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A DIREITA E O GOVERNO DE TSIPRAS | Syriza, o nacionalismo grego e os desfiles militares

Diego LotitoMadri | @diegolotito

sexta-feira 27 de março de 2015 | 00:00

Foto: EFE
A Grécia celebrou esta quarta-feira sua festa nacional com o primeiro desfile militar sob o governo de Alexis Tsipras. Ainda que no passado o Syriza brigasse pelo desaparecimento deste desfile, sua realização é uma nova mostra da moderação crescente do partido liderado por Tsipras e das concessões feitas a seus sócios nacionalistas e ao eleitorado mais conservador.

O desfile ante o monumento ao soldado desconhecido aos pés do parlamento contou, como dita a tradição, com a presença do grandes chefes políticos do governo.

Em meio a uma intensa chuva desfilaram os três corpos do exército, bombeiros, policiais, assim como veteranos da luta contra a ocupação nazista, os únicos aos quais Tsipras deu seu aplauso.

Em uma breve intervenção ante as câmeras, o primeiro ministro fez uma referência indireta aos problemas atuais ao destacar que "nada foi dado ao povo grego, tudo foi conseguido através da luta".

"Neste dia, devemos ter presente que quando um povo reclama algo, atua com decisão e tem o direito a seu lado, pode conseguir tudo," disse Tsipras.

Também o recém eleito presidente da República, o conservador Prokopis Pavlópulos, aludiu ao presente ao assinalar que o que conta agora é "construir o projeto europeu".

"Oxalá com o tempo nosso povo possa viver em melhores condições e longe do pesadelo atual," sublinhou o presidente.

Patriotismo nacionalista e críticas desde a esquerda

Quando o Syriza estava na oposição, preconizava a eliminação deste desfile militar. Não obstante, o gesto político de permitir sua realização dá conta de que o "governo de salvação nacional" com os Gregos Independentes (ANEL) implicou muito mais que a grande concessão feita pelo Syriza, que entregou nada menos que o Ministério da Defesa aos nacionalistas xenófobos liderados por Panos Kammenos.

Longe dos discursos enraizados nas tradições da esquerda grega, Tsipras e o Syriza optaram por desfraldar a bandeira nacional e a defesa do orgulho grego como estratégia para soldar uma aliança política e social com uma parte do eleitorado conservador e de direita que começa a ver no governo de coalizão do Syriza e do ANEL uma possível saída aos sofrimentos dos últimos anos.

Neste contexto, o desfile militar deste ano teve uma nota distinta. Uma vez concluída a exaltação militar, com a qual se comemora o começo da revolução de 1821 que onze anos depois levaria à independência do império otomano, houve uma representação de bailes tradicionais, um claro contraponto ao vivido nos último anos.

Grupos de dança procedentes de todas as regiões do país bailaram peças tradicionais, marcados por um público que, apesar do mal tempo, lhes animava e aplaudia.

Deste modo o Executivo liderado pelo Syriza tentou fazer com que a jornada, que era contra tudo o que havia defendido antes de ser governo, aparecesse como uma "festa popular" no qual as forças armadas se misturassem com o folclore grego.

Os coletivos da esquerda, antifascistas e antimilitaristas, veem neste tipo de gestos de confraternização entre o povo e o Exército uma operação própria da ditadura.

Do mesmo modo reagiram setores da ala mais esquerdista do Syriza, que fizeram múltiplas críticas durante os preparativos e preferem ver abolida esta tradição.

Desde a cúpula do Syriza, não obstante, se desdenha qualquer tipo de crítica, por mais moderada que seja. Por exemplo, o vice-presidente do Parlamento Europeu, Dimitris Papadimulis, opinou através de seu twitter que no futuro os aniversários nacionais devem celebrar-se de outra maneira, "com menos custo e menos ruído".

As declarações do eurodeputado não ficaram sem resposta e Rena Dourou a presidenta da região da Ática, a primeira mulher no Syriza que governa uma prefeitura, criticou seu companheiro de partido por abordar uma questão política de semelhantes características em uma breve mensagem de twitter.

"Questões políticas não se resolvem com 140 caracteres. Uma coisa é a política, outra a autopromoção", respondeu Dourou, co-organizadora do evento junto ao ministro da Defesa, Panos Kammenos, o único representante no Governo do partido da direita nacionalista.

Mas há outro ingrediente de peso na política de Tsipras que o desfile militar deixa entrever: a Grécia tem cinco vezes mais soldados por habitante que a Alemanha. O gasto militar de Atenas supera a média europeia e são empresas alemãs, francesas e norteamericanas as que abastecessem o governo.

Durante anos os diversos governos gregos deram via livre a suculentos negócios de armas, com subornos incluídos, para a compra de aviões, barcos, tanques e apetrechos militares. O eurodeputado ecologista francês Daniel Cohn-Bendit denunciou em 2010 que depois da crise da dívida Paris e Berlim deram prioridade a que Atenas não baixasse seu orçamento militar.

Será o desfile militar um gesto político de Tsipras para dizer aos militares gregos e aos governos da Alemanha, França e Estados Unidos que não haverá mudanças nesta política?

Ainda é prematuro afirmar, ma quem está em seu melhor momento com esta política é Panos Kammenos, um conspiranóico nacionalista e militarista que há pouco foi reivindicado pelo secretário geral da OTAN, Jens Stoltenberg, destacando seu "compromisso com a aliança". Uma Aliança que, dito seja de passagem, sempre exige mais gasto militar de seus membros.

Agencias: EFE




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