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DENÚNCIA | Trabalhadora é detida ao manter loja aberta na quarentena por ordem do patrão em Cuiabá-MT

Uma funcionária de uma loja de roupas foi levada a delegacia na última quinta-feira (26/03) ao ser flagrada com o estabelecimento aberto durante a quarentena na avenida Centro Político Administrativo I de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso.

terça-feira 31 de março de 2020 | Edição do dia

O caso singular

Uma funcionária de uma loja de roupas foi levada a delegacia na última quinta-feira (26/03) ao ser flagrada com o estabelecimento aberto durante a quarentena na avenida Centro Político Administrativo I de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso.

O patrão dono da loja obrigou a vendedora a manter o ponto, expondo-a às possiblidades de contágio do coronavírus enquanto ele mesmo estava em casa protegido e esperando manter sua taxa de vendas e lucros.

Os servidores da Secretaria de Ordem Pública fiscalizavam o fechamento comercial decretado pela prefeitura como medida de prevenção e durante a ronda encontraram a funcionária sozinha realizando a manutenção da loja. Ao ser questionada pelos ficais, a trabalhadora ligou para o proprietário. Este, por sua vez, ordenou que a vendedora mantivesse a loja de portas abertas ignorando o que poderia acontecer à sua funcionária, seja pelo possível contato com o vírus ou pela ação dos fiscais. O empresário reivindicou a posição do presidente Bolsonaro e o decreto do governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM), que naquela quinta-feira havia anunciado a liberação de abertura comercial.

Para manter o emprego, a vendedora relatou a ordem que o patrão deu por telefone e os servidores da prefeitura então resolveram autuar em flagrante a funcionária por descumprimento do decreto. Ela foi levada para a Central de Flagrantes da região, onde ficou detida até que o seu chefe aparecesse para assinar um boletim de ocorrência.

O empresário então reclamou que precisava manter o comércio aberto com a funcionária trabalhando para pagar as contas e que houveram ainda poucas mortes ou casos confirmados na região.

As contradições na totalidade

Todos os elementos desse caso ilustram a dinâmica de contradições do novo patamar de crise política em que o Brasil se encontra, sobretudo nas esferas do poder executivo. De um lado, Bolsonaro perde parte do apoio de sua base militar e tenta compensar esse dano articulando com setores da pequena burguesia, que são os mais diretamente afetados pela redução de consumo em período de quarentena (como é o caso do dono dessa loja de roupas). Quase todos os governadores do país tendem contra essa medida, porém Mauro Mendes no Mato Grosso é uma das exceções e alinha-se ao presidente para manter-se estável no poder.

O prefeito de Cuiabá Emanuel Pinheiro, por outro lado, busca se localizar pela pressão da crise sanitária ampliada pelo vírus em todo o país ao mesmo tempo em que visa as possibilidades ainda incertas das eleições municipais previstas para o mês de outubro. Este segue a tendência dos demais governadores reforçando as arbitrariedades do bonapartismo institucional, além das alianças com setores do agronegócio (fonte do dinheiro que guardou ele no paletó em um notável caso de corrupção registrado em vídeo).

O discurso de Pinheiro favorável a quarentena é da mesma raiz demagógica dos governadores. Alegam seguir orientações da Organização Mundial da Saúde em benefício da população, porém limita-se a impor a solução da clausura sem garantir aos cidadãos comuns pleno emprego remunerado e a testagem massiva. Mato Grosso tem no mínimo 16 casos confirmados de COVID-19 (sendo 8 deles concentrados na capital Cuiabá) e mais de 550 casos suspeitos. No dia seguinte ao acontecido com a trabalhadora detida por seus fiscais, o prefeito cinicamente deu uma entrevista coletiva se dizendo “contra a fiscalização de abuso de poder sobre qualquer aspecto. Não tolero, não aceito, mas a minha orientação é use a autoridade e não o autoritarismo".

O papel da classe trabalhadora

Como sempre acontece nas disputas entre setores da burguesia e suas alianças políticas, quem mais sofre são trabalhadores e ainda mais as trabalhadoras. A situação dessa vendedora é condicionada pelo embate que a coloca no fogo cruzado entre o poder patronal e os interesses estatais, cada um visando níveis diferentes de opressão e exploração.

Ao mesmo tempo o caso deixa também em evidência o fato de que a classe trabalhadora é o elemento fundamental da sociedade. O patrão pode se ausentar para ficar protegido, desde que seu lucro esteja assegurado pelo esforço de quem vende força de trabalho sem deter as condições de realização do trabalho enquanto o Estado garante o adestramento e repressão necessários para satisfazer o seguimento burguês que lhe patrocina.

Casos absurdos como esse serão mais frequentes na medida em que políticos e empresários decidem nas alturas o destino da maior parte da população. Sendo o protagonista velado na produção e circulação material da ordem capitalista, o operariado precisa mais do que nunca recuperar sua consciência de classe e organizar-se de forma independente para si projetando-se como sujeito de sua emancipação num momento decisivo. A luta contra os interesses patronais e o balcão de suas negociatas que é o Estado tem a tarefa de visar a proteção da vida de trabalhadores e trabalhadoras que estão sendo sacrificadas.

A única solução possível é um combate classista que afronte diretamente o interesse burguês com exigência de testagem em massa, proibindo as grandes demissões que estão ocorrendo e garantindo remuneração a todos os empregados, subempregados e desempregados por meio da taxação das grandes fortunas. A pandemia que nos cerca surge por dentro de uma crise capitalista que se arrasta desde 2008 e se aprofunda em 2020. A classe mais explorada e que nada tem a perder – a não ser suas algemas – não pode bancar com suor e sangue esse caos. Se o capitalismo é incapaz de satisfazer as reivindicações que surgem infalivelmente dos males que ele mesmo engendrou, então que morra!




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