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IGREJAS PARA COMBATER O ZIKA? | Zika vírus: ONU é obrigada a defender o direito ao aborto, enquanto Dilma busca as igrejas

A crise instalada no país em torno dos casos de microcefalia, decorrentes do zika vírus, segue se espalhando. Oficialmente se contabilizam três mortes por conta da contaminação com o vírus. No entanto, as medidas de prevenção ao zika vírus ainda seguem em sua maioria postas sob responsabilidade da população, e o direito democrático elementar ao aborto tampouco foi obtido. Frente a isso se abre um debate que envolve ONU, OMS e governos.

Simone IshibashiRio de Janeiro

sexta-feira 12 de fevereiro de 2016 | 00:00

Foto: Divulgação da Presidência da República

A ONU é obrigada a defender o direito ao aborto

Frente à propagação do zika vírus por diversos países do mundo, mesmo organizações imperialistas como a ONU, e até governos como os do Peru e Equador, se viu obrigada a defender o direito ao aborto para os casos de mulheres grávidas infectadas. Trata-se de uma questão fundamental, a de que a mulher possa decidir sobre algo que afeta profundamente sua vida, e que deveria ser entendido como um direito democrático elementar.

Combater abertamente a negação à que a mulher decida é ainda mais importante se partirmos do fato de que 97% das mulheres em idade reprodutiva, encontram-se em países da América Latina e Caribe vivem em países que têm as leis mais draconianas em relação ao direito ao aborto. Em países como El Salvador, Nicarágua, Honduras, Chile e República Dominicana, as mulheres têm o direito ao aborto negado sob qualquer circunstância. Em El Salvador a mulher que recorre ao aborto responde criminalmente por infanticídio! Essa situação inadmissível deve ser revertida imediatamente, garantindo aborto seguro, legal e gratuito a todas as mulheres, inclusive não restritos aos casos de suspeita de microcefalia.

Dilma quer combater o zika vírus com....as igrejas

Na contramão dessa necessidade, Dilma Roussef realizou nessa última terça-feira uma reunião com as igrejas, alegando que se tratava de uma iniciativa para combater o zika vírus. A argumentação de acordo com a Conic (Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil) seria de que “como a maioria da população brasileira é cristã, envolver as igrejas pode ajudar na prevenção”. A orientação discutida é que os padres e sacerdotes “incluam a prevenção do zika vírus em seus sermões”, de modo a “conscientizar a população”.

Trata-se de mais uma ação do governo petista que demonstra como esse esbanja demagogia, para evitar tratar das causas de fundo que poderiam dar uma saída para o problema da microcefalia. Primeiro o governo petista anunciou que recorreria ao exército, e agora às igrejas. E dessa forma deixa de lado a urgente necessidade de que se garanta o direito pleno para as mulheres infectadas decidirem o que fazer. O que envolve assistência médica, econômica, e amparo psicológico para as mulheres que quiserem levar adiante a gestação. E para aquelas que decidirem pela sua interrupção, o direito ao aborto legal, seguro e gratuito.

Buscando as igrejas, Dilma demonstra estar na contramão desse elementar direito democrático, sistematicamente negado às mulheres, e que assume agora com a explosão dos casos de microcefalia sua faceta ainda mais criminosa. Ao invés de tratar dessa questão como um problema de saúde pública, Dilma busca os padres.

Que fatalmente falarão contra o direito ao aborto, com exceção parcial talvez da Igreja Batista, que se declarou favorável nos casos de contaminação com o zika vírus. A já recorrente culpabilização das mulheres, principalmente das mulheres pobres e negras que recorrem ao aborto, que escancara as divisões de gênero só podem se aprofundar com essa atitude, profundamente simbólica, de Dilma.

OMS e governos tentando minimizar a situação

Enquanto a ONU defende o direito ao aborto nos casos de contágio por zika vírus, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que a maioria das mulheres grávidas nos países afetados dará luz a crianças normais. O que, apesar de ser verdadeiro, tem como objetivo mascarar que os números de crianças nascidas com microcefalia é um grande problema, que afeta especialmente as mulheres.

Não contente com isso, a OMS também seguiu defendendo que as medidas preventivas seriam usar camisinha e repelentes. Nenhuma palavra ou recomendação sobre a necessidade de prover países como a Colômbia ou o Brasil, em que estão havendo milhares de casos, de saneamento básico para as populações das periferias, grandes vítimas do zika vírus, entrega de repelente gratuito, ou atendimento médico especializado e gratuito. Muito menos sobre o direito ao aborto.

Mas a inoperância no combate ao zika vírus não para por aí. Os testes sobre uma possível vacina serão feitos, de acordo com as declarações da mesma OMS, somente daqui a 1 ano. Enquanto isso a crise só aumenta. Ainda que a criação de medicamentos tenha que passar por diversos testes, a progressão dos casos demonstra que 1 ano é um período muito longo para que se tomem medidas efetivas, sequer combatendo a exposição atual e garantindo condições saudáveis para as mulheres que desejarem engravidar. Isso fortalece mais ainda a necessidade de tomar imediatamente outras medidas.

Por uma resposta de fundo e imediata

A OMS e anteriormente a própria ONU estavam colocando o eixo fundamental da prevenção aos casos de zika vírus como responsabilidade da mulher, ao recomendar que não engravidassem. Mas o problema não pode ser encarado assim. É preciso que o direito ao aborto legal, seguro e gratuito seja garantido. E que se ligue às medidas de prevenção para que o surto não se torne uma epidemia ainda mais grave. Para isso é preciso um verdadeiro plano de combate. Que parta da necessidade de que seja fornecido à toda população, gratuitamente, repelentes, bem como testes que se desenvolvam, e inclusive vacinas.

Porém é preciso uma solução de fundo, toda a população que vive nas periferias, e locais sem saneamento básico, deve ter condições de não estarem mais expostos à possibilidade de contágio. Para isso é preciso conceder licença remunerada às mulheres grávidas desde o início da gestação, e no caso de viverem em áreas de risco, que possam ter acesso à abrigos transitórios. Isso deve se ligar a um plano de obras públicas, que abarque tanto o saneamento de locais onde ele não existe, como construção de moradias, e no imediato a expropriação de imóveis destinados à especulação imobiliária, geralmente em áreas nobres e centrais com pouca infestação do vetor do vírus, o mosquito. Estes imóveis poderiam abrigar milhares de famílias.

Isso deve se ligar a uma transformação profunda da Saúde do país. Há que se instituir um Sistema Único de Saúde absolutamente distinto do que existe, que seja 100% estatal e controlado pelos trabalhadores da saúde, e possa atender com qualidade a toda a população. Que seja financiado com os recursos advindos do não pagamento da dívida pública, e com os gastos destinados a obras e eventos que não favorecem os trabalhadores e a população, como ocorre com as Olimpíadas.




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