Rogério de Castro, professor do Colégio Pedro II, nos traz uma reflexão e uma homenagem aos estudantes dessa instituição que, com sua luta e organização, derrubaram a distinção de uniformes por gênero no centenário colégio. Veja seu texto.
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Não faz muito tempo, li um pequeno texto intitulado “Ferrer, mártir ou patife?”. Nele, um padre narra sua “cruzada” pela serra fluminense para impedir a fundação de uma escola ferretiana. Francisco Ferrer, educador condenado à morte por fuzilamento, havia instituído na Catalunha um padrão inaceitável para época: meninos e meninas numa mesma sala de aulas. Por isso, de acordo com o autor deste libelo acusatório, “o patife não valia a bala que levou”.
Cem anos após “Ferrer, mártir ou patife?” vir a lume, outro sacerdote católico, dessa vez pelas redes sociais, condena com veemência a portaria que extinguiu a distinção do uniforme por gênero no Colégio Pedro II. Um século de distância, mas uma distância muito presente! Talvez uma portaria que recuperasse a palmatória não causasse tanta espécie. No calor dos acontecimentos, o arcebispo da cidade conclama as famílias contra nossa pretensa “ideologia de gênero”, desafiando-nos a fazer com que uma sociedade inerte aceite uma escola viva.
Por sorte, nossos estudantes iluminam uma direção. Compreendendo mais do que são compreendidos, assumem os campi e nos mostram que a união anula a discórdia, a verdade supera o erro e o amor dissipa a ofensa. Para serem perdoados, perdoam, acolhendo carinhosamente pais e servidores em suas reuniões. Que sua sabedoria e simplicidade franciscanas consolem e tragam fé aos que perderam a esperança. Pois se é dando que se recebe, é resistindo que se vive.
Rio de Janeiro, 03 de novembro de 2016
Em solidariedade ao Grupo de estudos e ações em gênero e sexualidade (Elos) do Colégio Pedro II
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