×

TRAGÉDIA MÃE LUIZA | O que o déficit habitacional de Natal tem a ver com a explosão em Mãe Luiza?

A explosão de um botijão de gás que vitimou quatro pessoas no bairro de Mãe Luiza em Natal é uma verdadeira tragédia. E como toda tragédia, por mais natural ou inevitável que pareça, é necessário se questionar: como foi possível?

Ítalo GimenesMestre em Ciências Sociais e militante da Faísca na UFRN

quarta-feira 10 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Foto: Sérgio Henrique Santos/Inter TV Cabugi

5 casas caíram na explosão, soterrando Maria Teresa Cristina de 49 anos, sua filha Taís Silva de Oliveira de 18 anos, Maria das Graças Idelfonso de 57 anos e Maria Luiza Belarmino de 44 anos. Que fique expressa a solidariedade do Esquerda Diário aos familiares e amigos das vítimas, e que não aceitamos as lágrimas de crocodilo do prefeito Álvaro Dias (PSDB), pois suas digitais estão em cada pedaço de escombro dessa tragédia.

Segundo o Corpo de Bombeiros, as casas eram em edificações compartimentadas e o Instituto Técnico-Científico de Perícia (Itep), ainda não deram seu parecer sobre as condições estruturais do prédio. Familiares das vítimas explicaram que a estrutura dividia duas casas no andar superior e duas no andar inferior. Ambas desabaram por completo, e a casa vizinha também sofreu impacto da pra explosão. O casal que morava na casa vizinha, de 51 e 60 anos, foi resgatado dos escombros, e passa bem.

Não seria a primeira nem a maior tragédia que ocorreu no bairro de Mãe Luiza. Em 2014 foi o ano em que um deslizamento de terra na rua Guanabara destruiu 85 casas e deixou 185 famílias desabrigadas, após uma tubulação de água romper em função das chuvas. É onde foi construída a famosa escadaria de Mãe Luiza, mas que para muitos moradores de segue sendo uma cicatriz na memória. Foram anos até que as famílias fossem reparadas e reabrigadas.

Essas tragédias não são meros acidentes ou causados por condições naturais. Não é natural que uma explosão de um botijão de gás, em 2021, cause tamanho estrago e perdas, assim como a tragédia em 2014 não foi resultado das chuvas.

Mãe Luíza é bairro símbolo do grave problema habitacional de Natal em contraste com a ganância dos donos das grandes construtoras e da rede hoteleira.

Segundo dados de 2019, 50% dos bairros de Natal não tem acesso a saneamento, 23% não tem acesso a água tratada, e enquanto 70 mil famílias vivem desabrigadas, são 30 mil móveis abandonados, segundo declaração da Secretaria Municipal de Habitação em dezembro de 2020. Ao mesmo tempo, todos os anos famílias perdem suas casas e pertences por conta das chuvas na Zona Oeste e Zona Norte.

Não atoa bairros como Mãe Luiza, Dix-Sept Rosado, Rocas, Felipe Camarão e outras periferias a letalidade do COVID-19 é quase o dobro da média nacional. Bairros de maioria pobre e negra, onde habitam os setores mais precários da classe trabalhadora natalense, e cuja estrutura sanitária e habitacional é precária, com famílias morando amontoadas. Basta um botijão, uma chuva, para essa situação explodir tragicamente na cara de todos nós.

A tragédia contrasta com a iniciativa do prefeito Álvaro Dias (PSDB) de revisar o Plano Diretor para favorecer a verticalização da orla da cidade, avançar sobre áreas de proteção socioambiental, a paisagem urbana, priorizando o lucro dos donos de redes hoteleiras e de grandes construtoras, interessadas no turismo dessa parte da cidade. O projeto busca autorizar edificações sobre as Áreas Especiais Costeira e Estuarina, formada pela orla marítima e pelo estuário entre os rios Potengi e Jundiaí. A área compreende os bairros de Ponta Negra, Areia Preta, Praia do Meio, Santos Reis, Via Costeira e Mãe Luiza.

A solidariedade às famílias por parte do prefeito são lágrimas de crocodilo, pois ele, junto a Carlos Eduardo, e toda a corja de representantes das oligarquias e dos empresários da cidade, deixam digitais na tragédia desse fim de semana. O que Álvaro Dias e o seu conselho de empresários do Concidade não se preocupam é com o problema urbano dos moradores de Mãe Luiza. O Concidade não é um conselho que pode representar os interesses da maioria trabalhadora de Natal, não à toa o caráter profundamente anti-democrático na sua composição e eleição, que chegou inclusive a excluir a disputa do MLB do pleito. Os moradores de Mãe Luiza são trabalhadores, muitos no setor de turismo como informais, e que essa proposta de Plano Diretor ameaça a própria habitação dessas pessoas com a pressão da especulação imobiliária que crescerá sobre o teto que dormem.

Para impedir essa situação, não podemos nos limitar a disputar cadeiras em um conselho de cartas marcadas, pró-empresarial, mas batalhar para barrar a discussão do Plano Diretor e impor pela nossa luta um verdadeiro plano de obras públicas que envolva as organizações de bairro, locais de trabalho, junto às escolas e universidades que possam atacar a falta de moradia, saneamento e estrutura urbana de Natal. É parte da batalha para criar organismos de decisão democrática das massas em cada lugar de trabalho, estudo e moradia, a força das mulheres, negros e LGBTs trabalhadores, os únicos que podem conduzir uma verdadeira Reforma Urbana sob controle dos trabalhadores e setores populares.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias