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GÊNERO
Mexeu com uma, mexeu com todas: como avançar pra derrotar o machismo e o capitalismo?
Diana Assunção
São Paulo | @dianaassuncaoED

José Mayer, Victor Chaves e tantos outros. Neste artigo buscaremos fazer uma abordagem para além dos casos em si, pensando os avanços do movimento feminista internacional, os paradoxos que se encontram frente à institucionalização de nossas demandas e pensar caminhos a estratégias para derrotar todas as formas de opressão.

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Nas últimas semanas dois casos que envolvem violência contra as mulheres tiveram muita repercussão no país. O assédio sexual cometido e assumido por José Mayer contra a figurinista Susllem, e o caso envolvendo Victor Chavez da dupla Victor e Leo, e sua ex-esposa Poliana. Neste artigo buscaremos fazer uma abordagem para além dos casos em si, pensando os avanços do movimento feminista internacional, os paradoxos que se encontram frente à institucionalização de nossas demandas e pensar caminhos a estratégias para derrotar todas as formas de opressão.

O eterno galã global, um dos atores mais ricos da TV e a verdadeira “cara” da Rede Globo foi rapidamente afastado do canal após assumir que cometeu assédio sexual contra uma funcionária.

Isso não se explica facilmente, já que ninguém pode se convencer de que “de repente” a Globo está do lado das mulheres. O fato é que a força da luta das mulheres no mundo inteiro vem ao longo dos últimos anos conseguindo combater os aspectos mais reacionários e misóginos no comportamento em distintos âmbitos da sociedade, seja nas empresas, seja nos meios de comunicação ou nas propagandas de TV.

Os valores passaram a ser mais questionados, ao mesmo tempo em que a luta das mulheres veio tomando mais força. Isso não ocorre sem reação, sem o levantamento de figuras que expressam a cara mais reacionária da política, como por exemplo Donald Trump nos Estados Unidos que foi “recebido” com uma manifestação histórica de mulheres.

Mas este movimento vem de antes. Já havíamos apontando que a ofensiva do neoliberalismo a partir da década de 1980 veio combinada a uma institucionalização das demandas dos movimentos sociais, ou seja, a luta das mulheres e dos movimentos sociais passou a ser parte da “agenda” neoliberal. Com algum atraso, o Brasil também passou a considerar que estas demandas deveriam ser parte de uma conduta do “politicamente correto” sem necessariamente ameaçar as estruturas atuais que fundamentam uma sociedade dividida em classes.

Este ponto de vista é importante para compreendermos o paradoxo atual: ao mesmo tempo em que esta situação somente acontece por resultado da enorme força da luta das mulheres, é preciso enxergar que a institucionalização das nossas demandas tem como objetivo principal esvaziá-las de seu conteúdo radical e subversivo, ou seja, tornar demandas aceitáveis por empresas, meios de comunicação e principalmente, aceitáveis em uma sociedade capitalista. É por isso que, frente ao escândalo envolvendo José Mayer, a Rede Globo não teve outra saída a não ser afastar um de seus principais atores, pra tentar buscar uma imagem de um canal moderno que avança em seus valores e supostamente respeita as demandas das mulheres.

Os impactos dessa decisão são muitos, e o principal e mais interessante é que torna pauta nacional o tema da violência de gênero, o que pode contribuir para enfrentar o grotesco e escandaloso retrato da violência no Brasil: uma mulher é agredida a cada 3 minutos, uma mulher é assassinada a cada 2 horas.

Mas nós sabemos que a justiça que a vítima buscava neste caso só foi conquistada pela luta das mulheres. Além disso, o caso específico envolvendo José Mayer e a figurinista Susllem traz outro debate a tona. O assédio sexual nos locais de trabalho, que ocorrem em especial a partir de chefes, gerentes ou pessoas em posição hierárquica superior, como foi o caso. Trata-se de uma realidade brasileira, que se ocorre em espaços como a Rede Globo, quem dirá nas fábricas, empresas e nos locais de trabalho precário Brasil afora. Se apoiar em uma posição de poder, usando da exploração capitalista e sua consequente posição de subordinação, pra oprimir e assediar mulheres é uma forma clara da combinação entre opressão e exploração, da qual é fundamental a organização nos locais de trabalho pra poder enfrentar.

Mas enquanto combatemos cada caso de assédio, enquanto apoiamos cada demanda ou movimento democrático contra a violência, os números da violência de gênero não desaparecem. E mesmo que a Rede Globo afaste seus atores que assediam, ou abra espaço pra programas com pautas progressistas como é o Amor & Sexo, o canal continua sendo o principal meio de comunicação da classe dominante e nós continuamos vivendo em uma sociedade baseada na desigualdade.

A questão é: como transformar cada conquista na luta das mulheres, contra a violência e contra o assédio em um ponto de apoio pra abrir o caminho para a nossa verdadeira libertação?

Em primeiro lugar, não permitir que nossas bandeiras sejam esvaziadas de seu conteúdo radical. O sistema capitalista pode, de forma parcial, assumir algumas das nossas bandeiras e assim o faz para criar inclusive novos “nichos de mercado”, mostrando-se acessível e plural frente as novas realidades de comportamento. Mas o capitalismo não pode resolver o problema das mulheres pois mais de metade da força de trabalho é feminina, e as mulheres são 70% da população pobre em todo o mundo. Isso significa que se queremos ser um feminismo que questione as estruturas da sociedade e não que se renda ao conto de fadas do feminismo neoliberal, é preciso enfrentar a sociedade capitalista. A carta das ativistas feministas norte-americanas fazia um chamado a um feminismo dos 99% e não do 1%, não um feminismo burguês. Este chamado, para nós que nos reivindicamos socialistas e revolucionárias, abre um enorme espaço pra pensar quais são as estratégias que devemos levar adiante.

A institucionalização de nossas demandas tem como objetivo esvaziar o conteúdo de nossa luta principalmente para que nossos objetivos sejam reduzidos a reformar a sociedade tal como ela é, e transformar qualquer conquista parcial na vitória final, como se a luta das mulheres pudesse se reduzir inclusive a uma lógica meramente punitivista, que isenta o Estado capitalista na manutenção da opressão, tratando-a apenas como um problema cultural ou do ínviduo, por fora da estrutura de classe da sociedade.

Estas lições já estão inseridas no movimento feminista há muitos anos, o que nos falta é colocar em práticas e não voltar sempre ao mesmo ponto. É por isso que de cada conquista que temos fruto da mobilização das mulheres, precisamos ser conscientes: nem todas as mulheres enfrentam a violência com o mesmo objetivo, e se queremos transformar a sociedade precisamos ter uma estratégia que seja revolucionária porque para as mulheres trabalhadoras é decisivo enfrentar a violência machista lutando também contra o capitalismo. Para todas as outras mulheres também é decisivo, já que querer sua emancipação em meio a sociedade capitalista é uma utopia, e não há nenhuma outra forma de abrir espaço pra nossa emancipação que não seja destruindo esta sociedade tarefa que só pode ser encabeçada pela classe que tudo produz, que é a classe operária.

Que os governos de direita reacionária queiram inclusive separar a luta das mulheres da luta da classe operária mostra um objetivo consciente contra uma aliança que pode ser explosiva. É por isso que quando as mulheres, com sua força, conseguem combater o machismo e o assédio se abre um enorme espaço para batalhar por uma perspectiva anticapitalista e revolucionária, que mostre que sem uma estratégia nossas conquistas vão se transformar em fortalecimento das estruturas atuais, e não ponto de apoio pra dar fim a toda a forma de opressão. É essa batalha que precisamos levar adiante pra dizer com toda a força que mexeu com uma mexeu com todas ao mesmo tempo que queremos uma sociedade onde ninguém mexa com ninguém, livre de toda a forma de opressão. Por isso convido a leitura do Manifesto Internacional do grupo de mulheres Pão e Rosas que apresenta a perspectiva da revolução socialista na luta das mulheres.

 
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