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EDITORIAL DE EDITORIAIS | Tropas nas ruas no Rio mas a ressaca do carnaval volta a atormentar a burguesia

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

domingo 25 de fevereiro de 2018 | Edição do dia

Foto: INPE

A euforia tomou algumas redações de jornais ao ver tanques e uniformes no Rio de Janeiro. O Globo esparramou-se em sua típica alegria efervescente diante do verde-oliva. Temer até começou a incensar sua candidatura. Nas redes sociais soldados e cabos da reserva ultraconservadora pareciam ter entrado no terreno em números e com uma energia imbatível. Um giro brusco do centro da pauta nacional, das reformas para a segurança. Mas tão rapidamente como se instalou esse giro já se instalam dúvidas e mais dúvidas na elite. A ressaca do carnaval, cheia de Tuiuti, daquele perigoso grito profundo “se a escravidão acabou” e contra as reformas transparece em cada editorial da grande mídia.

Temer, segundo seu marqueteiro, Elsinho Mouco, partiu para um “all-in” do poquer, apostando todas suas fichas nessa mudança de foco depois que foi derrotado na “mãe de todas as reformas”, a reforma da Previdência. Uma derrota que não foi produto direto da ação dos trabalhadores, graças ao eficiente freio garantido pelas centrais sindicais, mas expressa um temor dos parlamentares perante a opinião dos trabalhadores.

Efetuado o giro das atenções do país de Brasília para a Avenida Brasil no Rio, quanto a repressão aos pobres, aos negros servirá para um discurso eleitoral e um giro à direita em toda a situação política, instalando-se em parcelas do corações e mentes, ou pelo contrário, trará renovada instabilidade à couraça dura do Estado burguês: as tropas? Uma instabilidade que cruza a crescente desfaçatez com que os militares se imiscuem na política, avocam a si maiores poderes, combinada ao risco de nascer um questionamento popular às Forças Armadas? É nesta chave de querer mais poder e ao mesmo tempo temer seu futuro que, preventivamente, o comandante Villas Boas quer que esteja proibida uma nova “Comissão da Verdade” relativa à intervenção no Rio.

Independentemente do sucesso da operação reacionária que dá superpoderes a um general e trás consigo uma série de afrontas aos direitos civis, como o mandado de busca coletiva, paira a apreensão entre a burguesia. A ressaca do Carnaval parece que voltou. Parecem ver a preocupação no horizonte e como essa operação não resolverá problemas de fundo.

O Globo de sua euforia bélica contra os morros partiu para uma ranzinza frieza e apreensão da análise com o editorial desse domingo intitulado “A ilusão de uma bonança econômica duradoura”. Nele, as penas a soldo da família Marinho, discorrem sobre o déficit fiscal que abaterá a economia ainda esse ano ou no próximo se as urnas não derem vitória a um neoliberal duro, preveem volta da recessão e de inflação alta: “O sinal da percepção da impossibilidade de serem feitas a tempo a Reforma da Previdência e outras será a volta da inflação elevada e, em decorrência, a elevação dos juros. Marcarão o fim da ilusão de que a volta do crescimento, por si, acertará as contas.”

No outro extremo da Via Dutra, a Folha de São Paulo estampa no editorial deste domingo uma preocupação com a terra arrasada eleitoral no campo do centro golpista dos principais atores do golpe institucional de 2016. No artigo “Candidatos a candidato” já trás no seu “lead” a chamada “Enquanto direita e esquerda ostentam seus candidatos para 2018, centro sofre com falta de opções”. Nele discorrem como Alckmin é uma sumidade de falta de carisma (“crônico déficit de carisma”), comentam sem nenhuma alegria que foi “Esfumado o devaneio televisivo em torno de Luciano Huck” e registram jornalisticamente sem ver esperanças o nome do MBL “há quem cogite o nome do empresário Flávio Rocha, da Riachuelo, como alternativa ao governador de São Paulo”.

Na Folha também nomeiam a dificuldade de Temer, Meirelles, Maia do mesmo centro golpista para concluir à espera do marketing operar milagres na “opinião pública” que o golpe e sua continuidade não conseguiram. Mesmo com uma Lava Jato, com a continuidade do golpe com a condenação arbitrária de Lula para arrancar o direito da população votar em quem ela decidir e agora com a intervenção federal no Rio, todas esperanças residem no poder e criatividade da publicidade tupiniquim:

“Como nenhum serve, serve qualquer um. O talento dos marqueteiros políticos nunca terá sido, provavelmente, tão desafiado.“

Irmão em importância da Folha, o conservador Estado de São Paulo, estampa nesse domingo mais um editorial crítico à intervenção no Rio, como o jornal tem feito quase diariamente. Suas críticas variam de abandono da Reforma da Previdência a questionamentos à efetividade da própria operação, como é o que se remarca neste domingo em “O que se espera da intervenção”. Nele sublinham como não há um plano para além de uma “paz armada” que quando as tropas saem tudo volta – piorado – a como estava.

Por diferentes ângulos os editoriais dos três maiores jornais do país expressam a preocupação com “para onde vai o Brasil” e mostram como mesmo com o giro das discussões para a segurança, e mesmo com diversos expedientes de continuidade do golpe há riscos para a elite.

Nesse “lusco-fusco” da situação, com elementos claramente à direita com a intervenção no Rio, com a continuidade do golpe roubando o direito da população votar em quem ela decidir (mesmo que em um conciliador de classes) combinada à continuada repulsa às reformas que transitamos.

Uma situação complexa que exige atenção, mas permite ainda se apoiar no que há mais à esquerda, como o repúdio às reformas, para exigir dos sindicatos um plano de lutas para a revogação da Reforma Trabalhista enquanto essa ainda não terminou de se impor na prática em muitos locais de trabalho, para, a partir desse questionamento, reafirmar o combate aos novos contornos de continuidade do golpe demandando a retirada das tropas do Rio e a luta para garantir o direito da população votar como ela quiser. Esses combates são parte de erguer, na concretude dos cenários de agora, uma alternativa anticapitalista que supere o PT pela esquerda, mostrando nos locais de trabalho e estudo o papel que Lula e o PT cumprem através de sua orientação nos sindicatos e outras entidades de massa, para impedir o desenvolvimento desses questionamentos enquanto apostam suas fichas na conciliação com dirigentes golpistas e na surrada “tática” de aposta passiva no socorro do STF e outros golpistas de toga.

Uma primeira batalha para apoiar-se no que há a esquerda no “lusco-fusco” é o 8 de março. Dia internacional de luta das mulheres, que novamente ecoa um chamado mundial para “uma paralisação das mulheres” que mesmo que não tenha um dinamismo puxado pelas imensas manifestações nos EUA do ano passado já deixa marcas em outros países, como o vivo debate pelo direito ao aborto que se instalou em nossa vizinha Argentina, que mesmo após uma Reforma da Previdência exibe continuadas lutas operárias e agora um tema de massas democrático e progressista na agenda pública.

Erguer as demandas nacionais junto às demandas das mulheres, como a luta pelo direito ao aborto, pelo fim da violência à mulher, por igual salário, exige o protagonismo das mulheres, mas que precisam ser tomadas pelo conjunto da classe trabalhadora, por homens e mulheres. Não há como vislumbrar avanço para os trabalhadores com sua metade (ou mais) oprimida. Tomar essas bandeiras nos locais de trabalho e estudo é crucial para combater a divisão de suas fileiras bem como para desenvolver todos contrapontos que for possível em uma conjuntura onde só se debate intervenção federal e tropas. Não é para todas batalhas que se marcha com a certeza que ela será a decisiva, mas mesmo a manutenção de posições e pequenos avanços de “trincheiras” exige energia do pensamento e da ação.




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