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TRIBUNA ABERTA | Relato de uma mulher negra trans

segunda-feira 13 de junho de 2016 | Edição do dia

Ao escrever esta carta penso em todas as meninas, trans que tem suas identidades expostas com o propósito de proteger a “masculinidade de homens indefesos". Sou uma mulher negra transexual universitária certa dos meus privilégios e limitações, contudo tão vulnerável quanto as meninas que se prostituem como forma de sobrevivência.

Antes de narrar o acontecido deixo escurecido que existe uma produção cultural que desumaniza, degrada e exclui meninas e meninos trans, não só espaços públicos mas também das relações afetivas.

Em uma sábado, após sair da universidade, resolvemos eu e um grupo de amigos irmos pra Lapa, beber cerveja, conversar aquilo que qualquer pessoa faria, contudo conhecemos dois meninos lindos negros de Curitiba, um deles que eu me encantei, como qualquer mulher da minha idade ficamos, nos beijamos, embora eu sabendo que pra minha condição estar em público com um homem negro é quase raro, ou inexistente. Mas um conhecido se sentiu muito a vontade de dizer como forma de desqualificação da minha identidade de gênero, como se eu não fosse apta a estar naquele lugar muito menos estar me relacionando de forma não clandestina.

Até porque já se tornou natural, quase empírico, que mulheres transexuais só servem pra um sexo degradante, escondido sem compromisso e quando se foge a regra o estigma nos persegue de prostitutas, criminosas, doentes mentais etc.... Confesso que fiquei com muito medo, até porque tenho amigas que foram mortas por este motivo: "enganar machos indefesos".

Contudo fica uma reflexão. Um homem que se relaciona com uma mulher trans e abre mão da masculinidade, eu não seria digna de me relacionar com qualquer homem, estaria eu fadada a solidão pelo simples fato de ser trans. Segundo as leituras percebo que as pessoas sejam elas LGBTs ou não, são vistas como uma distorção de orientação sexual e identidade de gênero.

Contudo, tem também um recorte racial, até porque o defensor de homens indefesos é negro e faz falas sobre irmandade e relacionamentos afrocentrados e etc... Mas ao se deparar com uma mulher trans negra com um amigo seu, toda esta teoria de irmandade se dilui, para além desta questão, o machismo foi o primeiro agente impulsionador, que exclui, segrega e aparta todas nós

Esta situação me deixou marcas porque não consigo me relacionar com homens, por achar que ninguém deve passar por este sofrimento que eu passo em ser exposta como se tivesse cometido um crime. Finalizo dizendo que devemos resistir e ocupar, mesmo que nos custe algo.




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