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FAÍSCA LETRAS USP
2016: um ano de lutas na Letras-USP
Faísca Letras USP

No ano em que um golpe institucional ocorreu no país e a reitoria veio para cima dos estudantes e trabalhadores da USP, o curso de Letras foi vanguarda na defesa da educação pública. A partir dos acertos e erros desse ano, queremos tirar lições para fortalecer o movimento estudantil para 2017.

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As eleições para o centro acadêmico de Letras da USP para 2016 ocorreram em meio às fortes ocupações de escolas feitas pelos secundaristas em São Paulo. Depois de um ano em que a crise começou a chegar com força no Brasil, de muito enfrentamento com a reitoria e o governo do estado e com uma gestão inerte no CAELL (Ruído Rosa, composta por militantes do PT, Levante Popular da Juventude e independentes), que priorizava a defesa do governo Dilma e se recusava a mobilizar os estudantes, a então Juventude Às Ruas (hoje, Faísca) acompanhou desde o primeiro dia as ocupações de escolas e levou para o curso essa importante discussão. Cansados da inércia e da aceitação passiva dos ataques, o curso elegeu para o CAELL a nossa chapa, Por Isso Me Grito.

Desde o nosso primeiro dia de gestão, estivemos ligados aos processos de luta que estavam em curso. Estávamos com um importante bloco da Letras no ato em que os secundaristas venceram Geraldo Alckmin e seu projeto de reorganização escolar, barrando o fechamento das escolas e derrubando o Secretário de Educação, Hermman. No início do ano, a Letras esteve presente em todos os atos contra o aumento das tarifas, compondo um Comitê de Luta Contra a Tarifa da Zona Oeste, convocado pelo CAELL e CAPPF, junto com estudantes de outros cursos, secundaristas e ativistas do Movimento Passe Livre.

Organizamos recepções para os ingressantes pelo SISU e pela Fuvest em que, por política da gestão, não houve qualquer tipo de trote - prática racista, meritocrática, elitista e que fortalece a cultura do estupro -, proporcionando uma recepção que, como há muitos anos não se via, não teve nenhum caso de assédio. Durante os dias de matrícula, estivemos ao lado das trabalhadoras terceirizadas que, sem o pagamento de seus salários, denunciavam a precarização imposta pela Reitoria da USP. Nossa Calourada, com o tema “Ocupar e ReExistir – façamos como os secundaristas”, iniciou o ano com importantes debates políticos com professores e funcionários, uma forte ato por Cotas Já!, sarau e uma grande festa (Transviada – Festa Não Autorizada), com segurança auto-organizada por mulheres, negros e LGBTs, se contrapondo à política proibicionista da Reitoria e fazendo uma festa livre de opressões.

Um golpe, uma greve

O ano seguiu e a reorganização escolar se percebia sendo feita por baixo dos panos. Os secundaristas voltavam a se mobilizar. Os estudantes da Letras sentiam a falta de professores e os problemas da USP. Um golpe se articulava no país, orquestrado por uma direita reacionária que, se aproveitando do espaço aberto pelo PT e se apoiando nos interesses da burguesia imperialista que já comandava a Lava Jato, se utilizava dos seus novos clowns do MBL, Vem Pra Rua e Revoltados Online, com suporte da mídia burguesa, para maquiar com atos pró-impeachment o seu verdadeiro plano: ter um governo de direita puro sangue, que abrisse mão da conciliação de classes que o PT fazia e que tanto foi útil ao enriquecimento da burguesia, para aplicar ainda mais ataques sobre a classe trabalhadora e a juventude.

A gestão Por Isso Me Grito não foi unânime. A maior parte dela, composta pela Faísca e alguns estudantes independentes, considerou que o que estava em curso no país era um golpe institucional que precisava ser duramente combatido de maneira independente do PT. Outra parte, minoritária, considerava que não havia golpe. Nenhum problema com isso. Uma gestão pode ter diferenças internas, e o centro acadêmico deve se posicionar de acordo com a deliberação política dos estudantes do curso. E foi em uma assembleia com ampla presença estudantil que o curso de Letras deliberou que era contra o golpe institucional que se armava e que deveríamos lutar contra ele desde as bases.

Contra o golpe e a precarização da USP e da educação pública, fizemos paralisações e uma série de debates. Assistimos à bizarra votação do impeachment na Câmara em nome da tradição, da família, da propriedade e de torturadores. Torturadores que por vezes a Reitoria também quer homenagear com seus monumentos. Desde o Conselho Universitário (CO), onde a golpista FIESP tem cadeiras, ataque atrás de ataque contra os trabalhadores e estudantes da USP.

De assembleia em assembleia, que ocorriam periodicamente como deveria ter acontecido nos últimos anos, fomos construindo e fortalecendo um novo momento do movimento estudantil da Letras e com uma nova vanguarda surgindo. Um curso que vinha de um histórico de paralisia por conta de direções conciliadoras com a burocracia, como as gestões do petismo, ou vacilantes, como PSOL e PSTU anteriormente, voltava a ser um fator importante pro movimento estudantil da USP.

E no dia em que o golpe se consolidou e se definiu o afastamento de Dilma Roussef, a Letras deflagra greve e ocupação de seu prédio, sendo vanguarda da luta dos estudantes, em uma assembleia que reuniu mais de 600 pessoas. Era 11 de maio, e junto com a Pedagogia, com os trabalhadores e o movimento geral da USP que entraria em greve no dia seguinte e com mobilização nas demais Universidades estaduais e entre os secundaristas, iniciávamos uma greve inspirados pela forte mobilização de 2007, em que um movimento estadual barrou os decretos do tucano José Serra, apostando que pudéssemos, novamente, dar uma resposta muito contundente aos ataques.

Iniciamos uma forte ocupação, muito ativa, com dezenas de estudantes todos os dias, diversas atividades, influenciando outros cursos (inclusive de fora do estado), trocando experiências. Estudantes, trabalhadores e professores das 3 estaduais paulistas e secundaristas em luta: era esse o cenário inicial da nossa greve.

Mas o golpe se consolidou sem que houvesse uma forte luta organizada desde as bases que pudesse se expressar com força nas ruas por conta da criminosa paralisia de CUT, CTB e UNE, a mesma política que os setores que hoje se organizam na Viramundo defendem. Sem pudor, Alckmin reprimiu violentamente os secundaristas e desorganizou o movimento que meses antes tinha vencido o governo de forma surpreendente. Na UNESP, também por conta de uma forte repressão,a mobilização não seguiu. O movimento geral da USP, tocado pela direção vacilante do DCE, não se unificou à forte greve da Unicamp, mesmo com as medidas propostas pela Letras de construção de um comando de greve estadual que dirigisse politicamente a greve de forma unificada e do Encontro Estadual dos Estudantes em Luta, medidas boicotadas pela gestão do DCE. Os trabalhadores da USP tiveram seu movimento atacado no estômago pelo ilegal e autoritário corte de ponto pela Reitoria. Com as diferenças internas do movimento expostas e sem uma direção firme, a Reitoria se aproveitou para transformar os corredores do CRUSP em uma praça de guerra bombardeando a moradia madrugada adentro para evitar a ocupação dos blocos K e L.

A situação, então, mudou. Já não estávamos em um momento de ascenso do movimento em defesa da educação pública. Se iniciava um período de refluxo por conta, principalmente, dos abalos subjetivos causados pela conjuntura nacional e pela repressão dos tucanos. O inimigo se mostrava mais poderoso que o movimento e demonstrava uma enorme intransigência e que não hesitaria em reprimir.

Mas percebemos essa mudança tarde demais. Frente a um refluxo, o movimento deve se rearticular e a direção tem papel fundamental nisso. Precisávamos ter preparado um recuo organizado, retomando o diálogo com cada estudante que via na greve um movimento legítimo, ainda que apoiasse de maneira menos ativa, e organizar a resistência de uma outra forma. Na ânsia de fortalecer uma greve importante e seguir na luta contra todos os ataques, acabamos por não perceber que estávamos em uma nova situação que exigia uma outra forma de lutar. Ali, a derrota da greve já se desenhava.

A ocupação e a greve se esvaziaram paulatinamente, e a Reitoria se aproveitou para sufocar o movimento. Com o corte de ponto dos trabalhadores da FFLCH pela Diretoria, deliberamos por desocupar o prédio e garantir o pagamento dos salários, firmando uma importante aliança com os trabalhadores, lutadores incansáveis em defesa da Educação Pública.

Mas a greve foi derrotada e saímos com algumas poucas vitórias parciais. Depois de dois meses de ocupação, saímos com essa nova vanguarda que surgiu com muito cansaço acumulado pelo intenso processo de luta. E logo depois se consolidou o golpe, com alguns atos massivos nas ruas de diversas cidades do país, mas com nenhuma organização dessa luta desde as bases que pudesse canalizar a revolta para darmos um grande combate ao golpe que se consolidava. A passividade das centrais sindicais petistas, que não organizaram uma luta efetiva, e a derrota recente da greve geraram o nível tal de desgaste que se viu na Letras no segundo semestre. O movimento estava desorganizado e sofrendo intenso assédio moral.

Tentamos iniciar o debate sobre a proporcionalidade no centro acadêmico, deliberadamente deixado para depois da greve pela hierarquia que os processos de luta devem ter. Mas em um momento de descrédito tal com a auto-organização, não havia como instaurar o debate a respeito da entidade. Nos voltamos para a Semana da Letras, que apresentaria as habilitações e debateria nosso currículo. E nos deparamos com uma intensa dificuldade de diálogo com os professores que viram na ocupação – e não nos ataques – uma violência, e com um boicote por parte de um setor do movimento que trabalhou por baixo para desgastar a gestão, em detrimento de fortalecer o movimento de conjunto.

Enquanto isso, nacionalmente as eleições municipais mostravam como a direita avançava por cima, ao ganhar novas prefeituras e aumentar seus vereadores eleitos, assim como a derrota histórica do projeto de conciliação de classes petista. Vimos no Rio de Janeiro, com os mais de um milhão de votos de Marcelo Freixo do PSOL, a busca por uma alternativa à esquerda do PT, busca essa que também se expressava na disposição de luta e resistência que começou no Paraná e depois tomou conta do país, com mais de 1000 ocupações de escolas e universidades contra a PEC 55 e a reforma do ensino médio dos golpistas.

Os balanços corretos que nos fazem avançar

Nos equivocamos, também, ao não perceber a importância que demandas específicas dos estudantes tomam em momentos de refluxo como o que atravessamos. Sabemos que o CAELL não pode resolver os problemas do curso, pois está além da competência de qualquer entidade estudantil. O cerne das questões é o projeto privatista e precarizante da Reitoria, em aliança com os golpistas que, piorando os ataques de Dilma, são inimigos da educação. Mas se o movimento não está organizado o suficiente para se embater com esses fortes inimigos, é preciso que se busque atender a uma série de outras demandas. Ouvir mais e melhor, construir para além da vanguarda do movimento a luta em defesa da educação em cada sala de aula, em cada corredor, na fila da cantina.

Estivemos, nós da Faísca, integrantes ou não da gestão Por Isso Me Grito, à frente de um forte processo de luta, que teve seus erros, mas que foi derrotado unicamente pela intransigência dos nossos inimigos, que foram mais fortes do que nós esse ano. Ao lado da Reitoria havia muito mais que meia dúzia de burocratas: havia um golpe institucional cujos resultados estamos vendo agora muito claramente. Enquanto gestão respondemos pelo resultado desse processo, e ficamos em segundo lugar nas eleições para 2017.

Nosso balanço da gestão que fizemos em 2016 é bastante positivo, apesar dos erros. Processos de luta se ganham e se perdem, e o que mede a possibilidade de vitória não é a legitimidade das pautas levantadas, mas a correlação de forças. Pior do que perder uma batalha é não lutar quando a situação assim exige, quando os ataques são tais que não podemos nos permitir ficar calados. Essa era a situação que se apresentava para nós, e nós não fugimos da batalha. Nosso balanço é positivo porque a Letras, a partir da atuação contundente de uma gestão composta por 70% de mulheres que se recusam a abaixar a cabeça e o tom de voz para aqueles que nos querem recatadas e do lar, deu um exemplo de luta em defesa da Educação Pública, gratuita e de qualidade, porque se posicionou corretamente contra o golpe institucional, e porque um novo movimento surgiu após anos de imobilismo, com diversas mulheres, negros e LGBTs sendo linha de frente de organizar essa resistência.

Mas ter um balanço positivo não nos exime de perceber os erros que tivemos, e é fundamental deixá-los claros para que o movimento de conjunto avance. Erramos ao não perceber que entrávamos num refluxo e não entender quais as demandas que são fundamentais de serem atendidas em momentos como esse. Tiramos das experiências desse ano uma série de lições. É preciso que avancemos na qualidade das discussões políticas do movimento estudantil com amplos debates a partir daquilo que é sentido por cada estudante. É preciso ouvir e entender quais as demandas reais que estão colocadas pra nós, para além da vanguarda mais ativista e buscar construir uma nova tradição no movimento estudantil que debata e busque construir um outro projeto de universidade e de sociedade.

Mas, acima de tudo, reafirmamos a principal lição de todas: podemos e devemos nos levantar contra os ataques que desferem contra nós, nos organizando desde as bases e em aliança com os trabalhadores. Apenas a nossa organização e nosso posicionamento político correto pode nos colocar em condições de defender os nossos direitos contra os nossos inimigos. E as entidades estudantis devem servir para organizar essa luta e esses posicionamentos. Por isso seguiremos cobrando da nova gestão do CAELL que rompa com o imobilismo petista com que as organizações que a compõem ainda se aliam (PT e Levante Popular da Juventude). Precisaremos de muita organização e disposição de luta pra resistir nesse próximo ano, ou o governo golpista de Temer, Alckmin e Doria atacarão ainda mais a todos nós.

As perspectivas para o ano novo: continuar organizando nossa resistência

Se depender dos golpistas, 2017 virá ainda mais duro sobre nós. Precisamos estar dispostos e organizados para resistir, e pra isso precisamos fortalecer o movimento de conjunto, politizando nossos debates e espaços e pensando juntos quais as medidas que deveremos tomar para ir muito além da miséria do possível que está colocada para nós hoje.

Nós, da Faísca – Juventude Anticapitalista e Revolucionária, seguimos na luta contra todos os ataques dos golpistas e da reitoria, contra a exploração e toda forma de opressão, e queremos construir com cada estudante da Letras a defesa do nosso curso, da nossa universidade, da educação de conjunto e de todos os nossos direitos. Por isso convidamos a cada uma e cada um dos estudantes a construir conosco uma forte campanha contra o trote nessa calourada, para começar a romper com essa cultura opressora e elitista ainda tão comum nas universidades brasileiras, e a apoiar a dura luta que os trabalhadores da USP enfrentam hoje com a ameaça de despejo da sede do seu sindicato. Uma luta fundamental pois Zago começa a avançar também sobre alguns Centros Acadêmicos do campus, buscando coibir ainda mais nossos espaços de vivencia, auto-organização e resistência. Sintusp e todos os centros acadêmicos ficam!

Queremos debater e construir junto àqueles jovens que não aceitam os vários ajustes aplicados por esse governo golpista, que veem a Lava Jato como um instrumento do imperialismo para fortalecer um poder judiciário que é parte da mesma ordem podre que não nos representa e sabem que a política de conciliação de classes do PT nunca pôde dar uma resposta de fato às grandes injustiças sociais, à exploração e opressão que dão o tom da nossa realidade. Convidamos todos aqueles que buscam uma alternativa política pra situação nacional e já não confiam nas promessas e demagogias dos políticos tradicionais a debate conosco o nosso manifesto político-programático, que está em fase de elaboração e debates. Nele temos parte de um acúmulo histórico que viemos construindo sobre qual o programa que melhor pode orientar uma juventude anticapitalista e revolucionária.

Queremos organizar nossa resistência contra os avanço da precarização do nosso curso e os ataques da reitoria, como parte da luta contra os ataques dos golpistas, o congelamento da saúde e educação por 20 anos, a reforma da previdência, a reforma do ensino médio e uma série de medidas que visam nos transformar numa geração sem futuro. Queremos ser a faísca que vai se espalhar por todo o país em uma forte mobilização de juventude e de trabalhadores que consiga impor uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana para mudar as regras desse jogo podre e defender uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos, dando uma resposta política de fundo a essa crise.

 
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