A Universidade de São Paulo, segundo as diretrizes adotadas por suas últimas administrações, reproduz a ideia de que não basta explorar as pessoas, é preciso maltratá-las, pois se já não bastassem a preservação de uma estrutura autoritária, a repressão sobre estudantes, professores e servidores, com vigilância, catracas, sindicâncias e até espionagens, a negação ao diálogo, a redução drástica do quadro de servidores, o desrespeito aos direitos de sindicalização e de greve, o incentivo à privatização por meio de fundações e apelo à terceirização, fazendo vistas grossas à Constituição, e o desestímulo à carreira docente de dedicação integral à universidade, chegou-se agora ao ponto da explicitação de uma violência gratuita, que só se explica mesmo a partir daquela noção.
quarta-feira 11 de novembro de 2015 | 16:13
A Universidade de São Paulo, segundo as diretrizes adotadas por suas últimas administrações, reproduz a ideia de que não basta explorar as pessoas, é preciso maltratá-las, pois se já não bastassem a preservação de uma estrutura autoritária, a repressão sobre estudantes, professores e servidores, com vigilância, catracas, sindicâncias e até espionagens, a negação ao diálogo, a redução drástica do quadro de servidores, o desrespeito aos direitos de sindicalização e de greve, o incentivo à privatização por meio de fundações e apelo à terceirização, fazendo vistas grossas à Constituição, e o desestímulo à carreira docente de dedicação integral à universidade, chegou-se agora ao ponto da explicitação de uma violência gratuita, que só se explica mesmo a partir daquela noção.
Ora, os trabalhadores dos bandejões da USP vinham há muito denunciando as péssimas condições de trabalho a que são submetidos. Denunciam que quase 45% dos trabalhadores dos restaurantes, da capital e do interior, têm restrições médicas devido a lesões causadas pelo trabalho exaustivo e repetitivo. Aduzem que os trabalhadores repetem até 12 mil vezes o mesmo movimento por semana; manipulam toneladas de carne, arroz, feijão e verduras; trabalham em ambientes com temperaturas elevadíssimas, vapor constante, sem falar do assédio das chefias. Relatam, ainda, a ocorrência de inúmeros casos, diários, de queimaduras, cortes e outros acidentes. Afirmam, por fim, que os trabalhadores sofrem com tendinite, bursite, hérnias de coluna e cada vez mais estão adoecendo psicologicamente com sintomas de depressão, síndrome do pânico, surtos de choro e ansiedade, pois não suportam o ambiente de trabalho, sendo que outros tantos já fizeram cirurgias nos pulsos e carregam pra sempre essas cicatrizes.
A situação, aliás, é notória. Basta ir a um restaurante da USP para presenciá-la.
Pois bem, diante de tudo isso, no dia 18 de setembro, os servidores dos restaurantes Central e Física, aderindo ao dia de luta da classe trabalhadora contra os ataques do governo e dos patrões, decidiram paralisar as atividades, para exigir do superintendente da SAS (Superintendência de Assistência Social) a adoção de melhores condições de trabalho e mais contratações de servidores.
E o que fez a administração da USP? Dialogou com os servidores, de modo a procurar atender a sua justa reivindicação? Nada disso. Ao contrário, cortou o ponto desses trabalhadores...
Assim, para a administração da USP assiste-lhe o direito de submeter pessoas a condições desumanas de trabalho, direito este, inclusive, que vem acompanhado do direito de punir aqueles que se rebelarem contra a situação. Ou seja, pensa a administração que teria não apenas o direito de explorar o trabalhador em condições desumanas, mas também o de maltratá-lo, punindo-o no caso de algum tipo de rompante de dignidade.
O Direito do Trabalho, no entanto, não corrobora a visão da administração da USP. Quando se interrompe o trabalho para garantir a integridade física e moral ameaçada pela própria condição de trabalho, o Direito não exclui, antes protege, o exercício da autodefesa dos trabalhadores em face de direitos fundamentais ameaçados, vez que esta é a parcela mínima da dignidade humana.
Portanto, diante de um ato legítimo de resistência, marcado pela negação de continuar trabalhando em condições adversas à saúde, não pode, de forma alguma, o empregador cortar salários, vez que isso representaria a negação da condição humana dos trabalhadores, além de constituir uma espécie de “salvo-conduto” ao descumpridor de direitos fundamentais.
Assim, nos posicionamos pela urgente reversão do corte de salários dos trabalhadores dos bandejões por parte da administração da USP.
Jorge Luiz Souto Maior - professor Direito do Trabalho e Seguridade Social da FDUSP
Marcus Orione Gonçalves Correia - professor Direito do Trabalho Seguridade Social da FDUSP
Paulo Eduardo Vieira de Oliveira - professor Direito do Trabalho Seguridade Social da FDUSP
Guilherme Guimarães Feliciano - professor Direito do Trabalho e Seguridade Social da FDUSP
Ronaldo Lima dos Santos - professor Direito do Trabalho e Seguridade Social da FDUSP
Flávio Roberto Batista - professor Direito do Trabalho e Seguridade Social da FDUSP
Rodrigo Ricupero - professor do Departamento de História da FFLCH/USP
Sean Purdy - professor do Departamento de História da FFLCH/USP
Maria Luisa Sandoval Schmidt – Docente do Instituto de Psicologia da USP
José Augusto Amorim - Advogado Trabalhista Natal/RN
Tarso de Melo - doutor em Filosofia do Direito pela FDUSP
Regiane de Moura Macedo - Advogada
Mariana Benevides da Costa - - Advogada, Especialista em Direito do Trabalho pela FDUSP
Lara Porto Renó - Advogada, Especialista em Direito do Trabalho pela FDUSP
Sílvia Mourão - Advogada
Maria Maeno - Médica e Pesquisadora da FUNDACENTRO
Paulo Fernando Nogueira Cunha - Assessor jurídico no Ministério Público do Trabalho, pós-graduando em Direito do Trabalho na USP
Paula Marcelino - professora do Departamento de Sociologia da FFLCH/USP
Rosangela Sarteschi - professora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH/USP
Ciro Teixeira Correia - professor do Departamento de Mineralogia e Geotectonica do IGc/USP
Adrián Pablo Fanjul - professor do Departamento de Letras Modernas da FFLCH/USP