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ENTREVISTA: EDIÇÕES ISKRA | ’Nosso objetivo é colocar o marxismo nas mãos dos trabalhadores’

Entre os dias 24 a 26 de setembro ocorrerá em São Paulo o I Salão do Livro Político, evento que reunirá 16 editoras que trarão ao público títulos com descontos sobre temas de sociologia, política, luta de classes etc., além de uma programação cultural que incluí debates e saraus.
Entrevistamos Natália Angyalossy e Fernando Pardal, das Edições Iskra, sobre seu trabalho editorial e o a importância desse evento.

terça-feira 22 de setembro de 2015 | 10:33

Esquerda Diário: Falem um pouco sobre as Edições Iskra. O que é a editora?

Natália Angyalossy: Nós começamos nosso trabalho editorial há cerca de oito anos, com a edição pioneira no Brasil do livro A Revolução de Outubro, de León Trotski, em parceria com a Boitempo Editorial. Essa primeira publicação diz bastante sobre o que somos e quais são nossos objetivos: consideramos que a teoria revolucionária é um aspecto fundamental para a esquerda, para os trabalhadores que sentem a necessidade de se organizar politicamente para lutar contra a exploração que sofrem cotidianamente.

Fernando Pardal: Sim, e por isso é importante ressaltar que o trabalho da Iskra não visa somente um projeto editorial: nosso objetivo é colocar o marxismo, a sua atualidade e suas ideias, nas mãos de quem ele realmente pertence: os trabalhadores, a juventude, os negros, as mulheres, os LGBTs. Desde seu início, o marxismo sempre foi uma teoria cuja finalidade é a de transformar o mundo, e por isso a Iskra, como editora ligada ao Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), tem como meta ajudar nessa fusão entre classe trabalhadora e marxismo.

ED: E qual a importância desse trabalho no contexto brasileiro?

FP: No Brasil, há uma dívida histórica da esquerda com a teoria revolucionária. Ainda que tenham existido iniciativas importantes de edições, o que prima entre a esquerda é uma tradição de um relativo desprezo pela teoria, que no plano político se expressa como uma separação entre atuação sindical corporativista e reformista, por um lado, e atuação eleitoral parlamentar sem procurar colocar a classe trabalhadora como sujeito político, por outro.

NA: Essa tradição de que falou Pardal é um obstáculo para o surgimento de uma organização revolucionária de trabalhadores no Brasil. O PT, por exemplo, foi uma organização de massas, fruto de um ascenso importante de greves operárias, mas que historicamente levou os trabalhadores a um beco sem saída, acabou traindo a classe que o construiu e virando mais um partido a defender a ordem burguesa, e hoje aplica os ajustes dos capitalistas. Isso, em grande medida, se deu por essa estratégica equivocada; sua superação só pode se dar com base em um sólido embasamento na teoria revolucionária.

ED: Vocês podem contar um pouco como, ao longo desses anos, a Iskra trabalhou nesse sentido?

NA: Um dos focos em que nos concentramos é no resgate dos clássicos de nossa tradição revolucionária, em particular nos debruçamos sobre o legado de Leon Trotski, que, como dirigente da primeira revolução operária vitoriosa, e como continuador do legado de Marx e de Lênin, travou um combate teórico fundamental contra a reação ideológica no seio do movimento de trabalhadores que foi representada pelo stalinismo. Por isso, editamos alguns materiais inéditos de Trotski no Brasil, como uma compilação de seus Escritos Latinoamericanos, que correspondem ao período em que esteve exilado no México e refletiu de maneira muito profunda sobre a situação política particular de nossa região, mas sem deixar de compreendê-la no contexto que antecede a Segunda Guerra Mundial, com uma visão marxista que se contrapõe às análises burguesas, mas também àquelas análises de raiz stalinista, como a do historiador Eric Hobsbawn, que viram a segunda guerra como um conflito dos “campos” democrático e fascista, eliminando de sua análise o fator fundamental das classes.

FP: Entre outros textos inéditos de Trotski, editamos também seus escritos sobre A Revolução Espanhola, em que surge no centro do debate um dos mais apaixonantes e profundos processos revolucionários até hoje vistos. Nesse complexo cenário, Trotski batalhou desde os primeiros dias por uma alternativa revolucionária, que pudesse se contrapor aos anarquistas – que capitularam vergonhosamente à burguesia “republicana” – e ao stalinismo, que cumpriu um papel diretamente contra-revolucionário, assassinando os operários e entregando o poder nas mãos de Franco. A importância das lições desse livro não pode ser subestimada.

ED: Então o papel que a Iskra vem cumprindo é de editar os clássicos marxistas?

NA: Não apenas esse. Consideramos de grande importância seguir os passos da teoria legada pelos clássicos e falar sobre as lutas e questões de hoje; também temos dedicado esforços a elaborar sobre Brasil. Um importante exemplo é o livro Marxismo, Questão Negra e Classe Operária no Brasil. Este livro trata de aspectos da formação do estado brasileiro e coloca no centro a luta do povo negro, ao mesmo tempo em que realiza um debate de estratégias com a esquerda, em especial o antigo PCB, à luz do golpe de 1964.

Outro trabalho central da Iskra tem sido a coleção Iskra Mulher, na qual publicamos, em primeiro lugar, o livro Pão e Rosas, escrito pela dirigente do nosso partido irmão na Argentina, o Partido de Trabalhadores Socialistas (PTS), que foi também fundadora do grupo de mulheres Pão e Rosas naquele país, que hoje está também no Brasil e em diversos países da América Latina, e começa a surgir na Europa, em países como Espanha. Esse livro trata da luta das mulheres pelos seus direitos, procurando retraçar essa luta desde as primeiras organizações feministas até os dias de hoje, e discutindo quais as distintas estratégias para a emancipação das mulheres. Em breve lançaremos uma nova edição dessa publicação. Também editamos o livro Lutadoras, no qual fazemos um resgate histórico de diversas lutadoras que dedicaram suas vidas a lutar contra a exploração e opressão do capitalismo.

E dentro dessa coleção também publicamos o livro A precarização tem rosto de mulher, que foi escrito pela dirigente do MRT e fundadora do Pão e Rosas Brasil, Diana Assunção, com base em entrevistas realizadas com nossa camarada Silvana Ramos. Ele fala sobre a importante luta das trabalhadoras terceirizadas na USP em 2005, na qual Silvana cumpriu um papel dirigente, na “linha de frente” da batalha contra a reitoria e a empresa Dima. Esse livro, temos orgulho de dizer, foi uma contribuição concreta para a luta que novamente as terceirizadas da USP travaram em 2011, contra a empresa União, na qual triunfaram. Essa experiência foi incluída na segunda edição do livro. E, ainda mais recentemente, em nova parceria com a Boitempo, publicamos em português o importante estudo da historiadora americana Wendy Goldman, Mulher, Estado e Revolução, que trata da relação entre o Estado revolucionário russo e a questão da luta das mulheres.

FP: Há uma questão fundamental nessas edições: a atualidade do marxismo e de sua teoria não está em formulações puramente acadêmicas, mas na relação da teoria com a luta cotidiana para criar organizações revolucionárias de trabalhadores. O PTS argentino, que hoje encabeça a extraordinária experiência da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), demonstra na prática como a sua luta teórica em relação à questão das mulheres está completamente associada a uma atuação concreta na luta de classes. Isso ficou claro, por exemplo, nas suas listas eleitorais, que na cidade de Buenos Aires chegou a uma composição de 70% de mulheres entre as candidatas. Por sua vez, o MRT aqui no Brasil pôde dar seu pequeno exemplo, e ao procurar tirar as lições das greves operárias das quais participamos, pudemos generalizar essas lições para contribuir para novos triunfos dos trabalhadores, como no caso das lutas de terceirizados da USP. Isso sintetiza bem a importância de uma editora como a Iskra.

ED: E quais as perspectivas para o futuro?

FP: Bom, nessa semana participaremos do I Salão do Livro Político, uma importante iniciativa de diversas editoras para colocar em primeiro plano a discussão da teoria, da estratégia política. Participaremos com nossos livros, mas também nas mesas de debate contaremos com camaradas debatendo as questões políticas atuais. Consideramos que esse salão é um momento fundamental, um novo impulso para a produção editorial de esquerda e, particularmente, para nossa ainda pequena editora.

NA: Também estamos com novas edições em vista, sendo a primeira para o 20 de novembro, dia da consciência negra, trazendo uma compilação de textos de revolucionários discutindo a questão negra e a luta contra o racismo na perspectiva marxista. Também estamos trabalhando na segunda edição do Pão e Rosas, como foi dito. Também lançaremos, em parceria com a Boitempo, o livro da pioneira Mary Wollstonecraft, Reivindicação dos Direitos da Mulher. E em breve lançaremos também uma contribuição de nosso camarada Iuri Tonelo sobre o conceito de crise em Marx, desenvolvida como dissertação de mestrado sob orientação de Ricardo Antunes.

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