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POLICIAMENTO USP | Modelo de policiamento japonês pode ser implementado na USP, UNESP e UNICAMP

Odete AssisMestranda em Literatura Brasileira na UFMG

sexta-feira 24 de julho de 2015 | 00:00

Imagem: Leonardo Fernandes

O debate sobre policiamento dentro das Universidades volta a pautar os jornais após um caso de estupro dentro do campus. No dia 15 de junho, uma estudante de economia da USP, de 17 anos, foi estuprada nos arredores da praça do relógio próximo a reitoria. O fato do suspeito não possuir ligação com a universidade é utilizado para reforçar argumentos dados pela reitoria e pela polícia, que o problema é que as pessoas de fora da comunidade universitária freqüentam o campus, e hoje a USP não é mais uma Universidade isolada, e sim parte de São Paulo.

Aumentando cada vez mais a separação entre os membros da comunidade universitária e a população ao redor, como os moradores da São Remo, favela que fica dentro do terreno da USP - separada por um muro. O fato é que a população não ter uma ligação com a universidade, seja culturalmente, ocupando seus espaços com shows, teatro, musica, seja socialmente vendo como um espaço público e dela, ou mesmo e principalmente como espaço de conhecimento, onde todos os jovens, negros, trabalhadores, LGBTs tenham o direito de estudar. Esse distanciamento social da população com a universidade faz dela um espaço vazio, e sujeito as mesmas contradições que existem na sociedade ao seu entorno.

Os casos de estupro e violência sexual, além dos furtos e assaltos dentro dos circulares, coloca a necessidade da reflexão porque hoje a universidade é um espaço vazio e hostil, e não um local de conhecimento, cultura e arte? Uma notícia publicada nessa quarta pelo jornal folha de São Paulo revela que USP, UNESP e UNICAMP pretendem adotar um modelo de policiamento japonês, conhecido como Koban, para responder a questão. O que aparentemente parece uma mudança no foco policial, que se voltaria mais para a prevenção – em vez de se pautar pelo atendimento de ocorrências ou por rondas – é na verdade uma tentativa de legitimar a presença da polícia no campus, e manter as universidades públicas cada vez mais isoladas, fechada para aqueles que não têm acesso ao ensino e conhecimento produzido nela.

Na Cidade Universitária, zona oeste de SP, a Secretaria de Segurança Pública e a USP pretendem adotar o modelo já em setembro. “A companhia já está em fase de treinamento e terá entre 80 e 120 homens”, declarou o secretário Alexandre de Moraes para a Folha. As negociações começaram no início de ano, por meio de um grupo de trabalho coordenado por José Gregori, ex-ministro do governo FHC e presidente da Comissão de Direitos Humanos da USP. A proposta, batizada de USP Segura, ainda precisa ser apresentada aos funcionários e alunos da instituição.

Aumentar o policiamento é uma resposta aos casos de violência?

Para responder essa questão devemos pegar o histórico da polícia militar dentro da USP. A PM entrou na universidade pela primeira vez, desde a ditadura militar, em 2007 na faculdade de direito, a mando de João Grandino Rodas diretor da faculdade na época. O MST havia ocupado a faculdade e chamaram a PM pra desocupar.

A primeira vez que a PM entrou no campus Butantã desde a ditadura foi pra reprimir trabalhadores e estudantes que protestavam contra a Univesp (Universidade Virtual), em 2009. Em 2011,o então reitor Rodas, firmou um convênio com a polícia militar, por conta da morte do estudante Felipe de Paiva. Nesse ano, para reprimir os estudantes que ocupavam a reitoria da universidade contra a presença da PM no campus, foi chamado um efetivo militar de mais de 400 policiais, contando com a presença da cavalaria, transformando a universidade numa verdadeira "praça de guerra que relembrava a época da ditadura", segundo declaração do próprio ouvidor da PM na época.

Em 2013, a PM entrou novamente pra prender dois estudantes e torturá-los no camburão. Ano passado reprimiu de maneira violenta trabalhadores e estudantes, chegando a atirar com bala de borracha a curta distância, colocando em risco a vida dos presentes. Agora em 2015 entraram para reprimir um protesto contra os ataques do governo durante a paralisação nacional do dia 29 de abril.

O papel que cumpre a presença da polícia no campus é o de reprimir os lutadores e enquadrar jovens de fora da comunidade USP. Após firmado o convenio com a PM, os índices de violência não diminuíram, pelo contrário os números de furtos,roubos e assaltos aumentou em 5%. Prova de que não é aumentando o policiamento que a violência dentro do campus vai ser resolvida. A entrada de policiais na universidade vem a serviço dos interesses da reitoria e da alta burocracia universitária para coibir as atividades de cunho político e social e reprimir as possíveis manifestações, como na histórica greve de 118 dias no ano passado. Mantendo o caráter elitista da USP fechando-a para a população, como fizeram com dois jovens negros ao invadir o Núcleo de Consciência Negra para prendê-los.

Existe uma diferenciação no tratamento entre os estudantes e pessoas que não fazem parte da comunidade universitária, estudante da USP não deve ser tratado da mesma forma que os pobres na periferia, como José Gregori coloca em seu depoimento: "Quem está lá é, a rigor, um aluno com valores, maneiras de ver, diferenças históricas em relação a qualquer tipo de policiamento truculento. [O projeto] não se trata de uma coisa como nos velhos tempos, de dar primazia a uma visão policial".

Argumentos como esse servem para preservar o abismo existente entre a universidade como pólo de conhecimento científico e tecnológico e as necessidades da população. Universidades como USP, UNESP e Unicamp são bolhas de excelência cada vez mais voltadas para os interesses das grandes empresas privadas. A sensação de insegurança dentro dos campi é gerada devido ao fato desses locais permanecerem fechados para a população e isolados da realidade cotidiana. O esvaziamento provocado pela apropriação privada, necessitando de policiamento e segurança, de um espaço que deveria ser público e aberto para a população é que faz da USP um local propício para casos de violência.

Ao se colocarem contrários a presença da polícia no campus, certos setores do movimento estudantil, também se colocam contrários ao papel exercido pela polícia nas favelas, morros e periferias. Não queremos mais policiamento nas universidades, enquanto a polícia mata todos os dias os jovens que são impedidos de entrar pelo filtro social do vestibular. Resolver o problema da violência dentro do campus passa por reconhecer que as universidades são bolhas isoladas da realidade e que para acabar com os casos de estupros, roubos e furtos é necessário pegar o cerne das contradições de uma universidade cada vez mais elitista e fechada para a população.

Contudo isso não significa que não podemos tomar medidas imediatas que visem diminuir os casos de violência. Como melhorar a iluminação, aumentar a frota de circulares no campus e romper com o isolamento da universidade em relação à sociedade. Abrindo as universidades e seus campi para que eles sejam espaços de lazer, cultura e diversão não só para os membros da comunidade universitária, mas para toda a população ao redor dela.


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USP    Juventude



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