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PEC DO FIM DO MUNDO | PEC 241/55 e acumulação econômica

quarta-feira 16 de novembro de 2016 | Edição do dia

Os debates sobre a PEC 241/55 tem feito com que uma série de direitistas semi-cultos, por meio das redes sociais, queiram aparecer como conhecedores de economia e com argumentos sofísticos busquem defender esse grande ataque aos direitos dos trabalhadores como uma evidente necessidade.

Tiram seus argumentos dos pseudo-intelectuais que habitam as páginas de economia dos jornalões burgueses ou dos "economistas" que fazem comentários nos telejornais. Esses, como descarados apologetas do capital que são, tentam fazer crer que a "pec do fim do mundo" é uma necessidade técnica, neutra, que sem ela as contas públicas estariam irremediavelmente perdidas e que apenas aqueles que são contrários ao país poderiam não apoiá-la; em sua ladainha apenas ignorantes dos fundamentos básicos da economia, defensores de "ideologias", poderiam lutar contra essa medida tão evidentemente necessária.

Nesse artigo iremos mostrar a falácia desses falsos argumentos "econômicos", que de forma consciente ou não distorcem a realidade para encaixá-la não nas necessidades de uma economia pura ou neutra, inexistente, mas nas necessidades de uma classe específica, da burguesia, dos capitalistas, contra os interesses da maioria da população, a classe trabalhadora e demais setores oprimidos.

Mostraremos ainda como são possíveis alternativas que representem os interesses dessa maioria para enfrentar a crise econômica, que se reflete também nas finanças públicas. Para fazer tal debate usaremos argumentos estritamente econômicos, buscando dialogar com os argumentos utilizados pelos conservadores, para mostrar que a suposta racionalidade de tais argumentos é pura falácia e como na verdade os supostos argumentos são desavergonhadas defesas de interesses indefensáveis.

PRIMEIRA FALÁCIA: A PEC NÃO DIMINUI OS GASTOS SOCIAIS, MAS APENAS OS CONGELA

Segundo os defensores da medida ela não seria um ataque aos direitos dos trabalhadores e oprimidos, pois não diminuiria os gastos sociais, mas apenas os congelaria. O erro desse argumento se expressa por dois elementos principais:

Os gastos com educação ou saúde, por exemplo, parte dos gastos sociais a serem congelados, representam uma determinada porcentagem do PIB brasileiro, para facilitar o argumento usaremos números abstratos que facilitarão a compreensão sem em nada modificar seu conteúdo: suponhamos que cada um dos setores (saúde e educação,em nosso exemplo) gasta $20, sendo o total do PIB $100, o que faria com que num primeiro momento cada um dos setores representasse 20% do PIB e os dois juntos 40%.

Se a economia brasileira crescesse dois por cento ao ano em média (projeção bastante modesta e possível de ser alcançada com uma política econômica saudável) durante 20 anos (tempo de duração da PEC) o PIB brasileiro teria crescido, em nosso exemplo abstrato, para $148,50 e os gastos com educação e saúde, congelados, teriam diminuído brutalmente, representando agora apenas 26,9% do PIB.

O argumento é falacioso também porque durante esse período a população brasileira não fica estagnada, mas aumenta, necessitando, portanto, de mais escolas e hospitais, por exemplo.

Para mostrar de forma muito simples, se a população total fosse de 100 indivíduos e os gastos com educação e saúde fossem iguais a $100, para cada individuo seria gasto 1$ com saúde e educação. Se o crescimento vegetativo da população for de 30% em 20 anos, por exemplo, e a população aumentar pra 130 indivíduos, os gastos com educação e saúde para cada indivíduo diminuiriam 24%, passando a ser de 0,76 por pessoa. Teriam portanto os gastos com educação e saúde uma grande diminuição, quando é evidente que o que precisamos não é de uma educação e saúde piores e mais sucateadas, mas melhores e com mais recursos.

SEGUNDA FALÁCIA: A PEC É ESSENCIAL PARA EQUILIBRAR OS GASTOS PÚBLICOS, SEM ELA O PAÍS VAI QUEBRAR

Contudo, como dissemos no começo desse artigo iremos debater aqui com os argumentos dos defensores da PEC a partir de um ponto de vista mais diretamente econômico; nesse sentido, um liberal mais cínico, e que reivindique para si o direito a ser um economista, poderia tentar argumentar: "tudo bem, a PEC realmente diminui os gastos sociais, mas ainda sim ela é uma necessidade econômica. Se os gastos públicos continuam a aumentar nesse ritmo, mais rápido que a receita, o país evidentemente irá quebrar, é uma questão mínima de matemática" e toda essa ladainha pseudo-científica.

A falácia desse argumento vem de seus pressupostos econômicos totalmente equivocados; aqui não existe nenhuma questão elementar de lógica ou matemática, como tentam fazer crer os economistas burgueses.O erro dos pressupostos dos economistas apologéticos do capitalismo é entender o excedente econômico, aquela parte do produto social que está para além do necessário para recompor o capital constante utilizado no ciclo econômico precedente (maquinário, matérias-primas, energia, etc) como uma divisão em apenas duas partes, uma voltada aos gastos com a força de trabalho, o capital variável (salários, gastos sociais como saúde,educação, etc) e o fundo necessário para o investimento produtivo que permita uma acumulação ampliada (o fato de a economia burguesa usar outras denominações para os gastos com o maquinário, matérias primas, etc, por um lado, e os gastos com a força de trabalho, por outro, não muda em nada a questão).

É evidente a partir desses pressupostos defendidos pelos economistas burgueses que se por exemplo a economia ficasse estancada e aumentassem os gastos sociais diminuiria o fundo necessário para o reinvestimento produtivo e a partir daí as possibilidades de expansão econômica.Com esses pressupostos inclusive se a economia cresce pode diminuir o fundo para o reinvestimento, caso os gastos sociais cresçam mais rápido que o conjunto da economia.

Inclusive se os gastos sociais aumentassem num ritmo muito acelerado eles poderiam não só impedir o crescimento econômico posterior como passar a fazer com que a economia encolhesse, pois os gastos sociais, depois de crescerem a ponto de se apropriar de todo o fundo para o reinvestimento, avançariam sobre o próprio montante do produto social que permitia a reprodução econômica em patamares iguais ao do ciclo anterior. Esse é o raciocínio, se partimos dos pressupostos dos economistas burgueses.

Contudo, como dissemos antes, esses pressupostos são errados e o excedente do produto social não se divide apenas entre os gastos com a força de trabalho e o fundo necessário ao reinvestimento produtivo no capitalismo, existe um terceiro elemento ignorado pela contabilidade interessada e interesseira dos apologetas do capital; o gasto improdutivo com as classes e setores parasitários da sociedade, os capitalistas e administradores no interesse patronal do estado capitalista.

Se entendemos que o produto social excedente se divide não em duas, mas em três partes vemos que o aumento dos gastos sociais pode se dar não as expensas do fundo necessário ao reinvestimento produtivo, certamente essencial para o crescimento econômico, mas as expensas do gasto improdutivo com os lucros dos capitalistas e os supersalários dos administradores do estado nos interesses dos patrões (juízes, políticos, etc). Assim, mesmo que os gastos sociais aumentassem mais rápido que o crescimento da economia (o que de forma alguma é uma necessidade, como mostraremos abaixo) não seria nem de longe necessário diminuir esses gastos ou diminuir o fundo de investimento para o crescimento econômico; bastaria diminuir os gastos improdutivos com os lucros capitalistas e gastos desnecessários com supersalários de juízes e políticos, por exemplo, para que se pudesse aumentar simultaneamente tanto os gastos sociais quanto o fundo necessário ao crescimento econômico.

Isso seria possível com uma forte taxação progressiva sobre as grandes fortunas e o estabelecimento que o máximo a ser ganho por qualquer funcionário do estado não pudesse passar do salário médio de um trabalhador qualificado, uma professora, por exemplo. Medidas como essas, totalmente plausíveis do ponto de vista econômico, resolveriam os problemas fiscais do estado e permitiriam aumento dos gastos sociais e maior crescimento econômico.

Vemos assim que o problema está longe de ser técnico, de uma abstrata racionalidade econômica, mas é antes uma questão de classe, de que posição e para quem se pensa o crescimento da economia e os problemas econômicos.

Um último elemento a ser colocado é que os chamados gastos sociais se pensados do ponto de vista estritamente econômico não necessariamente tem que ser vistos como gastos, pelo contrário, poderiam muito bem ser vistos como investimentos. Isso porque um mesmo quantum de força de trabalho, um mesmo número de trabalhadores, não geram uma quantidade de valor estática, essa quantidade de valor varia de acordo com diversos fatores.

É evidente, por exemplo, que um número X de trabalhadores sem instrução escolar gerará uma quantidade Y de valores, mas que a mesma quantidade de trabalhadores com uma educação adequada vai gerar uma quantidade de valor Y potencializada pelo seu nível educacional.Ou seja, uma classe operária mais educada (e não só, com mais saúde, saneamento básico, etc) será muito mais produtiva, a produtividade de seu trabalho será muito maior. Um dos fatores básicos para o crescimento econômico de um país é sua capacidade de aumentar a produtividade média do trabalho de seus trabalhadores; certamente não é diminuindo os gastos com saúde e educação que conseguiremos tal objetivo.

Vemos portanto como a PEC do fim do mundo antes de representar qualquer saída para a crise econômica que expresse um projeto de país que seja emancipador representa um projeto de país que mantém as contradições e atrasos estruturais de nossa economia. É necessário pensar não a partir do estreito ponto de vista dos capitalistas, ponto de vista contrário ao do conjunto da população, mas a partir do ponto de vista da classe operária e setores oprimidos, como forma de forjar esse projeto de país que tenha uma perspectiva emancipadora e de soberania.




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