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CRISE POLÍTICA
À procura de um Macron, a burguesia vai parindo um Maia
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy

Parece se desenhar, no interior da casta política que foi base do golpe institucional (e também daqueles setores que foram oposição) um considerável leque de apoio à ideia de que Rodrigo Maia substitua Temer na presidência.

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O parecer favorável do relator Sérgio Zveiter à denúncia contra Temer, esperada que fosse, é mais um indício desse “entendimento em caminho”. Renan Calheiros e eminências do golpismo tucano, como Tasso Jereissati e Cássio Cunha Lima, dizem que Temer “já era”. Um palaciano “golpe dentro do golpe” que colocaria – interinamente, de início – o inimitável presidente da Câmara, que considera as leis trabalhistas um obstáculo aos direitos de lucro dos patrões, no lugar do governo hemorrágico de Temer.

Nada anuncia que será um processo pacífico nas cúpulas. Especula-se que Temer, mesmo desoxigenado, vai resistir; e se vier a sair, poderia arrebentar a porta atirando em seu parceiro de ajustes do DEM. Hipóteses de desespero. O certo é que há “mais coisas entre o céu e a terra” do que os desejos do presidente da Confederação Nacional da Indústria, que em nome do empresariado afirmou que Temer devia ficar para por fim à turbulência nos negócios. Uma daquelas coisas é o capital financeiro internacional.

O Financial Times escrevia há alguns dias que, ainda que Temer seguisse na presidência fruto da defesa da Câmara, a economia brasileira pagaria o preço e seguiria decaindo na esteira de um governo incapaz de aprovar as reformas contra os trabalhadores. É possível que os bandidos do Congresso tenham ouvido essa voz. Mas a exigência do jornal das finanças imperialistas não se detinha aí. Clamava por um Macron brasileiro.

A montanha pariu um Maia

Como barômetro sensível dos interesses do capital estrangeiro no Brasil, algumas almas do PSDB ecoam essa busca pela versão brasileira de Emmanuel Macron, presidente francês, em meio à crise.

Fernando Henrique Cardoso é um deles. Insistiu nas últimas semanas que o PSDB desembarcasse do governo que apoiou até agora a fim de futuramente dar origem a uma “nova figura da velha política” com legitimidade para atacar, ou ser parte de um governo tal.

FHC disparou dessa forma, em palestra a empresários paulistas: “Neste quadro, o presidente Michel Temer tem a responsabilidade e talvez a possibilidade de oferecer ao país um caminho mais venturoso, antes que o atual centro político esteja exaurido, deixando as forças que apoiam as reformas esmagadas entre dois extremos, à esquerda e à direita [...] Progressista quer dizer que não é Trump, não é falar contra a globalização. É mais Macron, progressista. Não é um partido, tem que juntar gente de vários partidos. Democrático, que mantenha a Constituição e que preste atenção ao povo. Popular é isso”.

Mas por que Macron? Banqueiro e ex-ministro da economia de Hollande, Emmanuel Macron representa o que as finanças estrangeiras qualificam como “populismo de centro”, que se afasta das alternativas à direita e à esquerda do chamado “consenso neoliberal”, profundamente golpeado pela crise de hegemonia dos partidos tradicionais da classe dominante, preservando o centro político com um discurso “renovado”.

Macron venceu as eleições presidenciais com sólida margem de votos contra Marine Le Pen, freou momentaneamente o perigo de ruptura da União Europeia e conseguiu ampla maioria parlamentar na França para aplicar uma dura reforma que flexibiliza os direitos trabalhistas. Banhado pela legitimidade das urnas, não encontra por ora a resistência às reformas, como encontrou seu predecessor.

É neste exemplo que se inspira FHC para defender a proposta de que Temer renuncie e antecipe eleições diretas (o “Diretas Já”, defendido por um espectro que vai desde o PT até amplos setores da esquerda).

Entretanto, a montanhosa crise política brasileira vai parindo um Maia, não um Macron. Tendo a possibilidade de recompor a antiga base de Temer – através dos artifícios de corrupção de que Maia é mestre – ainda assim está por ver-se quanto do “vazio de governo” legado por Temer esse eventual governo poderia superar.

A estratégia poderia ser atrasar o máximo possível a saída de Temer, para que a eventual posse de Maia deixasse tempo suficiente para uma nova ofensiva das reformas, mas não grande o suficiente a ponto de eriçar um movimento por eleições diretas imediatas, que seguiriam oficialmente em 2018. Nesta terça (11/7) a primeira prova será a votação da trabalhista na Câmara.

Mas a dificuldade ainda persiste. Como dissemos, na França o novo governo tem a unção das urnas para aplicar uma versão mais brutal da reforma trabalhista do que aquela do desprestigiado François Hollande. Maia não teria a chancela do voto para aplicar a reforma trabalhista, nem dizer a da previdência; pior, é fruto direto do Congresso golpista e corrupto, odiado pela população. Dificilmente colocará para trás a crise de governo, nem falar da enorme crise orgânica que atravessa os partidos tradicionais (que para Gramsci é uma crise de hegemonia não apenas "ético-política", mas também econômica, quando a classe dominante não apresenta perspectivas no horizonte).

Sem dúvida, o eventual “presidente Botafogo” não chega a ser o queria o Financial Times. E nada indica que o Macron tupiniquim está saindo do forno de Brasília até 2018.

As últimas pesquisas mostram enorme desprestígio de toda a “casta” do Congresso e dos partidos tradicionais, sem uma figura que restaure a hegemonia do regime político. De fato, Lula é o político mais bem posicionado nas pesquisas para 2018, e o PT atingiu a sua maior popularidade desde a segunda posse, sendo o partido favorito de 18% da população segundo Datafolha (PSDB e PMDB empatam com apenas 5%). Doria supera os 10% em alguns cenários, mas ainda não encanta; Alckmin é figura marcada de um partido criticado hoje pela própria mídia de direita.

Por isso, Lula e o PT fazem o possível para controlar o movimento de massas, bloquear qualquer alternativa política independente à sua esquerda e conter a luta dos trabalhadores, usando a campanha “Diretas Já” para promover o “Lula 2018”. Como não podia deixar de ser, esse projeto estratégico está a serviço de recompor o regime político burguês e o pacto com a direita golpista, tudo em função da institucionalidade e governabilidade sempre asseguradas pelo PT.

A classe trabalhadora não está derrotada nem deu seu veredito

A sorte das elites dominantes não é a mesma segundo os distintos países. O Brasil nem de longe é a França; Maia não é Macron. Mas a classe trabalhadora brasileira, que aqueceu sua musculatura em jornadas históricas de paralisação nacional tem enormes recursos e capacidade de resistência, como tem a poderosa classe trabalhadora francesa que protagonizou quatro meses de greves e piquetes contra as reformas de Hollande em 2016.

A classe trabalhadora brasileira não sofreu derrotas decisivas ainda. Tem a desvantagem de já sofrer com as reformas e o enorme desemprego provocado pela patronal com auxílio de Temer; a burocracia sindical atua como freio ainda eficaz da luta de classes. Mas os trabalhadores contam com a vantagem de que a classe dominante está dividida e sem plano claro do porvir, brecha através da qual pode intervir com seus métodos e sua força independente. Esse é um grande momento para desenvolver uma ferramenta política dos trabalhadores, independente do PT e de qualquer variante patronal.

 
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