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Há um ano de Vista Alegre | Podemos, o “Teorema de Baglini” e uma nova hipótese política

Balanços em um ano da consolidação do Podemos como partido. A moderação política na busca da “centralidade” e o fracasso da estratégia de Iglesias. A volta do “Podemos das origens” e seus limites. Movimento e partido depois de 15M. Uma nova hipótese política revolucionária e anticapitalista.

Diego LotitoMadri | @diegolotito

sábado 24 de outubro de 2015 | 00:01

Há um ano da assembleia fundacional do Podemos em Vista Alegre se tem escrito diversas reportagens, mais ou menos profundas, fazendo um balanço do curto período intenso de treinamento em casa. Os enfoques são diversos, ainda que todos coincidem em marcar a metamorfose política que sofreu o Podemos em apenas 12 meses, moderando até fazer irreconhecível seu programa inicial e seu discurso para resolver o “centro político” central para sua estratégia de crescimento eleitoral.

A esta altura, isto não tem nada de novidade para ninguém. No entanto, nos faz recordar um triste célebre teorema de uso habitual na política argentina: o “teorema de Baglini”. Este conceito, formulado no ano de 1986 pelo então deputado da conservadora União Cívica Radical (UCR) , Raúl Baglini, que disse que o grau de “responsabilidade” das propostas de um partido ou dirigente político é inversamente proporcional a sua distância do poder. Se entende aqui a “responsabilidade” em um sentido burguês, a dizer, “responsabilidade de Estado”. A proposição tem variações, mas todas redundam no mesmo: quanto perto está do poder, mais conservador se torna um grupo ou líder polítco.

Obviamente, chamar como “teorema” esta formulação tem algo de excessivo e existem vários casos na história em que isso é desmentido. No entanto, no caso do Podemos e Pablo Igresias, sua comprovação é evidente. O curioso é que Iglesias se tornou cada vez mais conservador em uma operação política que garantiu um caminho que se acreditava um acesso rápido para a Moncloa. Mas como sabemos, a operação saiu mal. O último barômetro de outubro elaborado por Celeste-tel para o eldiario.es, outorga ao Podemos um humilde 10% de intenções de voto.

A estratégia pode falhar nos termos propostos por seus próprios líderes. Em sua viagem para o “centro” não poderia evitar a perda, certa, com os Cidadãos – promovido pelo establishment liberal como a expressão de ilusões democráticas e do próprio PSOE, que tem mostrado uma grande capacidade de resistência apesar de sua decadência como fiel partido do regime; e também pela esquerda, com um amplo setor de gente que viu cada vez menor suas expectativas no novo partido.

A pergunta é: e agora? Distintos setores dentro do Podemons, com mais ou menos críticas, colocam que a saída do atoleiro passa por “voltar ao Podemos das origens”. Assim o disse a poucos dias a secretária-geral do Podemos em Andaluzia, Tereza Rodriguez, quando defendeu que a formação deve “voltar a raiz do que foi no princípio, uma ferramenta de empoderamento popular e cidadão”.

“Podemos foi um discurso nos meios de comunicação, muito potente, capaz de conectar com o entusiasmo e o desejo de mudas das pessoas”, e também “milhares de círculos foram organizados em poucos meses para a política como foi feito no 15M, as marés”, disse a jovem dirigente do Anticapitalistas, fazendo um difícil equilíbrio entre suas críticas à cúpula e sua virtual subordinação a mesma (a qual inclui, como sabemos, a própria dissolução de sua antiga organização, Esquerda Anticapitalista, dentro do Podemos).

Existe uma origem a qual retornar que permitiria regenerar o Podemos como uma organização útil para conquistar as demandas mais sentidas pelos trabalhadores e povo? Como escrevia a um tempo Alejandro Arias, do momento emergente do Podemos pode-se resgatar-se aspectos positivos, “como a organização política e incorporação de amplos setores populares, não apenas de ativistas, mas também setores que estavam sumidos na passividade”. Mas no Podemos das origens existe as bases do Podemos atual que não se consolidou agora, depois de um ano, sem que então se questiona-se – salvo escassíssimas exceções -, a liderança de Pablo Iglesias e seu projeto político.

Um ano após a assembléia de Vista Alegre, o que está em crise não apenas a estratégia eleitoral pode resolver, mas o projeto em si: a "hipótese populista" sem âncora social ou pior, negando a necessidade de uma estrutura orgânica da classe trabalhadora e da própria luta de classes como motor de qualquer transformação social profunda; a supervalorização da fala (e televisão) como um gerador de “equilíbrio de poder”; incerteza política como um método e da reavaliação do antigo credo democrático social e programa; centralização burocrática de simpatizantes do partido, organizado para vídeo e não para a militância política; integração passiva nas instituições da democracia liberal que respeitam a legalidade e as suas regras. Isso resultou em um “vácuo” do significante Podemos.

Toda perspectiva crítica para o curso do Podemos exige que o questionamento de todo o projeto, a sua liderança, o seu programa e a sua estratégia política. Neste sentido, o fracasso de sua estratégia também está sob ataque a partir do ângulo "autonomista". Uma expressão é a recente crítica de Emmanuel Rodriguez depois da implosão agora em Común e as negociações para “confluência” à esquerda para a eleição geral.

“O sucesso inicial do Podemos não se entende sem o motor 15M, sem essa energia democratizante”, diz Rodriguez. O problema, resumindo muito, era que a forma-partido (Podemos, e antes, a Esquerda Unida) foi carregado para o movimento (15M). O que era necessário era desenvolver um tal movimento para levar a uma “ruptura constitucional” que resultou em termos eleitorais, pode ser expressa como uma “aliança cidadã” com um único programa (processo constituinte) ".

Emmanuel Rodriguez pode representar agudas críticas, embora sua visão estreita em uma certa idealização de 15M, não reconhece nenhum limite, ou perspectiva, ou composição de classe. Na verdade, reinvindica sua composição pequeno-burguesa como a arena para o desenvolvimento de uma “democracia radical” e o Podemos das origens como um possível veículo de “mutação do movimento democrático em opção constituinte de massas”.

O que é problemático nesta leitura é que, em última instância, a emergência pode ser parte de uma dinâmica em que o fenômeno dos Indignados, como um movimento democrático, não buscou na classe trabalhadora o aliado fundamental para seus propósitos democratizantes (não foi "de praças para as fábricas"), limitado a um questionamento radical das formas políticas do Estado.

Neste contexto, Podemos foi um epifenômeno de um possível processo ascendente da luta de classes. Uma possibilidade que certamente não se desenvolveu, mas no que teve muito a ver não só com os reformistas, mas com os líderes sindicais especialmente burocráticos. Assim, o partido fortaleceu Pablo Iglesias em proporção direta com a mobilização social e a luta de classes tendeu a declinar. Além disso, tornou-se a colaborar ativamente com processo de passivização.

A oposição entre “em movimento” e “partido”, longe de ser produtivo, corre o risco de postular uma volta atrás, o fracasso da “ilusão política” para a “ilusão social” originária.

Antes de uma luta contra a "partidocracia", uma conclusão alternativa é que precisamos de um novo tipo de partido, democrático, revolucionário, anti-capitalista, inserido organicamente na classe trabalhadora e setores populares. Um partido que na mesma medida em que desmascara os limites das variantes neoreformistas, contribui para o desenvolvimento de organismos de auto-organização de massas para questionar o poder e a propriedade dos capitalistas, isto é, que trasformem as mesmas relações sociais em que sustenta o estado. Essa é a única maneira de abrir caminho para um verdadeiro “processo constitucional”, que pode “discutir tudo para mudar tudo.”

Ao longo da história, lembremos, estes organismos de democracia direta (sovietes, conselhos, coordenadores) floresceram, fora e enfrentando com a sua legitimidade popular, as instituições estatais capitalistas. Não os integrado para “gerenciá-los”.

Após oito anos de crise capitalista, é chegada a hora de vir uma nova hipótese político revolucionária e anti-capitalista viva, estabelecendo uma relação subversiva entre movimento social e partido, a qual o partido em sua influência entre os trabalhadores e setores populares desenvolvendo o próprio movimento, tornando frações revolucionários nos sindicatos e organizações de massa, promovendo a auto-organização e a frente única na luta de classes.

Será que esta nova hipótese pode ser desenvolvida no Estado espanhol, a médio prazo? Está por se ver. Mas é certo, o único cenário realista para o que se pode “tomar o céu de assalto”.

Tradução: Matheus Correia




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