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DOSSIÊ: Dia internacional da mulher negra, latino-americana e caribenha | Professora da UFMG conta sua trajetória como mulher negra na universidade

A professora Rosy Isaias é uma das poucas professoras negras no Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. Ela trabalha no departamento de botânica e se graduou em Ciências Biológicas pela Universidade Santa Úrsula (1986), e nos deu uma entrevista sobre a sua trajetória acadêmica e os desafios da mulher negra na universidade.

terça-feira 25 de julho de 2017 | Edição do dia

Esquerda Diário: Conte sobre a sua trajetória até ser professora da UFMG.

Rosy Isaias: Estudei em escolas públicas durante os ensinos fundamental e médio e optei pelo curso de Ciências Biológicas pela empatia com os professores de Ciências e de Biologia. O magistério aconteceu na minha trajetória de forma natural, quando me foi oferecida uma vaga para dar aulas de Inglês no CCAA. Estava recém-formada na graduação e abracei esta oportunidade como forma de entrar no mercado de trabalho e começar a ter independência financeira.

Algum tempo depois fiz concurso para a Secretaria de Estado do Rio de Janeiro, onde lecionei por 4 anos, período no qual cursei o mestrado em Botânica no Museu Nacional/UFRJ. Desestimulada pelos baixos salários, pedi exoneração e prestei a seleção para o doutorado em Botânica na Universidade de São Paulo em 1994. Já no primeiro ano do doutorado prestei o concurso para professora assistente (bastava ter mestrado) do departamento de Botânica na UFMG, fui aprovada e tomei posse em Outubro de 1995.

Esquerda Diário: Qual a sua opinião sobre a aprovação das cotas na graduação e na pós graduação?

Rosy Isaias: Num primeiro momento, pensava que as cotas não eram necessárias. Hoje após 22 anos na UFMG, vejo o acesso de uma parcela significativa da população à formação de qualidade que a UFMG oferece como uma medida capaz de ocasionar profundas mudanças redutoras de desigualdades sociais. E esta redução é uma forma eficiente de melhorar a qualidade de vida de todos.

Cito como exemplo, a criação do curso noturno em Ciências Biológicas e o aumento do número de vagas tanto no curso diurno quanto no noturno. Tive a oportunidade, como coordenadora do curso de Ciências Biológicas, de identificar aqueles que estavam aqui como beneficiários destas novas vagas. Uma vez na universidade, estes alunos não deixam nada a desejar aos que passaram nas primeiras colocações e após a formatura muitos se tornam profissionais dedicados e bem colocados no mercado de trabalho, servindo como exemplo para suas famílias e comunidades que percebem que também podem e devem almejar o ingresso numa universidade federal, focando numa formação melhor e não em carreiras acadêmicas.

Esquerda Diário: Comente sobre o cenário em relação às mulheres negras na universidade, antes, durante e o que você espera pro futuro após a aprovação das cotas. Seja em sala de aula ou nos diferentes cargos das trabalhadoras na universidade.

Rosy Isaias: O cenário é de mulheres negras ocupando uma parcela minoritária na UFMG, onde professoras negras ainda causam estranheza. A reação de uma grande parcela da universidade é de que a mulher negra deve ser no máximo uma funcionária administrativa ou uma aluna, nunca uma professora. Diversas vezes, ao chegar para uma reunião ou eleição em outra unidade, e por vezes no ICB, sou surpreendida pela busca de meu nome na lista dos técnicos administrativos, ainda que eu esteja de crachá e me identifique como professora. São necessários alguns segundos para que a pessoa se dê conta que me dirigi a fila dos professores para votar, ou que estou na reunião como representante dos professores e não acompanhando algum outro docente, só para citar alguns exemplos. Por que isso acontece? Porque embora tenhamos uma população majoritariamente negra e mestiça, no inconsciente coletivo a universidade é tida como um local para a elite. E esta elite deve ser composta por brancos.

Espero que as cotas mudem este panorama, que a medida que a mescla de cores de pele seja cada vez mais comum na universidade, haja cada vez menos estranheza e que as mulheres, independente da cor da pele, sejam vistas como presença natural em todos os cargos da universidade.




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