo três setores (Estudantes, Funcionários e Professores) e consiga alcançar essas mudanças capazes de tornar a USP mais acessível, pelo fim do vestibular que hoje só serve para manter os jovens da escola pública fora das universidades.

 
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