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A CRISE DAS UNIVERSIDADES | Os desafios do movimento estudantil em tempos de crise frente ao 1º Congresso da UFRJ

A UFRJ é parte da profunda crise pela qual passa o país nos últimos anos, os desafios dos estudantes são enormes e neste momento de Congresso na UFRJ, nós da Faísca – Juventude Anticapitalista e Revolucionária, queremos apresentar algumas ideias para o debate.

Faísca Revolucionária@faiscarevolucionaria

sábado 23 de junho de 2018 | Edição do dia

A crise das universidades

No Brasil, a expansão da universidade foi tardia e limitada. Se deu primeiro para atender as necessidades do “milagre econômico” em plena Ditadura Militar, a partir da reforma de 1968 pautada no acordo MEC-USAID, e já num marco de crise internacional das universidades. Durante o governo FHC, de 1994 a 2001, uma nova expansão foi realizada, com foco nas universidades privadas, com o governo tucano seguindo à risca as orientações neoliberais do Banco Mundial. As universidades privadas, porém, em sua grande maioria não tinham como foco um ensino capaz atender a demanda burguesa para a formação de mão de obra qualificada e produção de ciência e tecnologia, de modo que a universidade pública ainda mantém uma importância para o sistema. Apesar disso, a universidade brasileira passa por uma crise por 2 lados: pelo lado burguês, de ter que cumprir seu papel consumindo o mínimo dos recursos do Estado. Do ponto de vista da população, ela representa a possibilidade de ascensão social mesmo com acesso restrito, o que leva ao anseio pela democratização do acesso ao ensino superior. O PT, em seus governos, explorou essas contradições da crise e, longe de qualquer propósito de resolvê-las, aprofundou a relação das universidades com os interesses capitalistas. O fez a partir de programas que alcançaram um setor maior da população, como o ProUni e a expansão do FIES e o Pronatec, ao mesmo tempo que enriqueceu mais os grandes monopólios privados. Não à toa, o maior monopólio educacional do mundo, o Kroton-Anhanguera, surgiu no Brasil sob o governo petista.

A partir do REUNI, promoveu-se a expansão das universidades federais sem verbas para infraestrutura, professores, bibliotecas e permanência estudantil, com muitas instituições sequer conseguindo manter suas atividades e atender à crescente demanda. Além disso, muitos cursos criados vinham justamente para atender a demandas específicas da burguesia. Junto com isso, era cada vez maior o número de pessoas com diploma que não conseguiam emprego na área de formação, situação que se agravou muito com a crise econômica atual. Essa situação fez estourar em 2012 uma das maiores greves estudantis nas federais das últimas décadas. Outro programa reivindicado como uma grande conquista pelos campos petistas é o ProUni, que concede vagas nas instituições privadas – muitas vezes precárias – em troca de isenções milionárias de impostos para os patrões, servindo como uma verdadeira reserva de mercado e aprofundando o ensino privado como uma fonte de lucros, sem riscos para esses que fazem de nosso direito à educação uma mercadoria. O FIES, feito por FHC, foi ampliado pelo petismo para avançar com a mesma lógica, relegando dívidas à juventude precária. É ainda muito baixa a porcentagem da população com diploma de ensino superior, segundo dados do IBGE, trata-se de cerca de 8%.No governo Temer, os ataques à educação aumentaram, com corte de verbas, demissões nas privadas e reestruturações motivadas pela reforma trabalhista, reforma no Ensino Médio e a expansão dos monopólios para abranger uma fatia maior do ensino básico (como mostra a compra do grupo Somos pela Kroton-Anhanguera).

Imagem: Domingos Peixoto / Agência O Globo

A UFRJ faz parte dessa lógica. Fundada em 1920, é atualmente a maior universidade federal do país com cerca de 50 mil alunos e carrega consigo todo as contradições da sociedade de classes em que vivemos. Com seu maior campus, o Fundão, localizado ao lado do complexo da maré, uma das regiões com o menor IDH da cidade, a UFRJ ao mesmo tempo que conta com centros de pesquisa de ponta, como a COPPE, que formou o ex-vice prefeito do Rio Fernando MacDowell, com pesquisas sendo financiadas e apropriadas pelo capital privado, ao mesmo tempo em que convive frequentemente com atraso nos salários dos terceirizados, prédios caindo aos pedaços, falta de luz e água, problemas no hospital universitário. Junto a isso, nos últimos 2 anos foi palco de episódios como o assassinato do estudante do estudante Diego – até hoje sem respostas –, o incêndio no prédio da reitoria, que abrigava diversos cursos e que até hoje não retornou ao seu funcionamento normal, e o incêndio no alojamento, que deixou uma série de desabrigados.

A lista de exemplos não para por aí. Nas Olímpiadas de 2016, enquanto as instalações da UFRJ serviam de treinamento para várias delegações, causando uma série de alterações no trânsito da cidade universitária, a favela da maré sofria com a ocupação do exército e da força nacional. Além disso, estas instalações que foram reformadas para este fim agora sofrem com problemas de manutenção, como a piscina da educação física, que ficou meses sem funcionar.

Imagem: Adufrj

Um dos maiores centros de pesquisa da Cidade Universitária é o CENPES, vinculado à Petrobrás. Existe também uma série de laboratórios ligados à indústria petroquímica distribuídos pelo Campus. Apesar disso, a população não tem o menor controle sobre o conhecimento produzido ali, se ele serve às demandas da população e fornece combustível barato ou se serve para enriquecer uma minoria de acionistas e favorecer as explorações das empresas imperialistas sobre o petróleo nacional. Uma das principais medidas dos golpistas vem sendo avançar nas medidas de privatização da Petrobrás, que já vinha ocorrendo no governo Dilma com a aprovação da “Lei Serra” da partilha do Petróleo, por exemplo. Todo esse investimento em pesquisa e a renda do petróleo que corresponde a um terço do PIB do RJ – e que deveria também financiar a educação – está indo de bandeja para empresas imperialistas como a Exxon e a Shell. Por isso lutamos por uma Petrobrás 100% estatal, gerida pelos petroleiros e com controle da população!

Por acesso e permanência plenos, contra o filtro social do vestibular

A restrita expansão nos anos petistas e a conquista da lei de cotas, não fez com que a universidade deixasse de ser um espaço elitista, racista e excludente, legitimado pelo filtro social do vestibular, que deixa de fora das universidades a imensa maioria da juventude negra e dos filhos da classe trabalhadora, que, quando não está de fora do ensino superior (a imensa maioria) é obrigada a pagar mensalidades altíssimas e recorrer ao ensino privado. Mesmo quando conseguem superar esse filtro social, Muitos acabam não conseguindo se manter e concluir seu curso. Recentemente, tivemos também a conquista das cotas para portadores de deficiência, porém estes alunos sofrem com uma série de problemas de acessibilidade como a falta de instalações adequadas para deficientes físicos e escassez de intérpretes para deficientes auditivos.

Pelo fim do filtro social do vestibular!

A permanência estudantil também é muito precária. As bolsas são escassas e seu valor é insuficiente para que os estudantes consigam se manter com dignidade, além de que o valor está congelado há anos. O alojamento sofre com problemas estruturais e é superlotado, com estudantes muitas vezes dividindo quartos e mesmo assim fica não dá conta de atender a sua demanda. O bilhete único universitário, conseguido pelos estudantes em 2014 abrange apenas moradores da capital e apenas transporte rodoviário além de que diversas vezes é cancelado por “engano” das empresas de ônibus. Os bandejões nos campi da Praia Vermelha e do Largo de São Francisco só foram conquistados recentemente, e assim como os do fundão, costumam sofrer com enormes filas, além de funcionar com empresas terceirizadas que submetem os trabalhadores a menores salários e condições precárias de trabalho. Os ônibus intercampi tem horários limitados, prejudicando muitos alunos que tem aulas em 2 ou mais campi, ou estudantes do alojamento que tem aulas fora do fundão.

Por bolsas, vagas na moradia e creches de acordo com a demanda! Pelo reajuste das bolsas para o valor do salário mínimo!
Por um passe livre estudantil irrestrito, intermunicipal e intermodal!

Além disso, desde o ajuste fiscal, iniciado no governo Dilma e aprofundado no governo Temer, a UFRJ vem sofrendo com diversos cortes de orçamento. De 2015 a 2017, foram cortados aproximadamente 12 bilhões de reais. São cada vez menos bolsas auxílio e acesso permanência, além dos cortes nas bolsas de iniciações científicas, mestrado e doutorado, fonte de subsistência para muitos estudantes. Recentemente a prefeitura universitária também diminuiu os ônibus circulares internos, com apenas 2 horários na madrugada, dificultando a vida dos estudantes e dos moradores da Ilha do Fundão. Todos esses cortes no orçamento vêm para poder pagar religiosamente a dívida pública, mecanismo fraudulento que rouba nossos recursos e de submissão ao imperialismo. Foram gastos R$7 trilhões no governo Lula; no governo Dilma, quase R$6 trilhões e no governo Temer, cerca de R$3 trilhões. Mas mesmo assim, a dívida não para de crescer: hoje, ela é R$5,5 trilhões. O gasto com a dívida pública representa atualmente 9 vezes o gasto total com a educação. Com esse dinheiro, seria possível financiar 2500 UFRJ!

Pela abertura dos livros de contas, para que possamos ver para onde as verbas estão sendo destinadas!

Pelo fim do pagamento da dívida pública, para garantir os direitos sociais de moradia, educação, saúde, previdência, transporte, cultura, etc.

Por uma universidade a serviço dos trabalhadores!

Um dos grandes aliados da burguesia no seu projeto de universidade é a burocracia universitária. Os conselhos universitários são entidades altamente antidemocráticas e são compostas na maioria das vezes por burocratas com salários altíssimos e que são a correia de transmissão das políticas burguesas, além da figura de um reitor, que muitas vezes pode deliberar como bem entender. Na UFRJ, o estatuto prevê que 70% das cadeiras do conselho serão formadas por professores, 15% por alunos e 15% por trabalhadores, com proporção igual para o voto a reitor.
Por isso levantamos o fim dos conselhos universitários e que a universidade seja gerida por uma gestão do voto direto e universal (1 pessoa = 1 voto) para uma gestão dos professores, funcionários e estudantes, com maioria estudantil. Para isso levantamos também a necessidade de uma estatuinte onde se possa decidir sobre os rumos da universidade e que defenda que o conhecimento produzido esteja a serviço da classe trabalhadora e do povo pobre, não do lucro de um punhado de capitalistas.
Outro aspecto que mostra a desigualdade social na UFRJ é a terceirização. Todos os trabalhadores dos serviços de segurança, limpeza, manutenção e bandejões são terceirizados. Estes trabalhadores, além de ter salários e condições de trabalho totalmente precarizadas não tem representação alguma nas instâncias universitárias.
Pela fim da terceirização e incorporação de todos os funcionários terceirizados sem necessidade de concurso!

Por um movimento estudantil combativo e aliado aos trabalhadores

Desde o golpe institucional, a UFRJ tem sido severamente prejudicada, tanto com os cortes no orçamento mas também com o autoritarismo judiciário que com sua absurda perseguição ao reitor Roberto Lehrer por se posicionar ‘em defesa da democracia’

O DCE da UFRJ é gerido há anos por correntes como PSOL e o PCR (atual gestão), PCB e PSTU (que estiveram em gestões nos últimos anos), que apesar de se colocarem à esquerda do PT, acabam reproduzindo os métodos petistas eleitoreiros e afastados das bases. Apesar do DCE ter se posicionado corretamente contra o golpe e contra a prisão arbitrária de Lula, se colocou a reboque das direções petistas e acabou se adaptando ao seu imobilismo. A UFRJ foi uma das últimas universidades a ocupar a reitoria na onda de ocupações contra a PEC do teto de gastos em 2016. Além disso, esse ano, mesmo com ataques como a morte da Marielle e a prisão arbitrária de Lula, nenhuma assembleia geral foi convocada.

O congresso estudantil convocado pelo DCE é o maior espaço de deliberação na UFRJ, deliberando sobre as pautas do próximo período e sobre o estatuto do DCE. Era pra ser um espaço de amplas discussões entre os estudantes e que os estudantes pudessem participar democraticamente da sua construção. Entretanto o que vimos não foi isso. A construção não se deu com a participação dos estudantes nem com transparência. Informações como a programação e o calendário de inscrição de teses foram divulgadas muito em cima e por fora da vontade dos estudantes. Além disso a programação não conta com quase nenhum espaço para a discussão. Outro ponto é que uma das principais deliberações no congresso será o novo estatuto do DCE. Apesar disso, não foi feita nenhuma discussão sobre essa questão com os estudantes, nem mesmo a divulgação do estatuto atual do DCE foi feita.

O movimento estudantil pode cumprir um papel decisivo nas lutas, tendo sido a linha de frente de muitos processos. Na ditadura militar cumpriram um papel importante na resistência, tendo inclusive muitos de seus membros assassinados, como Mário Prata, que dá nome ao DCE. No maio francês foram a vanguarda da do movimento que, em aliança com os trabalhadores franceses, teve a possibilidade real de triunfar. Em 2013, foi a juventude a protagonista dos protestos que varreram o país, e as recentes ocupações estudantis de secundaristas foram um exemplo de luta que não se via há tempos!

Nós da Faísca defendemos uma concepção de movimento estudantil combativo que seja radicalmente democrático e atrelado às suas bases e que esteja em aliança com os trabalhadores. Desde o golpe institucional batalhamos contra ele de maneira independente ao PT. Na UERJ, fomos linha de frente na resistência aos ataques do desgoverno Pezão e na USP estivemos ombro a ombro com os trabalhadores terceirizados do bandejão.

Por isso fazemos chamamos toda a juventude que esteja disposta a construir uma fração revolucionária no movimento estudantil e que não se contente com a miséria do possível a conhecer as ideias da Faísca e debater com a gente. Como diziam as paredes de Paris em Maio de 68: “Sejamos realistas, exijamos o impossível.”




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