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COPA DO MUNDO | Novos hinos da seleção fogem do patriotismo e buscam heróis: espelho da situação política

Novas canções da torcida, o vazio patriótico e a busca pelo herói da seleção. O que dizem sobre o momento político no país?

Ítalo GimenesMestre em Ciências Sociais e militante da Faísca na UFRN

sexta-feira 22 de junho de 2018 | Edição do dia

(Foto: André Durão / GLOBOESPORTE.COM)

Os gritos de “sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”, tradicional das torcidas ao longo dos anos, aparentemente não atinge mais o mesmo clamor. Alguns torcedores na Rússia se organizaram para tentar novos ritmos que correspondessem com o sentimento de época dos brasileiros em um momento de deterioração das condições de vida dos trabalhadores e do povo pobre combinado com desesperança política, em um ano de eleições incertas.

Tempos de crise na hegemonia política da classe dominante, sem um projeto claro de país como foram os anos de conciliação petista, marcados pelo mito de que "todos ganham" até o capitalismo entrar em crise e ter que se salvar às custas das condições de vida da população. Esse momento de vazio, "em que no novo ainda não terminou de nascer", dita oscilações nas formas de sentir e pensar da população como um todo.

Certamente não são tempos favoráveis para algum patriotismo, orgulho nacional, quando tudo parece estar perdido, sem rumo certo. Alimento para crenças em soluções vindas de mártires e heróis nacionais, cuja ausência no campo político expressa-se na aposta de soluções radicais, como tem sido o apoio ao ultra-reacionário Bolsonaro, sem necessariamente seu corresponde radical à esquerda, que até o momento não soube oferecer mais que velhas soluções conciliadoras e reformistas.

Mas parece que o futebol, ou pelo menos no maior evento esportivo do ano, a Copa do Mundo, também pode ajudar a entender como sente setores amplos da população. No lugar de canções que expressam o “orgulho nacional”, setores da mídia tem tentado emplacar uma nova canção que os torcedores na Russia criaram. Uma torcida pouco representativa, marcada pelos ricos brancos que tiveram condições de pagar uma fortuna para presenciar o grande evento.

Observe qual o valor nacional presente na letra.

ÔÔÔÔ BRASIL OLÊ OLÊ OLÊÊÊÊ (4x) /
Ôôôôôô 58 foi Pelé /
Em meia dois foi o Mané/
Em sete zero o Esquadrão/
Primeiro a ser tricampeão/
Ôôôôôô 94 Romário /
2002 Fenômeno/
Primeiro tetracampeão/
Único pentacampeão/
ÔÔÔÔ BRASIL OLÊ OLÊ OLÊÊÊÊ (4x)

Com o maior destaque nas capas de jornais e nos portais, Globo e outros meios de comunicação de massa se esforçam, sem grande sucesso, gerar uma militância mais ativa em terras nacionais para o time lá fora.

A exaltação de ícones, heróis de seus tempos, corresponde com a esperança coletiva em quem vai salvar a pátria. Quem será em 2018 o salvador da seleção, que trará o hexa, será Neymar como a Globo e outros meios tem tentado emplacar? Suas sucessivas quedas de popularidade abrem caminho para o jovem Coutinho, que nas redes começa a ganhar as publicações esperançosas daqueles que acompanham os penosos resultados do time brasileiro. Um espelho da tensão por soluções bonapartistas no país, como o exemplo de um judiciário autoritário que tenta, sem o sucesso prometido, dar uma resposta real para a corrupção.

Já mostramos em outro texto a falta de interesse pelos jogos, apesar da alta expectativa com Tite e a conformação dada como uma das favoritas à taça. Um número histórico, maior do que no ano dos protestos “Não vai ter Copa”, em 2014, que expressa um rechaço nacional mais apático, ainda que bastante atento ao que acontece no país. O que não deixa de espelhar a oscilação das formas de sentir de amplos setores que vive a deterioração do emprego, dos salários, da saúde, da educação, mas também a arbitrariedade das instituições e partidos políticos, acompanhada de uma economia cada vez menos otimista.

Não tem sido fácil emplacar o novo hino que mova um sentimento massivo em apoio ao time brasileiro, tampouco um desempenho ou um novo craque que cative as esperanças e o otimismo com o país na Copa.

Ainda há desdobramentos e disputas colocadas, até mesmo após o pleito de outubro, passado a euforia dos jogos. Há ainda o espaço para que o herói corresponda ao espelho invertido dessa situação de miséria e desesperança, e que não seja uma figura eleitoral como Lula ou Bolsonaro, mas um sujeito coletivo histórico, os trabalhadores, capazes das transformações mais radicais se sua auto-organização se dá objetivos corretos com um programa contra toda forma de opressão e exploração.




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