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POESIA MILITANTE | Sonhos Roubados pelo capital

sábado 20 de fevereiro de 2016 | 08:08

Ele queria ser medico
E não podia ser
Pra ser medico precisa de dinheiro
E ele só tinha proceder

Era só mais um preto
Vindo do gueto
Com amor transbordando do peito
Para policia: suspeito

Ele não se importava
Pra maldade de farda
Mas sua mãe sempre lembrava:

  •  Cuidado, você pisca o olho e a rua te traga

    Tudo bem preta velha
    Só quero que grave essa ideia
    Ainda te darei orgulho, te tirarei da miséria
    Eu: Primeiro doutor da favela

    Ele queria ser medico
    E não podia ser
    Pra ser medico precisa de dinheiro
    E ele só tinha proceder

    Terceiro ano da escola
    Nenhuma falta não justificada
    Nenhuma prova mal acabada
    Na formatura, orador da turma

    O pai juntou o ultimo troco, todo orgulhoso

  •  Meu filho tá formado
    Futebol e churrasco no campo
    Pode deixar que eu pago

    O discurso arrancou choro
    Até do gerente do morro

  •  Moleque tu tem talento
    Não siga meu exemplo

    Ele com toda esperança
    Só queria salvar vida
    Levar um diploma de doutor pra perifa
    Não se interessava pelo dinheiro que o crime traria

    Em momento melhor não poderia estar
    Todos os sacrifícios valeram a pena, pois passou no vestibular
    Uma bolsa cem % pro menino estudar
    A mãe de tanta alegria passou a chorar

    Mas ninguém esperava que no meio da algazarra
    As horas de felicidade estavam contadas
    Um camburão foi suficiente pra começar a guerra
    E o futuro doutor sem querer estava dentro dela

    A polícia não queria ideia
    Perguntava pelo gerente da favela
    Que há tempos já tinha fugido dela
    O moleque sabia, mas mantinha a postura de cria

    De repente tiro pra todo lado
    Ele não sabia se corria ou ficava parado
    O pai acudiu a mãe, que já tinha desmaiado
    Quando olhou pra trás, um PM nele agarrado

    O menino foi levado pro meio do mato
    choque, coronhada, torturado com saco plástico

  •  Desembucha se não eu te mato
    Dizia o diabo fardado

    Não sei, não senhor
    Sou apenas um estudante, vou ser doutor
    Um PM fez piada
    O outro deu risada

  •  Se quiser ser medico vai ter que pagar
    15 mil pela sua liberdade isso se eu não te matar
    Seu policia, não tenha esse trabalho
    Minha mãe é diarista, meu pai tá desempregado

    Me de essa arma que eu mesmo me mato
    Ele mal terminou a frase e ouve o disparo
    Viu o filme passar na mente
    Um sonho morto tão de repente

    Se conto história triste é por que não pisco o olho
    Esse menino sou eu, é você ou qualquer outro
    Que é oprimido, torturado ou morto
    Por um sistema que mata nosso sonho construído com tanto esforço.
    Tayla Fernandes


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