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REABERTURA DAS ESCOLAS EM SP | Os desafios da greve dos professores de SP contra a imposição do retorno inseguro

Com apenas três dias depois de iniciada, a greve sanitária dos professores da rede pública estadual de SP já é possível traçar algumas primeiras linhas de como estamos e o que precisamos fazer para reverter a situação difícil que visivelmente se apresenta. Em uma batalha que começou antes mesmo da data marcada para a greve com o secretario de educação anunciando publicamente que vai atuar contra os professores que aderirem à greve sanitária. São esses professores que já iniciaram a semana com seus salários cortados, por represália do governo estadual.

quinta-feira 11 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo

O que podemos afirmar categoricamente é que até agora todas as vezes que o governador João Doria (PSDB) e o seu secretário Rossieli Soares se pronunciaram em relação à volta presencial das aulas – é importante ressaltar que é o retorno das aulas presenciais, já que remotamente nunca deixamos de trabalhar – foi para disparar mentiras sobre as condições estruturais e sanitárias das escolas, sobre as condições do ensino remoto que ofereceram aos alunos e para, no melhor estilo “BolsoDoria”, levantar questionamentos sobre a seriedade dos professores da rede e para ameaçar com corte de ponto e medidas jurídicas contra os que entraram e entrarão em greve.

É um governo que quer impor seu negacionismo disfarçado às escolas de forma autoritária e sem qualquer diálogo franco, direto e legitimo com a comunidade escolar. Nós denunciamos as péssimas condições das escolas e total falta de segurança em diversas matérias pelo Esquerda Diário, que você pode ver aqui.

Não é sem motivos o receio e a insegurança de grande parte dos professores sobre tomar a decisão de encarar uma greve nessa situação. A pressão dentro das escolas é cotidiana e aumenta de forma progressiva, com dirigentes de ensino, supervisores e muitas direções das escolas, fazendo o papel de repassar e aplicar na carne a orientação do governo de esmagar qualquer opinião, reflexão e mobilização da categoria e das comunidades escolares. Assim, a dificuldade de fazer a greve ultrapassar barreiras e ganhar corpo deve ser a nossa principal preocupação, e também da direção sindical da Apeoesp, sindicato da categoria.

A greve começou nessa última segunda-feira com o governo efetivando a medida repressiva de cortar os salários dos grevistas e com uma certeza, será uma luta difícil e dura contra a intransigência de Doria e Rossieli, e o negacionismo de ambos, que só se diferencia do negacionismo assassino de Bolsonaro por ser velado e não escancarado, mas que na letalidade é bastante eficiente. Não é por acaso que São Paulo completou um mês com a média de mortes por COVID acima de 200 por dia. Em inúmeros textos denunciamos a falta de medidas eficazes no combate a pandemia no estado, enquanto Doria se lançava à disputa eleitoral de 2022 às custas da vida da população, dos trabalhadores e com mentiras baixas.

A última mentira propagandeada por Doria pelos quatro cantos do país para se promover foi sobre a vacina, já que correu para sair nas fotos e vídeos iniciando a vacinação quando na realidade nem mesmo a maioria dos profissionais da saúde, que estão na linha de frente há meses, puderam ainda receber a primeira dose. Já Rossieli Soares, um talentoso puxa saco de golpista – ele sempre lembra orgulhoso que foi ministro de Temer – não perde oportunidade de reivindicar o patrão pela chegada da vacina, ao mesmo tempo que precisa assumir que não tem vacina para todos, ao se negar atender à reivindicação dos professores e profissionais da educação, de só retornar com as aulas presenciais quando a comunidade escolar for vacinada e quando as escolas tiverem condições reais para isso.

Além dos desmandos, assédios e ameaças, os professores se deparam com um país de fome crescente, que tem uma Manaus asfixiada, por escolha consciente de Bolsonaro, Mourão e seus militares. Estamos sob um governo de extrema-direita, que representa de forma concentrada tudo de mais asqueroso e autoritário no nosso país. O negacionismo de Bolsonaro custou centenas de milhares de vidas e mesmo isso não foi o bastante para o governo, que em meio a uma pandemia que decidiu não combater – falta absolutamente tudo e o básico, como testes, vacinas, materiais de segurança sanitária pessoal, licenças remuneradas para os trabalhadores em grupo de risco e equipamentos hospitalares – cortou o auxílio emergencial e implementou ataques duríssimos contra os direitos trabalhistas, facilitando para os patrões as demissões e redução de salário, no momento onde as famílias mais precisavam de segurança. Enquanto isso as grandes empresas milionárias, bancos e o mercado financeiro seguiram com seus lucros exorbitantes.

Hoje são milhões de desempregados e subempregados, no país. São os nossos estudantes que presenciamos nessa situação, muitos abandonaram a escola, ainda mais com a dificuldade do ensino remoto, para pedalar horas e ajudar seus familiares desempregados. Também em suas casas as professoras e professores se deparam com o medo do desemprego, já que pra muitas famílias seus salários se tornaram a principal fonte de sustento.

O corte de ponto de grevistas, medida arbitrária e ilegal, se tornou a arma secreta do PSDB em todos os estados que governa, em particular São Paulo, onde chegou a deixar professores sem salários por 3 meses em 2015. Agora, mais uma vez, é dessa forma imoral, ilegal e autoritária que Doria e Rossieli querem impor o recuo dos docentes. Antes mesmo da greve ser iniciada formalmente, o secretário de educação anunciou em todas as mídias oficiais, que fazem campanha permanente pelo retorno inseguro, o corte de ponto dos professores, um ataque frontal e inadmissível ao direito de greve conquistado pelos trabalhadores. A nossa greve é legitima, ainda mais por se tratar de uma reivindicação primaria e elementar, a defesa da vida dos membros da comunidade escolar em meio a uma pandemia, agravada pela ineficiência do próprio governo, tanto regional, quanto federal. Diversas pesquisas mostraram que a maior parte da população e dos familiares dos estudantes estão ao lado dos professores, e se recusam a defender o retorno presencial sem condições sanitárias mínimas nas escolas.

É por isso que é uma tarefa urgente, indispensável e de todos tomar nas mãos a defesa do pagamento integral dos salários das professoras e professores grevistas, pra que a greve não acabe por inanição e às custas da fome das famílias da categoria, e que se cumpra o direito de greve de todo trabalhador.

A Apeoesp tem a obrigação de tirar a greve do isolamento que o próprio sindicato impôs a mobilização

Sabemos que essa situação acima impede o fortalecimento da greve dos professores estaduais de SP, mas é preciso dizer que a Apeoesp, sindicato da categoria há anos dirigido majoritariamente pelo PT e PCdoB, aprofunda essa desmobilização e insegurança da categoria. Não é novidade pra ninguém o desgaste e distância da Apeoesp com os professores. Uma situação que veio se intensificando nos últimos anos pela inação do sindicato, que teve como consequência a aprovação de diversos ataques por parte dos governos, como a reforma do ensino médio, as reformas da previdência (estadual e federal) e mesmo o abandono de 35 mil professores contratados, que passaram 2020, ano da pandemia, sem receber salário e sequer um auxílio de emergência do governo.

Além disso, é perceptível o nível de entrelace do sindicato com o gabinete parlamentar da deputada Maria Izabel Noronha (PT), a professora Bebel, como determina ser chamada, mesmo afastada das salas de aula há décadas. Desde 2018 a Apeoesp atua mais como extensão do gabinete parlamentar da Bebel e não como organismo de atuação coletiva e política dos professores.

Em todo último período a estratégia da Apeoesp se resume em esperar respostas da justiça, a mesma que autoriza o corte de ponto de grevista mesmo negligenciando o direito de greve, a mesma que determinou o retorno presencial das aulas sem as condições sanitárias. A mesma justiça que negou inúmeras vezes as ações contra o confisco dos salários dos aposentados e o aumento abusivo da contribuição previdenciária e que pune jovens e estudantes negros todos os dias, sem titubear.

Até agora a direção majoritária nada fez para que a greve fosse verdadeiramente implementada na categoria e nas escolas. Não convocou reuniões regionais com as escolas e membros da comunidade escolar, pra que a greve fosse construída. A grande maioria dos professores reconhecem a necessidade e a legitimidade da greve e sua pauta, mas seguem sem confiança que o sindicato levará seriamente a luta contra o autoritarismo do governo, debatendo nas escolas quais medidas e ações de mobilização é possível implementar com toda a segurança possível, para dialogar com os professores que seguem trabalhando e para unificar com a comunidade escolar.

A greve foi votada na sexta-feira, dia 5, e até agora nem mesmo reuniões virtuais foram convocadas nas regiões e subsedes dirigidas pela majoritária, para traçar um plano de ação e de fortalecimento da greve, contando com a experiência e tradição de luta das professoras e professores, que reconhecem e sabem dialogar com seus pares dentro das escolas e que são uma voz ativa entre estudantes, familiares e demais profissionais da educação.

Ao contrário, professores relatam que algumas subsedes regionais seguem fechadas, em meio a greve, e em meio a luta contra o negacionismo de Bolsonaro e a demagogia de Doria.

Sequer foi debatido com a categoria a resistência contra o ataque do governo ao direito de greve com o corte de ponto dos professores. Uma greve que se quer vencer é preparada e “arma” os grevistas com recursos, para enfrentar qualquer chantagem patronal em relação aos salários, essa é a função histórica do fundo de greve. É previsto no estatuto da Apeoesp que parte da arrecadação vá para o fundo de greve, justamente para momentos como o que estamos agora, os professores sintam segurança para lutar e seguir alimentando suas famílias. Por isso, é imprescindível que a Apeoesp disponibilize aos professores um fundo de greve e coloque a disposição dos professores todos os recursos necessários para que os professores não passem nenhuma necessidade e que a chantagem do governo resulte na derrota da nossa batalha pela vida.

A concepção traidora de decretar greve sem buscar construir na base, judicializar a luta por fora de criar mobilização que sustente e pressione a justiça, e se negar a unificar todos os profissionais da educação, como as trabalhadoras terceirizadas das escolas, profissionais da rede municipal e da rede particular, em uma única pauta e luta, pode aprofundar o isolamento da greve e a divisão da categoria entre os que estão paralisados e os que por desconfiança do sindicato seguem trabalhando presencialmente, mesmo com enorme descontentamento.

É categórico que para a greve se fortalecer é preciso que os professores se sintam seguros e unidos, principalmente os professores contratados, que são os mais atacados pela pressão, ameaças e assédio moral dentro das escolas. Para que os professores contratados também possam batalhar por suas vidas contra a imposição de Doria e Rossieli, e contra o negacionismo de Bolsonaro, é preciso a mais ampla e firme aliança entre efetivos e contratados, e essa é a tarefa da Apeoesp, ao invés de seguir aprofundando o receio dos professores categoria “O” e “V”, como em um áudio vazado onde um conselheiro da direção majoritária afirma ao professor que ele não pode fazer greve e deve preservar sua profissão.

Aparentemente o único objetivo da direção majoritária da Apeoesp é seguir com sua linha personalista, exaltando a deputada Bebel e assegurando a continuidade do mandato nas próximas eleições, e atuando apenas pra desgastar Doria e Bolsonaro, os possíveis adversários eleitorais do PT em 2022. Até lá, atuar pra que nada saia do controle e de suas rédeas.

Já passou da hora da Apeoesp organizar os professores para impedir a punição dos grevistas com o corte de ponto e mais do que isso, impulsionar que cada região e comunidade escolar sejam ativadas e se organizem pra fazer frente ao retorno inseguro das aulas presencial e exigir que professores, estudantes, trabalhadores das escolas e familiares, junto aos profissionais da saúde de cada região, possam debater e decidir as medidas necessárias e corretas pra cada realidade e estrutura, afinal quem conhece com exatidão as reais condições são eles.

A Apeoesp é um dos maiores sindicatos do país e se não quer colaborar com o governo para derrotar os professores e impor o retorno presencial que levará ao aprofundamento da crise sanitária dentro das escolas, deve imediatamente convocar reuniões, plenárias e assembleias virtuais e/ou presenciais com as medidas de segurança sanitárias onde for possível, pra unificar os profissionais de educação de São Paulo, das redes publicas e privada, com a população, membros da comunidade escolar e, mesmo os trabalhadores da saúde, como do Hospital Universitário da USP que reivindicam condições e vacina pra seguirem na linha de frente de combate a pandemia.

A luta por nossas vidas contra o descaso e negacionismo dos governos não se limita aos professores e muito menos a São Paulo, por isso outra medida fundamental é a Apeoesp convocar sindicatos dos trabalhadores de educação de outros estados para um dia coordenado de mobilização e paralisação contra o retorno inseguro das aulas e exigir vacina para todos.

Sem essas medidas seguiremos na difícil situação da nossa mobilização e da greve, e ao final a direção majoritária não vai vacilar em culpar os professores por não terem atendido ao seu chamado superestrutural de greve, fazendo pose de radical e consequente.

Unir a greve dos professores estaduais com a greve dos profissionais de educação do município

Com o prefeito pupilo de Doria à frente, Bruno Covas (PSDB), os profissionais da educação municipal se enfrentam com a mesma linha de imposição autoritária do retorno inseguro das aulas presenciais, com escolas cada vez mais precárias e com funcionários contratados que sofrem a mesma pressão que o PSDB faz aos contratos do estado há anos.

No último dia 10 o municipalismo da educação também decretou greve, e a consequência disso precisa ser obvia para os sindicatos tanto da rede estadual como para os da rede municipal. A palavra de ordem é unificar e coordenar as duas lutas, que enfrentam os mesmos problemas e os mesmo governos, com suas negligencias contra as nossas vidas e das comunidades escolares.

Se queremos derrotar a imposição insegura das aulas presenciais, exigir vacina para todos e exigir que as comunidades escolares decidam como e quanto retornar de forma segura é preciso juntar forças e fazer uma grande campanha pública para que também as famílias estejam do nosso lado.

Que a Apeoesp, Sinpeem e os demais sindicatos organizem já reuniões virtuais para debater e deliberar ações conjuntas das greves. Quem nos divide são os governos, para nós não. Somos uma só categoria em um só combate por nossas vidas e condições seguras para que nossos alunos possam retornar às escolas em segurança, esse é o nosso maior objetivo.

Por um polo antiburocrático de unidade das oposições da Apeoesp!

É fundamental sempre ressaltar e relembrar do histórico de luta dos professores. Uma categoria que por diversas vezes mostrou ser um ativo importante contra os ataques dos governos. Foi assim, por exemplo, na luta contra as reformas da previdência regionais e federal. E como não poderia deixar de ser, é uma categoria que conta também com uma vanguarda de lutadores indispensável, que se enfrenta com o governo, mas que também se choca com as direções sindicais que aparatam e burocratizam os sindicatos.

Não é menos relevante a existência de diversas agrupações e correntes políticas de oposição dentro da Apeoesp, que precisa se embandeirar dessa perspectiva e sentimentos dos professores da categoria.

Infelizmente, o que vemos é o oposto disso, com as oposições se adaptando à forma de atuação da direção majoritária do sindicato, se limitando a discordar de um ou outro ponto menor da orientação de Bebel e cia.

Se é verdade que a oposição quer fomentar a mobilização e derrotar Doria e Rossieli, precisa começar exigindo que cada subsede organize os professores e as comunidades escolares de cada região e garantir a maior participação da base e dos professores possível, além de batalhar pela a unidade com outras redes de ensino e categorias, como os municipais em greve.

É esse chamado que fazemos a todas as correntes de oposição do sindicato, bem como aos ativistas e professores, organizando um polo de todos aqueles que querem impedir que o isolamento da greve de professores estaduais e de seus participantes se aprofunde, e é isso que significa a linha de Bebel Noronha e a direção do PT e PCdoB da Apeoesp.

Construindo um polo antiburocratico que batalhe pela unificação e coordenação das lutas da educação, em conjunto com a comunidade escola, bem como a mais ampla democracia no sindicato, podemos reverter a situação difícil que estamos e impedir o corte de salário dos professores em greve.

Se a nossa greve se expande, batalhando pela mais ampla democracia no sindicato, a categoria de conjunto pode retomar a consciência de sua força e assim, pode assim derrotar o governo, barrando o retorno inseguro e assegurar vida da população.




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