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MULHER TRABALHADORA
Entrevista com Daniele Santana, mãe de Chico, uma das 141 crianças sem creche na USP
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Daniele Santana, mãe do Francisco, de 3 anos, falou ao Esquerda Diário sobre a política nefasta de Zago em relação às mulheres, à permanência estudantil e à infância.

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Esquerda Diário – Faz 5 meses que você luta e espera pela vaga do Francisco na creche. Como estão sendo estes meses sem creche para vocês?

Daniele Santana – Absolutamente caótico, violento... O Francisco foi a muitas aulas comigo, por uns 2 meses. Mas chegamos a um ponto em que ele ficou doente por semanas, depois não queria de maneira alguma ir pra USP. Perguntava sempre se tinha a "creche da uspi" e quando dizia que não, iríamos pra aula da mamãe, ele chorava muito. Uma violência enorme uma criança de 2 anos e meio tendo que ficar horas no ônibus e depois horas dentro de uma sala de aula de faculdade. Com tantas ausências que tive e com o Francisco tão fragilizado, praticamente desisti do semestre. Acabei colocando ele numa escolinha particular apenas duas tardes na semana, mas isso foi agora, já tarde demais pra recuperar o semestre. Perdi o semestre, estou endividada com escolinha particular, Chico perdeu seu direito a brincar por inúmeras tardes, perdemos a saúde, graças a políticas da universidade.

Esquerda Diário – Como você vê a USP hoje, enquanto universidade, em relação à preocupação dela com a situação das mães estudantes e seus filhos?

Daniele Santana – Não há preocupação. Não há respeito. A USP deixa claro que não quer essas mães lá dentro. Que se uma estudante engravidar é melhor que aborte o filho ou aborte o diploma, pois a universidade não oferecerá o menor suporte para que ela obtenha ambos.

Esquerda Diário – Qual a importância da creche como parte da educação do seu filho?

Daniele Santana – Chico já está com quase 3 anos. Não apenas eu preciso de tempo para estudo e voltar a trabalhar como ele precisa de um ambiente que lhe traga o necessário para um desenvolvimento saudável, em contato com outras crianças, com cultura e professores qualificados. Durante estes 2 anos de vida eu estive com ele e me preocupei imensamente com o seu desenvolvimento físico, intelectual e emocional e estou muito satisfeita com o resultado. É muito difícil imaginar que a partir de então ele vá estar sob os cuidados de outras pessoas com perspectivas educacionais completamente diversas das minhas. A creche da USP é uma referência ao proporcionar o respeito à infância e à liberdade de brincar, além de alimentação e acompanhamentos completos e de qualidade.

Conseguimos uma vaga em uma das creches conveniadas da prefeitura, mas foi impossível a adaptação. Em sete dias meu filho teve crises de asma, pesadelos, chorava desesperadamente na porta da creche mesmo comigo junto. A alimentação não era balanceada o bastante e tampouco o suficiente, ele chegou a chorar na porta da cozinha pedindo comida. O lidar com as crianças assim como as condições de trabalho para as professoras fazerem tal, são totalmente inadequadas, mecanicistas, fabris. Após sete dias desistimos. Criando uma dívida crescente ele tem ido algumas tardes a uma escola particular enquanto busco emprego.

Esquerda Diário – Neli Wada, diretora do Sintusp, disse em entrevista que o reitor não se preocupa com a infância. Você concorda, o reitor mostra, com a situação das creches, esse desinteresse?

Daniele Santana – Sem dúvida! Neli está absolutamente certa. A despreocupação do reitor se expressa em duas frentes: ao deixar estas 141 vagas desocupadas ele deixa também 141 crianças que poderiam ter o atendimento de excelência das creches da USP sem acesso à educação infantil - ou em situações sofríveis. Ao mesmo tempo, ao iniciar o plano de desmonte das creches ele expressa a falta de valor à infância, à pesquisa em infância, desvalorização do professor de educação infantil (que ele já deixa claro, também, ao desrespeitar o cumprimento à lei que regulamenta a profissão de professor aos funcionários das creches, ainda contratados como técnicos), a desvalorização da pedagogia academicamente e de todos pesquisadores em pedagogia, a desvalorização de tudo que é relacionado à infância em si num ambiente acadêmico e todos aqueles que dedicam suas vidas a fazer pesquisas com este foco.

Esquerda Diário – A creche é importante para a educação das crianças, mas também é importante para as mães. Como você entende a preocupação da universidade em garantir a permanência de alunas mães, nesta universidade? Ela, a USP, é uma universidade machista neste ponto de vista?

Daniele Santana – Seguramente a USP é machista. Definitivamente. De nada adianta as mulheres terem o direito ao acesso à universidade se o ambiente universitário não é adequado às suas demandas, ou se terminamos na necessidade de escolher entre uma vida familiar como mãe e uma vida acadêmica/profissional. Isso não é escolha! Temos direito a ambos, como os homens vem tendo há séculos. Trata-se de um retrocesso, parece-me até ridículo ter que fazer este discurso, afinal há 30 anos foi provada a necessidade da existência de creches nos campi da universidade e, com muita luta das mulheres-mães-estudantes, estas creches foram criadas. É constrangedor, 30 anos depois, deparar-me com essa situação e ter que exigir o óbvio do óbvio, conquistado já há tanto tempo, a esses senhores da administração da universidade.

Esquerda Diário – Que outras consideração e colocações você quer fazer aqui?

Daniele Santana – Quero apenas reafirmar alguns pontos: primeiro, a creche não é esmola e assistencialismo, é direito! É permanência estudantil! É centro de pesquisa acadêmica. É centro de referência (só eu sei a diferença entre o que é oferecido dentro dos muros da USP e fora deles...). É um projeto de 30 anos que não pode ser massacrado. As mães universitárias merecem respeito, os trabalhadores das creches merecem esse respeito, a infância - de onde todos viemos - merece esse respeito.
Que as creches não acabem, mas se expandam!

 
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