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Crise na Ucrânia | Mesmo com recuo parcial de tropas russas, Ucrânia se mantém espremida em um impasse

Enquanto os EUA de Biden, a OTAN e a mídia imperialista buscam inflar as perspectivas de uma invasão Russa, Putin anunciou o recuo parcial de tropas russas em exercícios militares na fronteira ucraniana. Mas as condições antagônicas para uma negociação de desescalada conformam um profundo impasse, bem como a retomada do acordo de Minsk (2015).

quarta-feira 16 de fevereiro de 2022 | Edição do dia

Foto: Reprodução Eyepress via Reuters

A concentração de tropas russas na fronteira com a Ucrânia, incrementada no segundo semestre de 2021, é a resposta defensiva de Putin e da oligarquia capitalista russa ao avanço político e militar da OTAN no leste europeu e no conjunto do entorno russo desde a desintegração da União Soviética em 1991. Recentemente, o imperialismo norte-americano e europeu vêm escalando a presença militar da OTAN no leste da Europa, sob a alegação de que a Rússia estaria preparando uma invasão militar contra a Ucrânia. Putin, por outro lado, nega que tenha uma ocupação como objetivo e usa das mais de 100.000 unidades militares estacionadas e em exercícios próximos da fronteira ucraniana como força de negociação para uma série de exigências russas, entre elas que Ucrânia e Geórgia permaneçam fora da OTAN e que esta retire sua presença militar do leste europeu e dos territórios das ex-repúblicas soviéticas.

Nos últimos meses, o imperialismo ocidental, liderado pelos Estados Unidos, buscou de todas as maneiras afirmar que a Rússia estaria preparando uma “invasão iminente”, o que é tomado em Moscou - e dentro da própria Ucrânia - como um alarmismo deslocalizado para provocar tensões. Biden e seu conselheiro de Segurança Nacional, Jake Sullivan, chegaram até mesmo a pedir aos aliados e norte-americanos em território ucraniano que abandonassem o país em 48h, agitando uma perspectiva de conflito imediato que foi seguida pelo Reino Unido, Dinamarca, Noruega, Estônia, Letônia, Holanda, Japão e Coreia do Sul.

Porém, não só a Rússia afirma que não planeja uma operação assim e ridiculariza a “histeria” criada (em que Moscou tem uma boa dose de responsabilidade), como o próprio governo ucraniano confirma que não é o caso de uma ameaça imediata de invasão. Após uma reunião com o Conselho de Segurança Nacional, o próprio presidente ucraniano comunicou que “não há motivo para pânico”, pois os militares ucranianos avaliam que não estão dadas as condições técnicas para uma invasão russa, e pediu a Joe Biden que os EUA e a OTAN baixassem o tom.

Eis que nesta terça-feira (15), Vladimir Putin confirmou, durante uma coletiva de imprensa ao lado do chanceler alemão Olaf Scholz, o início da retirada de parte das tropas russas. "Sempre dissemos que depois das manobras as tropas voltarão para seus quartéis de origem. E é isso que está acontecendo agora. É o procedimento habitual", comunicou o porta-voz da Presidência russa, Dmitri Peskov. A crise, porém, segue aberta.

Órfão de Trump e isolado politicamente na América Latina, Bolsonaro viajou para se reunir com Putin em Moscou e Orbán na Hungria, tentando desesperadamente alguma projeção internacional para esse ano eleitoral. A coincidência com o anúncio de retirada de tropas russas, é claro, levou seus seguidores da estúpida extrema-direita brasileira a tentarem aproveitar o momento e espalhar a incrível fake news de que o irrelevante presidente brasileiro teria convencido Putin de não iniciar uma terceira guerra mundial. Porém, no âmbito da geopolítica das grandes potências, a principal resultante dessa visita deslocalizada foi o uso do encontro, por parte de Putin, para provocar Biden, que evidentemente não quer a Rússia se aproximando do principal país da América Latina, pátio traseiro do imperialismo estadunidense.

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No mesmo dia do anúncio do recuo militar, a câmara baixa do Parlamento russo votou solicitar a Putin o reconhecimento da independência das duas regiões separatistas apoiadas pela Rússia na Ucrânia, uma medida que irrita o nacionalismo ucraniano anti-russo. O reconhecimento das “Repúblicas Populares” de Donetsk e Luhansk retoma o entravado conflito civil no leste da Ucrânia, onde os enfrentamentos entre os militares ucranianos e separatistas apoiados por Moscou já deixaram 15 mil mortos entre combatentes e civis.

A Rússia acusa o governo ucraniano de não respeitar os acordos de Minsk, que voltam ao debate geopolítico diante da nova crise. Porém, não só ela, como também as potências ocidentais estão exercendo pressão para que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, cumpra com esses acordos de pacificação do Donbass de 12 de fevereiro de 2015. Quanto a isso, o governo ucraniano não indica qualquer interesse, por temer um aumento da influência russa no país. Os acordos implicariam em um cessar fogo com retirada de armamentos pesados, em eleições e autonomia política para as regiões rebeldes de Donetsk e Lugansk, na anistia geral, na retomada do controle das fronteiras pela Ucrânia, na retirada de tropas e armas estrangeiras do território ucraniano (algo que contempla muito o interesse de Putin) e em uma reforma constitucional federalizante.

Via de regra podemos dizer que, quem dá a linha política geral do conflito é Washington, onde parece se impor que a necessidade de conter a Rússia não deve atrapalhar o objetivo principal de conter a China. Biden já foi advertido pelos serviços de inteligência norte-americanos que uma aliança entre China e Rússia teria melhores condições de resistir às represálias econômicas dos Estados Unidos, o que já pode ser visto no desenvolvimento de sistemas independentes de transferência financeira e sistemas digitais, usados por Washington como armas políticas. Ambos os países acompanham atentamente os planos estadunidenses de militarização do espaço e construção de um sistema global anti-mísseis, bem como de uso de mísseis nucleares de curto alcance - ameaças muito maiores à região do sudeste asiático do que ao leste europeu. Aqui se inserem as declarações chinesas de apoio às demandas de Moscou por “garantias de segurança a longo prazo” na Europa, e seu coro no repúdio à qualquer expansão da OTAN

A Ucrânia é um Estado com diferentes identidades nacionais, que permeiam esse país historicamente submetido a diferentes centros de poder político, cultural e religioso. Uma diversidade que, longe de ser a causa dos problemas que hoje os trabalhadores e o povo pobre desse país enfrenta, é utilizada pelos dois lados, que querem ou que ela converta em uma base do neoliberalismo ocidental contra a Rússia, ou em um satélite da oligarquia russa no leste da Europa. Contra a ingerência econômica e política dos EUA e da UE na região, é preciso lutar contra a escalada imperialista da OTAN, a verdadeira causa da militarização da região, mantendo claro que os planos do governo autoritário de Putin e do capitalismo russo só oferecem uma saída reacionária para a região.

Leia também: Abaixo a escalada militarista dos Estados Unidos e da OTAN no Leste da Europa! Declaração da Fração Trotskista - Quarta Internacional (FT-QI)




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