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COMO COMBATER A VIOLÊNCIA À MULHER?
Por que a violência contra as mulheres não pode ser resolvida pelas mãos do Estado capitalista?
Simone Ishibashi
Rio de Janeiro

Resolver pela via do Código Penal delitos que tenham relação com o âmbito privado ou social não pode ser uma saída para as mulheres, trabalhadores, negros e todos os setores oprimidos, pois isso significa aumentar o poder punitivo do Estado burguês.

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Nas últimas semanas, às vésperas do 8 de março, dois casos que envolvem violência contra as mulheres e abusos se tornaram centro dos debates. O primeiro é o do ex-goleiro Bruno, que assassinou Eliza Samudio, mãe de seu filho Bruninho, em meados de 2010. Foi um caso assombroso de um crime machista, em que Bruno, por negar-se a reconhecer a paternidade da criança, e após ter forçado Eliza a fazer um aborto ao qual ela se negou, a esquartejou e escondeu seu corpo, que até hoje não foi encontrado. Na época Bruno era um jogador famoso e rico. Condenado por um júri popular a 22 anos de prisão em 2013, Bruno foi solto na semana passada, depois de apenas 4 anos, para ficar em regime domiciliar.

Vários clubes já se ofereceram para contratá-lo, algo que jamais ocorre quando se trata de um ex-presidiário negro e pobre quando cumpre sua pena. Fotos de pessoas tirando selfies, e tratando-o como uma celebridade, torna o caso ainda mais revoltante. Sua liberdade é a maior prova da “compreensão” que presos ricos e famosos gozam frente ao Estado capitalista.

O outro caso que também se transformou em alvo de debate foi a redução das penas para alguns casos de abuso e estupro de vulneráveis. Evidentemente se trata de um projeto que minimiza os efeitos da violência sexual contra menores de idade, naturalizando os abusos sexuais. Como resposta a isso, a senadora do PCdoB Vanessa Grazziotin, propôs aumento da pena para o caso de estupro coletivo.

Ambos os casos se tornaram alvo de críticas, por demonstrarem que há uma grande naturalização e tolerância com a violência machista e os abusos sexuais. No caso do goleiro Bruno a raiva que foi expressada com a sua libertação é ainda maior, pelo caráter absolutamente hediondo do assassinato que cometeu. Essa raiva contra a banalização à violência machista, tão típica no capitalismo, é mais do que justificada.

No último carnaval da cidade do Rio de Janeiro uma mulher foi agredida a cada três minutos. De acordo com o Mapa da Violência que comparou índices de feminicídios em 83 países, o Brasil é o quinto país em que se matam mais mulheres, com um crescimento dos casos em 21% na última década. Uma situação absolutamente inadmissível, que é uma das facetas mais brutais dessa sociedade de exploração e opressão em que vivemos. No entanto, é preciso debater quais são as respostas que efetivamente podem dar uma saída para essa situação de violência contra as mulheres.

O aumento do poder punitivo do Estado burguês não é uma saída

Resolver pela via do Código Penal delitos que tenham relação com o âmbito privado ou social não pode ser uma saída para as mulheres, trabalhadores, negros e todos os setores oprimidos, pois isso significa aumentar o poder punitivo do estado burguês. Sobretudo quando se trata de um país como o Brasil, que tem uma das maiores populações carcerárias do mundo, em sua amplíssima maioria composta por negros e pobres, e dos quais metade não foram julgados.

A única exceção em que defendemos penas mais duras se remete aos próprios delitos cometidos pelo Estado, como os denominados de “lesa humanidade”. Como o assassinato pela ação do Estado daqueles que em nosso país resistiram à ditadura militar, e terminaram sendo brutalmente executados, como os assassinatos na “Casa da Morte” de Petrópolis, local destinado a executar e torturar pessoas, ou no próprio DOPS. Ou ainda os mandantes e executores do Massacre do Carandiru, que após 20 anos do assassinato de 111 pessoas permanecem impunes.

O discurso da direita de exigir o aumento da punição estatal, aumenta ainda mais o poder de juízes e promotores, casta privilegiada que atua contra os trabalhadores e os pobres, abrindo caminho para um “Estado policial” que se volta contra o povo. Em nosso país isso se demonstra em leis antiterroristas, ou mesmo na própria Lava Jato, que possibilitou o golpe institucional e a ascensão de Temer, que aprova ataque após ataque contra o povo trabalhador.

Nos casos de abusos de menores e violência contra as mulheres, apoiamos as vítimas não apenas contra os juízes e delegados que não investigam, ou ainda que justificam os protagonistas das violências. Mas sempre colocamos que a saída definitiva para acabar com a violência machista e a sociedade patriarcal não pode vir do próprio Estado burguês, que alimenta e desenvolve essa mesma violência, por seus próprios interesses de classe. Por isso ligamos à luta em defesa das mulheres à luta pela revolução socialista, para acabar com as bases da exploração assalariada como início do fim de toda e qualquer forma de opressão. De maneira alguma isso significa que o tema da violência contra a mulher deve ser deixado apenas para o dia da revolução, como estamos desde já na primeira fileira da sua denúncia, e do apoio às vítimas. Todos os delitos desse tipo devem ser julgados por jurados populares, que são menos passíveis às pressões do poder burguês.

Mas não confundimos isso com reforçar ou colocar nas mãos do Estado capitalista o poder para resolver a opressão. Essa saída não apenas é utópica, como mostra o caso do goleiro Bruno libertado pelo próprio Estado burguês, como é reacionária, já que esse poder punitivo será usado principalmente contra as organizações da classe trabalhadora, populares, incluindo o próprio movimento de mulheres, quando suas lutas se radicalizarem e superarem os limites impostos por essa “paz para os ricos”.

Um exemplo a ser seguido: o projeto apresentado pela FIT Argentina contra a violência à mulher

Ao contrário de aprofundar o caráter punitivo do Estado, os marxistas revolucionários lutamos pelo fim da sociedade de exploração e opressão, ao mesmo tempo em que apoiamos com todas as nossas forças as vítimas da violência machista. Um exemplo muito importante nesse sentido, foi a atuação de Nicolás del Caño, deputado nacional pelo PTS, organização irmã do MRT na Argentina, pela FIT (Frente de Izquierda y de losTrabajadores) quando apresentou em 2015 um Plano de Emergência contra a Violência às Mulheres. Como fundamento do plano, Nicolás del Caño declarou na época que “os feminicídios são o último elo de uma longa cadeia de violências contra as mulheres, que se legitima e reproduz permanentemente desde o Estado e suas instituições”. Sabe-se que a maioria dos casos de violência são cometidos dentro de casa, por familiares e companheiros das próprias mulheres, portanto, criar condições para que elas possam reconstruir suas vidas em condições dignas é essencial para romper essa cadeia.

Por isso, o projeto em questão visa criar condições para que as mulheres rompam com essa cadeia, ao instituir subsídios de 10 mil pesos, mesmo salário de trabalhador público, às vítimas adolescentes e estabelecer que sejam recebidos durante todo o tempo em que as solicitantes encontrem-se fora de sua casa em razão de violência e abusos, ou até que possam trabalhar. Além disso, a criação imediata de abrigos transitórios e um plano de moradia, baseado nos impostos progressivos às grandes fortunas e corporações imobiliárias, e o direito de solicitar junto ao Banco da Nação Argentina o benefício de “empréstimos com taxa zero”, e um regime de licenças trabalhistas para as vítimas que trabalham, seja como servidoras públicas, seja em empresas privadas, independente da forma de seu contrato de trabalho, dentre outras medidas que podem ser lidas aqui.

É com essa perspectiva que se pode fortalecer as mulheres que sofrem abusos e violência, sem cair na ilusão de que o punitivismo estatal poderia resolver o problema que ele mesmo alimenta. E também cria as bases para ligar a luta das mulheres, com a luta pelo fim dessa sociedade de exploração e opressão. Nesse 8 de março, que acontece em meio ao centenário da revolução russa de 1917, faz-se mais importante ainda abrir o caminho para que as demandas das mulheres se liguem a uma perspectiva revolucionária.

 
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