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TRIBUNA ABERTA
Sobre redes sociais da internet e organizações políticas brasileiras: a luta pela difusão do debate político
Bruno Lima Rocha - professor de Ciência Política e Relações Internacionais
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Introdução: a memória recente

Estamos em um período de perplexidade na política brasileira. Finalmente, por caminhos tortuosos, o debate político se espalhou pelo país. Felizmente, ultrapassa os pequenos limites de difusão das esquerdas realmente existentes em nossa sociedade. Infelizmente, é um debate poluído pela espetacularização e disputado, palmo a palmo, contra a nova direita (a juventude neoliberal) e o conservadorismo da pobreza, através das empresas com nome de igrejas neopentecostais.

Para interpretar corretamente, é preciso fazer uma breve memória da internet alternativa e reconhecer a gravidade do momento vivido. Este tema – o da articulação político-social com e através da internet - é muito caro e delicado para a esquerda brasileira após 2013. Na verdade da história recente, a internet cumpriu um papel fundamental - e ainda cumpre - para as relações sociais contemporâneas, assim como no chamado movimento altermundista. Podemos, sem exagero, colocar como um marco destas formas mais "fluidas" de mobilização as manifestações unitárias de Seattle - novembro de 1999 - onde a mais importante cidade do estado de Washington (EUA) foi palco de uma longa batalha campal contra a realização da reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC). Do ponto de vista latino-americano, a rebelião zapatista de 1º de janeiro de 1994, foi o Já Basta de nosso Continente diante da pilhagem neoliberal, declarando guerra ao Estado mexicano ao assinar o NAFTA (Tratado de Livre Comércio da América do Norte) e entregar os recursos naturais e as terras coletivas para a voracidade dos capitais estadunidenses. O neozapatismo sempre usou à perfeição o poder da internet e segue fazendo-o (ainda que com todas as justas críticas ao discurso evasivo muitas vezes repetido pelo EZLN).

Brasil, o papel do CMI e o debate descontrolado

No Brasil, quase concomitante a este período (pós-Seattle), assistimos à formação do coletivo do CMI - Centro de Mídia Independente -, cuja presença hoje no país é diminuta e quase que a adesão de uma esquerda anti-globalização capitalista apoiada na experiência da internet. A web, sem nenhuma conotação sectária, consegue difundir o pensamento político em distintos temas, análises, identidades e setores em luta de modo a perder o controle dos centros emissores, ou dos locais da política por excelência. Ou seja, a difusão ideológica pela internet transborda os partidos políticos - legais ou não, eleitorais ou não - assim como ultrapassa as organizações de distintos perfis e os movimentos sociais e entidades representativas.

Esta condição é inequívoca e sem retorno. Para a difusão de pensamento político, tanto de filosofia política como identidades com aplicações de pensamento político totalizante – tal é o exemplo do feminismo em seu sentido mais amplo - a circulação por internet e a profusão em redes de relacionamentos - como grupos de conversa - faz a penetração em primeira escala, superando - e muito - as formas clássicas de propaganda política. Reforço a ideia: superando, mas não substituindo de modo absoluto.

A web tem censura, mas o que nela se difunde traz uma carga de reputação para quem escreve ou faz a postagem, também gerando um fenômeno complicado para quem pratica o coletivismo: a reputação individual ou de pequenos grupos - por vezes até informais - pode superar a representação coletiva e, infelizmente, trazer a falsa ideia de que é possível superar a organização coletiva.

Brasil: reputação, difusão e a disputa pela internet política

No Brasil contemporâneo, a difusão de pensamento político ultrapassou a intermediação dos centros difusores. Assim, há uma disputa na Internet por reputação, onde os locais de fala são secundários diante do poder do emissor.

Em escala, podemos afirmar que a demência neoliberal espalha como gafanhotos na lavoura através de vloggers e youtubers e na esteira da liderança formada pelos think tanks ultra liberais, as práticas ao estilo do MBL estão deformando o campo político brasileiro. Mas, na esquerda e na ex-esquerda, um intelectual solto por vezes adquire mais prestígio cibernético do que organizações inteiras. Reforço a opinião: não considero isso positivo para nada e gostaria de ver essa realidade alterada.

Mas, como dado de realidade, esta é a dimensão concreta que temos hoje para trabalhar e aprofundar o debate político. Não adianta nada afirmar que a maior parte dos conteúdos que circulam em Internet são superficiais, porque realmente são. Tampouco adianta reclamar que a capacidade de difusão dos curiosos e diletantes é maior do que especialistas ou militantes, porque é mesmo.

A necessidade urgente é - ao menos desde um ponto de vista militante, mas sem abrir mão do rigor ou ao menos da formação sólida - compreender o poder de difusão da Internet e como as empresas de marketing digital da nova direita estão capturando o imaginário político de uma parcela de nossa juventude. Diante desse dado de realidade, é fundamental dimensionar a Internet tanto como uma frente de luta (de comunicação, de teoria, de mobilização e difusora de ideias chave) como um possível espaço público por esquerda.

Em 2013 vimos todo o poder acumulado da esquerda mais à esquerda dentro dos então dez anos de pasmaceira lulista. Naquele mesmo ano observamos o sequestro da pauta pelos conglomerados de mídia de São Paulo e a incorporação dos métodos de agitação em rede e mobilização pela web como táticas da nova direita. A versão brasileira do Tea Party estadunidense, o MBL (cria dos think tanks neoliberais), maneja a articulação dos grupos de preconceitos e reprodução de valores conservadores com nova roupagem, e terminaram ganhando a concorrência contra outras empresas de marketing digital. O MBL e seus derivados lidera a agitação pelo golpe como hoje comanda a luta contra ideias de direitos sociais (base da Constituição de 1988), programas keynesianos tardio (como a bolha de consumo proporcionada pelo lulismo), de desenvolvimento econômico de tipo estrutural (no pouco que resta do programa de Celso Furtado dentro do Estado brasileiro) e, para essa laia, a pior das chagas é a luta de classes em sua versão popular e afro-indo-latinoamericana. Ou seja, a nova direita brasileira é tão colonizada que entende como um bloco unitário as posturas antagônicas de burguesia nacional, de Estado nacional-desenvolvimentista e as de esquerda popular latino-americana. Contra todos estes setores, os neoliberais declaram guerra simbólica através da internet. Ao me posicionar no último setor – o da esquerda mais à esquerda com referência na América Latina e no classismo dos oprimidos – vejo a colonialidade destes reprodutores de asneiras da ultra direita estadunidense como algo intolerável e que deve ser diariamente confrontado.

Apontando a conclusão evidente

É preciso encarar esse dado de realidade (o da disputa pela internet política brasileira), e compreender que temos difusão de pensamento político transbordando qualquer tipo de controle pelos grupos, movimentos e organizações políticas da esquerda, Isto nos obriga a despender um tempo largo na Internet política, marcar as notícias dos conglomerados econômico-midiáticos, puxar o debate de profundidade e encaminhar gente interessada para as instâncias orgânicas e dotadas de alguma estrutura.

O momento é grave e urge dedicação. A hora é de pelear duro e com tudo pela Internet política circulante hoje no Brasil; entendo ser tarefa de todas e todos comprometidas com a formação ideológica de nosso povo e a conformação de um novo consenso da esquerda classista, dotada e portadora de democracia interna e formadora de indivíduos irredutíveis e solidários.

Bruno Lima Rocha é professor de ciência política e relações internacionais

(www.estrategiaeanalise.com.br / [email protected] para E-mail e Facebook).

 
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