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Salários parcelados, seca e desemprego: como o governo Temer organiza a fome no Nordeste

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

segunda-feira 9 de janeiro de 2017 | Edição do dia

O absoluto descaso do governo golpista de Temer com o Nordeste é ilustrada em novos números de desemprego, parcelamento salarial e na imensa seca da região, que podem converter o Nordeste num barril de pólvora da luta de classes no próximo período, passando rapidamente do maior para o pior crescimento médio nacional.

Levantamento feito pela Tendências Consultoria Integrada mostra que, em 2015 e 2016, o Produto Interno Bruto (PIB) da região teve recuo médio de 4,3% ao ano – o pior resultado entre todas as regiões do País. Com o desemprego em alta, a renda familiar encolheu 2% ao ano e, num efeito cascata, fez as vendas no comércio despencarem quase 20% nos dois anos.

Parte desse resultado negativo é reflexo da pior seca dos últimos 100 anos. Entre 2012 e 2015, o Nordeste teve prejuízos de R$ 104 bilhões por causa da falta d’água. Desse total, R$ 74,6 bilhões foram na agricultura, R$ 20,6 bilhões na pecuária e R$ 1 bilhão na indústria, além de perdas dos próprios municípios com programas de ajuda.

Pelo histórico abandono da região às intempéries climáticas, exacerbada pelos governos neoliberais dos 90 e sem alteração estrutural pelos governos do PT, o Nordeste é altamente dependente das transferências governamentais, que recuaram com a crise fiscal brasileira. Com a queda na arrecadação nacional, Estados e municípios passaram a receber menos dinheiro para fazer frente às despesas.

Além disso, até 2015, quase 24% da renda familiar vinha de aposentadorias, pensões ou Bolsa Família, benefícios que durante vários anos cresceram mais que a renda do trabalho. De 2006 a 2014, o PIB da região teve crescimento médio de 3,9% ao ano, enquanto a média nacional foi de 3,5%. A renda familiar subiu 6,9%, impulsionando o comércio a uma taxa anual de 8,8% (o que, entretanto, se fez mantendo-se a região castigada pela seca, sem a construção de obras que - sem prejudicar o meio-ambiente, como faz a transposição do São Francisco - diminuíssem e terminassem estruturalmente com a dependência nordestina dos programas federais).

Gráfico do Estado de S. Paulo

Mas mesmo essa fonte de crescimento parece ter se esgotado, e não há perspectiva de que volte no mesmo ritmo e potência dos últimos anos. Entre 2015 e 2016, a renda do Bolsa Família, por exemplo, teve queda média de 5,7% ao ano, segundo a Tendências. No período 2017-2021 deve crescer apenas 0,3% ao ano.

Os avanços fizeram muitos economistas acreditarem que, em 50 anos, o Nordeste conseguiria se aproximar do PIB per capita nacional – o produto das riquezas totais produzidas pela região dividido pela quantidade de habitantes. Hoje essas estimativas não se aplicam mais. Segundo as previsões da Tendências, no ano passado o indicador recuou ao nível de 2009.

Se o PT manteve as bases das políticas neoliberais no nordeste (primarização da economia, rotatividade e terceirização do trabalho) combinadas com algumas concessões sociais, o governo golpista de Temer, aproveitando o caminho aberto pelo PT, terminou de afundar a economia nordestina.

Os dados no emprego são estarrecedores: segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), proporcionalmente, desde o ano passado as demissões foram mais fortes no Norte e Nordeste. Enquanto na média do país foram fechados 50 mil postos de trabalho (saldo líquidos entre admissões e demissões), nessas duas regiões a eliminação superou 1%. O Estado com maior corte no emprego foi Pernambuco, com 35 mil vagas fechadas, equivalentes a 2,5% das vagas existentes.

Em 2015 foram cortadas 76,6 mil postos de trabalho no Nordeste. Já no período que vai de julho de 2015 a julho de 2016, a região Nordeste registrou a segunda maior taxa de demissões no país, com 223.382 trabalhadores que perderam postos de trabalho formais.

Segundo reportagem do próprio G1, em ao menos 85 municípios de Pernambuco, os funcionários públicos tiveram salários parcelados, em alguns casos desde agosto de 2016.

As contradições sociais estruturais que emergem com a atividade destrutiva dos governos, que "organizam exemplarmente a fome e o desemprego" especialmente depois do golpe institucional, são tratadas com a violência estatal, como fez Temer ao decretar que o Exército assumiria papel de polícia no patrulhamento de cidades nordestinas, como o Recife (que vive lutas dos setores da saúde por melhores condições de trabalho).

Como enfrentar a crise provocada

O Nordeste pode se converter na zona mais explosiva do país com a crise social atual. Nem o lobby eleitoral interessado do PSDB (que com Alckmin ofereceu instrumentos para acelerar a transposição do São Francisco que afeta o meio-ambiente) nem a demagogia do PT que pavimentou a chegada de Temer com políticas que mantiveram o status de dependência assistencial do Nordeste podem dar saída à crise dos Estados.

Com tamanho número de demissões, por que a CUT e a CTB (que se dizem "oposição") não se movimentam? Estão esperando a taxa de desemprego atingir "níveis gregos", de 25% da população? É difícil esconder os acordos da burocracia sindical dessas centrais com o governo por trás de tamanha passividade. Os trabalhadores precisam lutar unificados contra o parcelamento salarial e a perda de empregos. Os sindicatos devem encabeçar um plano permanente de luta para defender a CLT e os direitos dos aposentados. É preciso agir.

Esta defesa unificada deve mirar a derrubada do governo golpista e seus ataques, sem que isso signifique relegitimar este regime político. Uma nova Constituinte, Livre e Soberana, que substitua a de 1988 e coloque a resolução dos grandes problemas do Nordeste nas mãos dos seus trabalhadores, é uma necessidade imediata.




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