×

EFEITOS DA CRISE | O avanço da crise econômica e as consequências psicológicas

sábado 23 de abril de 2016 | Edição do dia

Na última sexta, a revista Valor Econômico elaborou sobre como a crise econômica causa danos psicológicos à população em geral, como foi nos EUA depois da crise de 29, com a Grande Depressão. Reflexos da crise como queda nos rendimentos, inflação nos produtos básicos, aumento de tarifas de serviço público e desemprego afetam também a subjetividade do brasileiro.

Isso acontece em muitos níveis, desde engenheiros que dirigem a produção na fábrica e são demitidos, até a juventude “nem nem”, jovens que não estudam e nem trabalham, não porque não o querem fazer, mas porque não conseguem arranjar trabalho nem se manter estudando diante da própria falta de emprego. A própria OMS (Organização Mundial da Saúde) constatou que a crise econômica afeta os ânimos de uma nação.

A onda de transtornos psicológicos pode ser verificada também em outros países, afinal a crise atinge todo o globo. Na Grécia, 12% da população apresenta algum tipo de transtorno, enquanto que no começo da crise, em 2008, eram apenas 3%, segundo dados da Valor. Na Espanha, quando o desemprego alcançou 25% da população, os transtornos psicológicos chegaram em 44% e, dessa porcentagem, a maioria era jovem. Esses dados podem identificar as consequências das intervenções imperialistas nos países semicoloniais, como no caso da Grécia e até mesmo o Brasil, onde as demissões na indústria, arrocho salarial e falta de pagamento são aspectos concretos, materiais, e que afetam diretamente o âmbito pessoal da classe trabalhadora e da juventude desses países.

Na juventude, as consequências são mesmo mais arrebatadoras, por não terem vivido outra crise além dessa, mas também porque muitos dos jovens tomaram consciência econômica em meio a essa crise que vem desde 2008. É uma juventude que se tornou jovem já na decadência do lulismo, no caso do Brasil. São jovens que estão vendo os programas sociais e a ascensão social dos anos de PT caindo por terra, primeiro com o aumento da precarização do trabalho, como a triplicação do serviço terceirizado, e depois, com os quase 20% de desemprego. Filhos da rotatividade, os “millennials”, os que nasceram entre a década de 80 e meados da década de 90 segundo a Consumoteca (empresa de pesquisa de mercado), enfrentam um aumento de 5% para 13% de desemprego, uma queda de 55% para 44% de carteira assinada e de 19% para 14% na frequência escolar.

Nesse fundo de crise, as causas de transtorno psicológico também se ramificam, até porque, no fim das contas, o choque é material, concreto, mas também subjetivo. “Há uma tendência de atribuir à própria pessoa a culpa por sua situação. A sociedade produz um discurso perverso de que se está desempregado por incapacidade, desqualificação ou falta de iniciativa”, diz Marcelo Afonso Ribeiro, professor do Instituto de Psicologia da PUC-SP. É uma lógica do capitalismo que impõe um individualismo, é meritocrático. Como se a crise pessoal, os transtornos, e sua demissão ou desemprego fosse sua culpa, e não se faz uma análise de que estamos em tempos sombrios, em que acontecem demissões em massa e precisamos caçar empregos.

Além disso, para os que ainda estão empregados, o assédio moral é um fator fundamental na causa dos transtornos psicológicos, aquela ameaça sofrida entre quatro paredes por parte do seu chefe para que haja uma sujeição a determinadas condições de trabalho, e mesmo assédio sexual, que inclusive correspondem a crime. Até por isso vemos que a taxa de desemprego na população feminina é de 7,9%, e, entre mulheres negras, de 9%. As mulheres são as mais atingidas nos cortes, pelo fato de que podem engravidar e ainda tem possibilidade de largar o emprego para cuidar de filhos, por exemplo.

A saída não pode ser capitalista

E, quando discutimos essa situação de transtornos causados pela crise, no âmbito da indústria farmacêutica vemos dados alarmantes: segundo a IMS Health, entre março de 2015 e fevereiro de 2016, a unidade de antidepressivos e de estabilizadores de humor aumentou de 12,6%, que corresponde 55,9 milhões e os calmantes subiram para 3,1%, que corresponde a 10,2 milhões de unidades.

No entanto, diferente da solução que a revista Valor e o presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia, Ricardo Gorayeb, propõem, não é o esforço para sobreviver à crise que vai nos curar dos transtornos, porque isso não combate a raiz da causa - a crise econômica. Precisamos alçar o sujeito da luta, só ele poderá arrancar a raiz da crise capitalista que nos afronta de tempos em tempos. Não é a indústria farmacêutica ou as alternativas capitalistas, de tratamento psicológico para realojar o exército de reserva, os desempregados, que vão acabar com a baixa autoestima e depressão do brasileiro, da classe trabalhadora e da juventude.

Não é à toa que, no fim do século XX, pode-se notar um aumento exponencial de diagnósticos de transtornos psicológicos através do aumento dos lucros da indústria farmacêutica e referente à psiquiatria. É um tratamento que anula o sujeito e priva-o de entender profundamente o que significa o seu sofrimento para colocá-lo no papel do consumidor.

A Valor diz: “a regra de ouro é não se deixar levar pelo pessimismo exagerado”. Gorayeb diz: “A pessoa não pode se dar por vencida. O mundo não acabou”. Estamos certos de que o mundo não acabou e de que não podemos deixar nossa moral ser devastada pela crise capitalista, ou se adaptar à falta de emprego, mas se tem algum sujeito que pode botar fim às crises cíclicas do capitalismo e aos transtornos consequentes dela é quem sofre diretamente com esse sistema: a classe trabalhadora.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias