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PARTIDO FRENTE FAVELA BRASIL | Partido Frente Favela Brasil: qual partido os negrxs precisam?

Marcello Pablito Trabalhador da USP e membro da Secretaria de Negras, Negros e Combate ao Racismo do Sintusp.

quarta-feira 7 de setembro de 2016 | Edição do dia

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O Brasil vive hoje uma profunda crise em seu regime político, marcada pela aprovação do impeachment no Senado e a consumação de um golpe institucional que se voltará em primeiro lugar contra os trabalhadores e os negros. Associada a crise política, os efeitos da crise ecomômica abre espaço para que apareçam questionamentos à representatividade política do país, expressa de forma categórica no desgaste confiança no PT após anos de entrega de direitos e acordos com os patrões.
Esta crise de representatividade se expressa também em um questionamento dos atuais partidos da ordem, como o PSDB, PMDB, PSC, etc, e nas instituições deste regime que o próprio PT alimentou durante o seu governo, mostrando de que elado ele realmente estava.
Este é o mesmo PT que segue rifando os direitos do negros e pobres, como vemos nas políticas do prefeiro Haddad em SP, que quer limpara o centro dos pobres, ou do Governador Rui Costa na Bahia, em que jovens são assassinados pela polícia pelo simples fato de serem negrxs.

Esta crise de representatividade se expressa no fato de que muitos trabalhadores e jovens não se vejam representados por nenhum destes partidos da ordem. No caso dos negros esta separação é muito profunda, já que nenhum destes partidos da ordem conseguem apresentar um programa que responda às principais demandas sentidas pelos negros como o trabalho precário, a falta de moradia e condições de vida dignas que se expressa na enorme expansão das favelas por todo o país, a violência policial que assassina milhares de jovens negros todos os anos, a desigualdade salarial entre negros e brancos e a enorme dificuldade para os jovens negros de acesso a educação para citar apenas alguns. Isto também é assim por que para atender a essas demandas significaria questionar a estrutura do capitalismo brasileiro, que se apoia numa enorme exploração da carne mais barata do mercado, sem a qual o capitalismo brasileiro não se sustentaria.
Nada mais natural que em uma democracia racista e dos ricos herdeiros da Casa-Grande, os negros não se vejam representados nestes partidos da ordem e em suas instituições, racistas em sua própria constituição.
É neste contexto que foi criado no dia 28 de Julho em um evento no Morro da Providência, a primeira favela do país localizada no Rio de Janeiro, o partido Frente Favela Brasil, que reuniu cerca de 500 pessoas e algumas personalidades, como o ator Lázaro Ramos e os ativistas Celso Athayde, Preto Zezé e Eliana Custódio, segundo entrevista publicada pela Agência Brasil.

Segundo o coordenador da Frente no Distrito Federal, Anderson Quack, “o partido nasce da necessidade de dar visibilidade e oportunidade às favelas e à população negra do país”, e ainda declarou “Vamos para a frente. Nem esquerdista, nem direitista, favelista”, definiu. O lançamento foi o primeiro passo para a formalização da legenda, que ainda passará por apresentar a documentação ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), colher as assinaturas de apoio e formar os diretórios regionais. A coleta de assinaturas de apoio para a criação do partido Frente Favela Brasil está prevista para começar em 20 novembro, Dia da Consciência Negra.

Um dos principais incentivadores da iniciativa do Partido Frente Favela Brasil é o fundador da organização não-governamental Central Única das Favelas (CUFA), Celso Athayde. A entidade não faz parte oficialmente do núcleo político da Frente, mas apoia o projeto. “Eu não vou me filiar por uma questão institucional. O tipo de trabalho que faço não me permite tomar parte de partidos políticos. Mas a democracia me permite colaborar com algo que seja diferente de tudo que está aí. Na Frente Favela Brasil, 40% das vagas serão para jovens entre 18 e 30 anos e 50% para mulheres. Todos os eleitos devolverão para a sociedade 50% dos vencimentos”, disse Athayde em uma entrevista ao jornal O Globo.

“A gente sempre quis apoiar algum partido que não apenas desse um espaço para o negro. Você tem por exemplo o Tucanafro, que é uma caixinha para os negros dentro do PDSB. Os negros estão em todos os partidos ali numa sala, mas eles não têm expressão, não fazem parte das cabeças. Quer dizer, na medida em que você é mais da metade da população, o espaço que existe para o negro na política é muito pequeno, e ele é responsável por isso, uma vez que ele não se organiza”, ponderou Athayde.

Segundo Athayde, a existência de um partido de negro, que represente os negros e as favelas vai além da ideia de disputar espaços e espaços de poder apenas pelo poder. Um dos princípios do novo partido é o voluntariado, que vai atingir inclusive quem alcançar cargos eletivos. “Os parlamentares desse partido devolverão 50% do seu salário para a fundação do partido, que devolve para a sociedade a partir de um edital anual. A gente entende que o exercício parlamentar não é para ser feito por pessoas que querem fazer carreira na política, mas por pessoas que tenham comprometimento com a coletividade real”, disse Athayde.

Ativista do movimento negro e feminista, Eliana Maria Custódio disse que a Frente é uma oportunidade para as mulheres também serem incluídas na política de forma eficaz, já que hoje ocupam menos de 20% dos cargos apesar de serem 51% da população.

“Uma oportunidade de reverter esse quadro é a próxima eleição, mas até a Frente Favela Brasil ter condições de colocar uma mulher, de preferência uma mulher negra para disputar as eleições, a gente vai trabalhar para formar e fortalecer as mulheres dessa proposta. Quando as mulheres vão para dentro dos partidos políticos, para as cotas, elas não têm o mesmo respaldo financeiro, de investimento, de material que os homens, ou seja, elas estão indo para cumprir cotas. E para cumprir cotas não nos interessa. A gente quer ter o mesmo direito e o mesmo investimento financeiro que qualquer outro candidato do sexo masculino”, criticou.

Em um marco de crise de representatividade, onde se escancaram contradições do regime politico, aparece também com mais força a essência completamente anti-democrática do regime politico e eleitoral brasileiro que na verdade é uma expressão dos interesses da classe dominante branca.
A história do Brasil é repleta de exemplos do enorme medo que burguesia brasileira têm de que os trabalhadores, a juventude e o povo negro se organizem politicamente e o absoluto autoritarismo do regime eleitoral que amordaça a voz da esquerda e dos oprimidos.
O surgimento da Frente Favela Brasil, é um sintoma no plano politico que expressa de forma distorcida o enorme e latente descontentamento dos negros com a opressão racista em nosso país e a ausência de uma alternativa política, incluindo aqui as organizações de esquerda, que expresse de forma consciente um programa e uma estratégia capazes de levar a frente as demandas negras. Frente a isso, não será novidade que este regime politico racista e burguês imponha todas as dificuldades e restrições possiveis à legalização da Frente Favela Brasil

O Brasil para os negrxs após o Golpe

Devemos denunciar fortemente o golpismo e o racismo representados no regime e suas instituições que se fortaleceram após o Golpe Institucional, que escancara o papel do PT como o grande mediador dos interesses dos ricos e que mostra a real face do Judiciário, que utiliza seus tentáculos para avançar ainda mais sobre os direitos básicos da população e dá respaldo para a política da burguesia, mostrando o quão anti-demicrático e afastado das massas é este regime podre, com o qual os negros não devem depositar nem 1% de sua confiança, uma vez que nós negros não nos vemos representados nele. que ganha contornos absurdos do seu nível de anti-democratismo quando Gilmar Mendes teve cara de pau de mandar abrir processo questionando a legalidade do PT, ao que poderia posteriormente recair sobre qualquer organização que estivesse por fora da ordem burguesa, como o próprio FFB. Enquanto o FFB se diz um partido nem de esquerda e nem de direita, suas lideranças, como o Athayde do CUFA, abre as suas portas para receber os candidatos da direita como Aécio Neves do PSDB e Marina Silva, que disputou as últimas eleições pelo PSB, partido aliado da direita tradicional brasileira ou para o PT, partido conciliador que nos últimos 13 anos vendeu os direitos e sonhos dos negros e do povo pobre para privilegiar os lucros do empresários e que alimentou esta direita raivosa que tem Feliciano e Bolsonaro como ídolos. Na contra mão deste posicionamento da FFB, não vemos nenhuma linha contra o Golpe Institucional, contra os ataques do Governo do PT e tampouco um posicionamento claro de independência de classe, que se torna mais necessário do que nunca para apontar um rumo a luta contra o racismo em nosso pais. Devemos lembrar que não existe lugar vazio na política e se dizer “neutro” é fortalecer os setores que estão hoje no poder. Abrir espaço para os representantes da burguesia e não dos trabalhadores é um erro que deve ser combatido.

Leis de legalização partidária

Importante aqui nós denunciarmos o sistema eleitoral brasileiro, que impossibilita à qualquer organização que manifeste e defenda suas opiniões e posições, vetando não apenas a legalização dos partidos de esquerda como o Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT) que impulsiona o Esquerda Diário ou o MAIS (Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista) nova organização fundada , mas também retirou o direito a tempo de TV, presença em debates e reduziu a verba partidária dos poucos partidos de esquerda legalizados, como o PSOL, PCB, PCO e o PSTU. Lei esta conduzida na câmara dos deputados pelo reacionário Eduardo Cunha (PMDB), no ano passado, dentro do plano de microreformas no sistema eleitoral, que se mostraram como ataques aos partidos menores e fortalecimento dos partidos com maior expressão. Ao mesmo tempo em que diante da situação politica em que vivemos, onde há uma crise de representatividade no regime e um desgaste dos partidos tradicionais, além de que neste momento passamos por um golpe patrocinado pela direita, devemos nos preocupar com como os negros irão dar uma saída para esta crise. Nós negros, ao contrário do que coloca Athayde, estivemos na formação dos mais importantes partidos e movimentos de trabalhadores no páis e no mundo, mostrando que para os negros é mais que natural unir forças para combater a miséria em que historicamente ele foi colocado, mas infelizmente, devido a herança do stalinismo, as demandas dos negros, das mulheres e dos LGBT foram separadas das demandas dos trabalhadores em geral e de seus métodos de luta. Devemos reaproximar estas duas demandas e possibilltar uma saída á esquerda para o povo negro, junto com todos os outros oprimidos.

Relação com seus candidatos e a comunidade

O desgaste do regime politico podre e da democracia dos ricos vem abrindo questionamentos que se expressam também em propostas levantadas pela FFB como a de ter uma proporção de 50% de candidatas mulheres e 30% para jovens entre 18 e 30 anos e de que os políticos eleitos pela FFB, devolvam 50% para a comunidade em forma de editais.
Estas propostas apontam questionamentos corretos de aspectos do regime politico, mas acabam sendo limitadas pois a ausência de uma estratégia de independência de classe e um questionamento profundo do capitalismo e do seu regime politico não permitem levar um combate frontal ao regime politico racista em que vivemos.
Nestas eleições, nós do MRT defendemos nas candidaturas anti-capitalistas de Diana Assunção, Maíra Viscaya, Danilo Magrão, Carolina Cacau e Flávia a palavra de ordem de que todo político ganhe o mesmo que uma professora, como um passo para questionar os mega salários e privilégios que os políticos recebem hoje no Brasil chegando a salários altíssimos de R$ 30 mil. Nossos candidatos, se eleitos receberiam os seus mesmos salários atuais doando todo o restante para as lutas dos trabalhadores e dos oprimidos. Defendemos a revogabilidade imediata dos mandatos, para que os trabalhadores e o povo possam revogar qualquer politico que considerem corruptos ou que não atendam as demandas da população, sem ter que esperar 4 anos para isso. Defendemos também o fim das chacinas policiais, a efetivação dos trabalhadores terceirizados sem a necessidade de concurso público, a igualdade salarial entre trabalhadores brancos e negros e as cotas raciais rumo ao fim do vestibular como parte de um programa anti-capitalista que possa estar a altura do combate ao racismo e a exploração capitalista.

Qual o programa e estratégia para combater o racismo?

Mas a final, qual o objetivo da FFB? Quais são os negros a qual ela quer dar voz? Para nós, este é um ponto fundamental para que possamos pensar o papel que as organizações e partidos devem cumprir. Algo preocupante em nossa análise é que o CUFA, principal organização por trás da FFB possui uma linha de permitir que o financiamento seja feito através de “parcerias com o governo, empresas privadas e outras organizações do terceiro setor”, o que não é aceitável para uma organização que diz querer organizar os pobres e favelados, pois a conecta diretamente com os causadores da miséria em que essas pessoa vivem, que são os capitalistas e exploradores donos das empresas privadas e de ong´s, além do governo repressor de Dilma e Temer (pois não podemos ignorar que a lei que hoje proíbe qualquer tipo de manifestações de “Fora TEMER” nas Olimpíadas foi sancionada por Dilma), que reprimiram manifestações e greves durante suas gestões, com destaque para o governo golpista do Temer, que aprofundou a repressão aos movimentos sociais e fortelaceu o sentimento conservador de direita na sociedade. Estar disposto a permitir que estes setores apoiem ou diretamente patrocinem qualquer ação dos oprimidos e marginalizados apenas coloca a luta e autonomia desses setores nas mãos dos opressores, de forma a jamais extinguir as opressões de raça e classe.
Apesar de falar ser “nem de direita e nem de esquerda”, acho importante colocar de verdade de qual lado se está, uma vez que no Brasil essas concepções se perderam com a história: estar a direita é defender o “livre comércio” da exploração cada vez maior dos trabalhadores, a diminuição dos direitos trabalhistas e dos salários e o aumento do lucro dos empresários, é defender que deve mesmo existe 1% da população que é dona de 50% de toda a riqueza do mundo, é defender a perseguição ao povo negro, ás mulheres, aos LGBT. Estar a esquerda é ser contra este sistema de exploração, lutar pelo acesso de todos a uma saúde, educação, transporte e moradia publicos e de qualidade, é defender o direitos dos oprimidos, das mulheres ao seu próprio corpo, dos negrxs á sua liberdade plena da prisão ao ceu baerto que é o racismo, direito a vida dos LGBTs, hostilizados como os negrxs pela KKK na década de 1940 nos EUA. Devemos lutar pela nossa completa independência dos setores que estão á direita e fortalecer as nossas lutas atavés da união das fileiras operárias e estudatis, de negrxs e brancxs, mulheres e homens, que coloque a independência de classe como grande objetivo de uma organização nesse sentido, que irá permitir que ela se coloca no campo legítimo da luta contra o sistema capitalista que é o principal responsável pelas condições de miséria em que estamos sujeitados.

Ainda está por ver qual será o sentido adotado pelo Partido Frente Favela Brasil, mas queremos abrir desde já o debate sobre o programa e a estratégia adotada na sua formação que hoje se aproxima mais de uma estratégia de conciliação de classes e de uma concepção geral de reformas parciais por dentro do atual sistema capitalista (incluindo a concepção de organização através das ONGs, que herdou da CUFA) do que de uma estratégia de independência de classe e um combate de fundo ao capitalismo.

Contra as restrições anti-democráticas do regime eleitoral burguês que censura a voz dos oprimidos, defendemos a liberdade de organização politica dos trabalhadores e de todos os setores oprimidos, ainda mais neste país racista e elitista, que não quer ver as negras se organizando politicamente pois quer nos ver nas ruas apenas no carnaval, e não ocupando as ruas por melhores condições de vida e tão pouco ocupando fábricas e escolas, nos querem apenas como a mão de obra mais barata, a empregada ou o motorista e não pensando e atuando para mudar os grandes problemas pelos quais passam o país. Nós também queremos dar um passo para mostrar aos negros que eles devem tomar o seu futuro em suas próprias mãos, isso passa em primeiro lugar por se posicionar ao lado dos trabalhadores e oprimidos, contra os patrões e assumindo um programa e estratégia revolucionária para destruir o capitalismo e a opressão racista, esperamos que estas linhas contribuam para este debate imensamente necessário.


Temas

Negr@s



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