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TRIBUNA ABERTA | Os esquecidos

Publicamos na Tribuna Aberta do Esquerda Diário contribuição enviada por professor da rede pública do Paraná.

quarta-feira 28 de março de 2018 | Edição do dia

Foto: "Os Operários", de Tarsila do Amaral

É discurso corrente, disseminado: o povo brasileiro não tem memória, não sabe votar, tem o governo que merece.

É estranho não lembrar que este povo é dopado e chibatado sempre que é necessário há 5 séculos. Foi assim com os índios: açúcar, cachaça, espelho, pólvora e vírus.

A colonização conseguiu escrever o nascimento deste país. Os livros didáticos são a prova mais pérfida e viva desta terrível narrativa.

Até bem pouco tempo, se não fosse o querido Darcy Ribeiro, este país teria o nome de Brasil (pelo pau-brasil). Tentaram com todas as armas fazer esquecer os Brazis que aqui viveram por mais de dez mil anos.

A pólvora e a tortura selou inúmeras rebeliões, silenciou inúmeras vozes e a história escrita nunca transcreveu com fidelidade o que tantas vozes expressaram.

Muito pelo contrário, a história do Brasil é a história do esquecimento.

Não sabemos e não queremos saber quem são os nossos negros, quem são nossos índios, quem são nossas mulheres, quem são nossos jovens.

Esquecemos, somos a terra do esquecimento.

Faz 500 anos que este país é medicado por monstros imperialistas, que não poupam nem crianças e nem velhos, que desfazem dos jovens como quem descarga suas fezes na privada. As mulheres são mercadorias, os homoafetivos aberrações. Assim, como o choque elétrico foi natural nos hospícios, como a homofobia e tortura estruturam os quartéis, nas delegacias estão absolvidos os inúmeros assassinos.

A memória do povo brasileiro é debilitada, dia a dia, ano a ano, entre as copas do mundo erigem-se os mais diversos tratamentos para destruir a nação.

Não é de admirar que sem trégua, sem seios o povo não amadurece como precisa, não é de admirar que a humanidade brasileira fica assim tão bestificada. É um crime institucional, premeditado.

O que pode ser uma mulher negra no Brasil? Que caminhos possíveis para os jovens do país?

A vida política e econômica é um labirinto cujo objetivo é criar uma isquemia grave no nosso povo, para que o deixe nu na prisão, desnutrido na favela, sem consciência no trabalho, desamado de si mesmo.

Embora tudo isso seja feito arquitetado, governo a governo, ano após ano, ainda assim, muitos jovens, inúmeras mulheres, dezenas de negros aqui resistem, índios aqui se suicidam e lutam. Ainda assim, temos tantos heróis nos morros, cartolas e nelsons, tantos garrinchas nos tijolos de Brasília.

Nossos verdadeiros heróis não têm nome, se eles os têm ou os tiveram, nunca deles sabemos. Mas eles existem, muitos, muitos foram mortos, estão no céu do esquecimento, muitos estão vivos, mesmo vivos, mesmo trajando armadura com asas de anjos não ficamos sabendo da existência deles.

A cada televisão ligada, em cada sorriso do capitão-do-mato, a cada discurso vil, em cada lei prisioneira, eu sei que o meu país, que o povo brasileiro vive no esquecimento porque o ser humano tem limites.

É preciso romper os limites e sustentar uma nação de negros maravilhosos, de índios imortais, de mulheres extraordinárias, de homens livres.


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