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Nahuel Moreno (1924-1987)

sexta-feira 27 de janeiro de 2017 | Edição do dia

Completam-se 30 anos do falecimento do reconhecido dirigente trotskista argentino que construiu em seus longos anos de militância uma das mais importantes correntes que se reivindicou da IV Internacional.

Nahuel Moreno foi o pseudônimo de um dos líderes trotskistas mais conhecidas na Argentina, América Latina e, em menor medida, no mundo. Nascido em Alberdi (Buenos Aires) em 24 de abril de 1924. Seu nome de nascimento era Hugo Miguel Bressano Capacete. Ele morreu aos 62 anos em Buenos Aires, quando o MAS (Movimento ao Socialismo) se fazia conhecido como o maior partido da esquerda argentina.

A Fração Trotskista, corrente internacional que o Movimento Revolucionário de Trabalhadores integra junto ao PTS argentino, provém do que foi a corrente internacional de Nahuel Moreno. Ao longo de sua história foram feitas definições importantes que lhe permitiram recuperar e, por sua vez profundamente criticar as políticas e pontos de vista de Moreno. Aqui, tento dar meu ponto de vista de alguns deles.

Suas primeiras experiências no Trotskismo argentino

Em sua juventude, foi ganho ao trotskismo por um trabalhador marítimo, em seguida, somou-se ao grupo fundado por Liborio Justo. Leon Trotsky já havia morrido. Na Argentina (como em muitos países) grupos trotskistas surgiram como rupturas do Partido Comunista, com a Oposição de Esquerda Internacional liderada por Trotsky em 1929.

Em 1944, Moreno fundou seu próprio grupo, o GOM (Grupo Obrero Marxista) que buscava principalmente atingir o movimento operário. Para isso, ele virou-se para uma das áreas com maior concentração de trabalhadores, o sul da Grande Buenos Aires, especialmente Avellaneda. Em janeiro de 1945 participaram na greve de mais de 15.000 trabalhadores do frigorífero Anglo-Ciabasa. Aconselhados por Mateo Fossa (líder que havia se encontrado com Trotsky), aproximaram-se participando do fundo de greve, oferecendo o seu apoio. A greve foi derrotada. Mas esta experiência permitiu-lhes presidir o el Club de Corazones Unidos de Villa Pobladora.

Moreno em sua juventude

A Segunda Guerra Mundial havia terminado e a Quarta Internacional fundada por Trotsky, depois de perseguidos e dizimados, tanto pelo imperialismo fascista como "democrático" e pelo estalinismo, encontrava-se em situação muito débil. Grupos na América Latina estavam dispersos. O trotskismo do pós-guerra lutou contra a corrente, uma vez que o stalinismo saiu fortalecido ao fim da guerra e no mundo dos acordos de Yalta e Potsdam da URSS, EUA e Grã-Bretanha e da "Guerra Fria". Foi também a época do surgimento do peronismo na Argentina, fenômeno burguês que influenciou a classe trabalhadora.

Em 1946, o GOM de Moreno publica o periódico Frente Proletária. Outros grupos que se reivindicavam trotskistas do período foram o GCI (Posadas) e outubro (Abelardo Ramos). Estes grupos contavam com certa literatura de Trotsky e algumas cópias de Clave (revista publicada pela IV internacional do México para a América Latina). Houveram discussões importantes sobre a interpretação do desenvolvimento da revolução permanente nos países semicoloniais como Brasil ou Argentina, sobre a necessidade de levantar reivindicações democráticas como libertação nacional na perspectiva da revolução socialista, a categoria de "nacionalismo burguês" feita por Trotsky em 1938 contra o governo de Cardenas, o caráter do peronismo. Moreno chamou estes grupos de “trotskismo de café” (a maioria discutia no Café Tortoni). No entanto, estas discussões eram essenciais, não meramente teóricas. Moreno reconhece que custou-lhes interpretar o fenômeno do peronismo, e foi só em 1948 no II Congresso da IV onde eles conseguiram. O internacionalismo foi essencial para isso, diria ele anos mais tarde.

Sua aproximação da IV internacional

O Segundo Congresso da Quarta Internacional ocorreu em Paris. Os líderes proeminentes da momento eram Michel Raptis (Pablo), Healy e Hunter (Grã-Bretanha), Mandel (Bélgica), Maitan (Itália), Lambert (França), Peng (China) e do SWP dos EUA (o mais importante da época), Cannon, Hansen, Farrel Dobbs e Novack. Moreno participa pela primeira vez numa reunião da Internacional como delegado. Neste congresso um novo fenômeno como a Jugoslávia foi discutido. A corrente que mais influenciou Moreno foi o SWP norte-americano, especialmente, Hansen e Cannon líderes, a quem considerava seus professores. Deles reivindicou seu trabalho no movimento operário. Trotsky considerou que este partido iria se tornar a direção da Quarta Internacional (infelizmente após a revolução cubana capitulou ao castrismo).Em 1949 Moreno fundou o POR. Com Vasco Bengochea, Ernesto González e Horacio Lagar formarão a equipe de liderança do partido e a publicação Palabra Obrera que conseguirá alcance no movimento dos trabalhadores metalúrgicos.

Na revolução boliviana de 1952, onde o POR ligado ao Pablo na Internacional teve um papel importante, Moreno tomou uma posição correta ao levantar "Todo o poder à COB", já que era uma coordenação de sindicatos que reunia o conjunto da vanguarda e era a única que poderia tomar o poder. A orientação pablista levou que o POR capitulasse ao MNR, uma organização burguesa, sem exigir que a COB tomasse o poder. A revolução foi derrotada.

Moreno chamou a enfrentar o golpe gorila de 55. Logo veio a experiência do movimento operário na Resistência, com o peronismo proscrito, onde praticou uma política de "entrismo" principalmente nas 62 organizações, mas acabou adaptando-se a direção do peronismo. O Palabra Obrera levantou o slogan "sob a disciplina do general Perón e o Conselho Superior peronista". Durante este período, teve um desvio sindicalista que levou a ruptura de Fucito, a equipe de direção.

A influência da Revolução Cubana

Em janeiro de 1959 a revolução cubana, o ascenso do castrismo e o próprio Che Guevara adquiriram uma forte repercussão na América Latina, sobretudo no movimento estudantil, surgindo inúmeras correntes guerrilheiras que acreditavam que o campesinato era o sujeito da revolução, com partidos exércitos que lutariam em montanhas e campos ou realizariam nas cidades “ações exemplares” que supostamente seriam seguidas pelo povo. Moreno não ficou por fora desta pressão, caracterizando que Cuba havia se convertido em um Estado operário (depois acrescentaria burocrático), mas definiu equivocadamente a Castro e Guevara como as direções revolucionárias do continente, especialmente com a constituição das OLAS (Organização Latinoamericana de Solidariedade). Este desvio em 1962 levará a ruptura de outro membro importante da equipe de direção, Ángel (el Vasco) Bengochea. Assim terminava de romper a equipe de direção do Palabra Obrera, entre o sindicalismo e o guerrilheirismo. Anos depois, fazendo um balanço geral, Moreno se lamentará frente a saída destes dirigentes perguntando se havia feito o suficiente para mantê-los. Publicou “Dois métodos frente a revolução latino-americana” polemizando com Che, mas sua batalha contra essa pressão não foi suficiente para manter a antiga equipe de direção. A maioria das direções que se reivindicavam trotskistas, sucumbiram as pressões guerrilheiras, começando por quem dirigia o agrupamento mais importante do momento, o SU de Mandel. Também o fez o SWP norte americano. Outros grupos menores, seguiam defendendo que Cuba nunca se transformou em um Estado Operário.

Quanto ao entrismo “... os avanços do peronismo na integração cada vez maio ao regime levou que o Palabra Obrera repensa-se a tática que havia seguido até então. No final de 1963 começou a mudança com o chamado de frente única revolucionária destinada a criar um ’Partido Único da Revolução’. Como produto dessa orientação, se avançou na formação do Partido Unificado FRIP-Palabra Obrera em janeiro de 1965. Estes dois eventos marcaram o fim da nossa táticas entrista, para além disso por um tempo a seguimos considerando parte do movimento. " (E. González, El trotskimo obrero e internacionalista en la Argentina, tomo 3 vol 2, p. 51). Desta fusão com os irmãos Santucho surgiu o PRT. Antes do IV Congresso do PRT, Santucho decide prosseguir a luta armada. A partir daí, a ruptura ocorre: Moreno vai liderar a PRT (La Verdad) e Santucho o PRT (O combatente).

Moreno com sua primeira companheira Rita e seus dois filhos

O ascenso revolucionário de1969-1976

Depois da ruptura com Santucho Moreno retorna às formulações mais clássicas do trotskismo e busca uma maior inserção no movimento operário, posicionando-se corretamente frente ao ascenso emergiu a partir do Maio Francês. Mas sua política anterior não permitiu chegar com um partido de quadros formados teórica e praticamente no Trotskismo, nem com uma inserção no movimento operário que permitiria desenvolver um partido revolucionários para o momento chave da luta de classes na Argentina, o período de 1969-1976. Não havia nenhum militante do PRT (La Verdad) durante o Cordobazo. Posteriormente enviou dirigentes e quadros que ganharam operários do SITRAC-SITRAM como José Páez.

Em 1972, fundiu-se com uma pequena corrente do PS que girava à esquerda dirigida por Juan Carlos Coral. Com ele fundou o PST e disputaram às eleições de 1973 com a fórmula Coral-Paez. Levantaram corretamente candidaturas operárias com a consigna “trabalhador vota em trabalhador”. O PST também deu uma luta correta ao defender uma Coordenação Sindical Nacional no plenário de Villa Constitución em 1974. Mas frente a ofensiva patronal e o giro a direita do peronismo que impulsionava grupos fascistas da Triple A (a que assassinou a 16 companheiros do PST), levou a um novo desvio oportunista do Moreno e o PST. Ao invés de chamar a fortalecer a frente única operária e formar comitês de autodefesa para enfrentar estes ataques se uniu ao Grupo dos 8 (UCR, PC, PI, PRC, PSP, Udelpa) privilegiando uma “frente democrática”. Durante o “Rodrigazo”, as jornadas de junho e julho de 1975 caracterizou corretamente o ascenso operário e a tendência as ações independentes destes.

O golpe de 76 levou o PST a clandestinidade. Durante esses anos 100 militantes foram assassinados ou desaparecidos. Continuou publicando uma imprensa ilegal e uma revista internacional. Teve uma politica correta frente a revolução portuguesa de 1974 e o ascenso polaco de 1981. Esse processo foi desviado com a ajuda chave da Igreja Católica. Foi o último ascenso revolucionário aberto em 1968 e abriu portas ao chamado “neoliberalismo” comandado por Reagan, Thatcher e João Paulo II. Em 982 Moreno funda a Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT) a que reivindica como “a” IV Internacional.

A Brigada Simón Bolivar formada por Moreno para apoiar a revolução nicaraguense.

A revisão do Trotskismo na teoria e na prática

Após as “transições democráticas” aplicadas especialmente em Portugal e Espanha, ressurgiram os sociais-democratas do PSOE espanhol e do PS francês de Miterrand ganhando as eleições em seus países. Após haver apoiado todos os golpes militares na América latina, os Estados Unidos começou a aplicar “transições” nas suas semicolônias. Este foi o caso da Argentina, após a derrota da guerra das Malvinas e a crise militar que desembocou em uma transição pactuada entre a Multipartidaria (PJ, UCR, PI, PC) e um setor dos militares que colocaram o genocida Bignone como transição as eleições de 1983.

A negativa de realizar um balanço critico de sua atuação nos anos revolucionários e das concepções politicas e teóricas que sustentaram levaram o morenismo a um aprofundamento de suas politicas mais conservadoras. Neste caso, capitulou a esta transição, constituindo o Movimento ao Socialismo (buscando imitar o ascenso da social-democracia) em 1982 com a candidatura de Luis Zamora. Serão anos de adaptação ao regime democrático-burguês e de sua maior revisão da teoria da revolução permanente: dirá que frente a uma ditadura estava colocado fazer frente, inclusive com forças burguesas, para derrota-la e que esta dinâmica levaria a luta pelo socialismo. A esta concepção, os trotskistas a chamamos de etapista ou semietapista similar a que defenderam os mencheviques durante a Revolução Russa e os estalinistas depois, levando a derrotas de grandes processos revolucionários. Esta revisão se encontra elaborada em seu “Escola de quadros” de 1984 (Ediciones Crux, 1992)

Frente ao fracasso do MAS nas eleições de 83 (onde os cem locais abertos tiveram que se fechado frente a correnteza alfonsista) voltou a aproximar suas fileiras. Novamente defendeu que o partido devia intervir no movimento operário apostando nas “novas direções” sindicais que surgiam nas eleições contra as burocracias que haviam apoiado a ditadura. Estas novas direções poderiam ser radicais, peronistas, comunistas, socialistas, e o único requisito de unidade do MAS é que fossem “novas” e (relativamente) “combativas”, mas não construiu uma verdadeira corrente militante classista. Este processo terminou objetivamente atrás do ubaldinismo que ajudou a renovação peronista que triunfou nas eleições de 87 contra Alfonsin.
Por outro lado, formou a Frente del Pueblo para disputar as eleições legistlativas de 1985. Era uma aliança com o PC e setores do peronismo (Susana Valle e José Villaflor que provinham do Peronismo de Base). Buscando ganhar setores do peronismo mas sem uma politica de independência de classe. Esta frente se rompeu em 1987 com Moreno já morto.

A concepção Moreno possuía muito objetivismo, ou seja supervalorizava as possibilidade de que o movimento operário romperia com o peronismo girando espontaneamente a esquerda, tendo em conta que o que o empurraria era a crise capitalista. Chegou a fala em “revoluções iminente e generalizadas” sem ter em conta o fator dirigente (ou seja subjetivo). Este fator que foi chave na Revolução Russa de 1917 e que Trotski o remarcou no Programa de Transição, tornou-se ainda mais necessário após o fortalecimento do stalinismo após a segunda guerra mundial eu impediu junto a socialdemocracia o desenvolvimento da auto-organização operária e favoreceu o surgimento de direções guerrilheiras ou nacionalistas burguesas.

Por esse motivo as organizações que Moreno dirigiu e ajudou a construir foram, dentro do trotskismo, centristas, ainda que muitas vezes com políticas mais de esquerda do que das outras correntes importantes que se reivindicavam trotskistas no pós-guerra (o Secretario Unificado de Mandel, a OCI de Lambert, o SWP norte americano). De conjunto cederam frente a estas direções não revolucionárias ou contra revolucionárias e não construíram verdadeiras organizações de combate com a estratégia da tomada de poder pelos trabalhadores que estivessem preparadas para intervir nos ascensos revolucionários para que triunfem e continuem sua luta até a revolução socialista mundial. Mas ao manter-se dentro do trotskismo dera algumas batalhas parciais corretas frente as tendências burguesas, nacionalistas, estalinistas ou pequeno-burguesas. Estas batalhas constituem para nós os “fios de continuidade” com a tradição do marxismo revolucionário de Marx, Engels, Lenin, Trotsky, Rosa Luxemburgo e tantos outros.

Após a morte de Moreno, a direção do MAS, desenvolveu mais traços de colaboração de classes formando a aliança com o PC na Izquierda Unida em 1989. Quando o estalinismo no mudo caia em pedaços, se uniram a eles levantando a formula Vicente-Zamora que levaria o último a ser deputado.

O PTS rompeu com o MAS em maio de 1988, após o ato de Ferro, antes da formação da IU e frente ao V Congresso que afirmava que vinha a Revolução Argentina, mas ao mesmo tempo preparava sua extensa aliança com o estalinismo. A direção do MAS se afirmou no nacional-trotskismo virando a cara aos grandes processos mundiais. Esta, sobretudo, foi uma das causas de sua explosão em 1992, que desemboco na formação do MST e de ouros inúmeros grupos. Não nos reivindicamos morenistas, no sentido que fazem o MST, a Izquierda Socialista ou a Liga Internacional dos Trabalhadores atual, porque pensamos que o essencial de sua herança teórica e política é equivocada. Porém, sem dúvida, acreditamos que sem um balanço critico que resgate os fios de continuidade mantidos por Moreno e outras correntes do movimento trotskista, com maiores ou menores debilidades, haveria sido impossível nossa existência. A FT, e o PTS, não nasceram de um repolho...


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