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TRAGÉDIA | Incêndios arrasam Portugal: tragédia natural ou negócios por trás das chamas?

Segundo a Autoridade Nacional de Proteção Civil portuguesa, 150 focos de chamas permanecem ativos, 13 deles grandes. Mais de 4000 efetivos combatem as chamas, com 1425 veículos terrestres e 24 aviões. 4 pessoas morreram e há centenas de feridos.

sexta-feira 12 de agosto de 2016 | Edição do dia

O alcance da catástrofe

O incêndio causou até esta quinta-feira quatro mortes. Uma mãe e sua filha, assim como uma pessoa cega faleceram em suas casas na ilha de Madeira e um guarda florestal no território continental (em Santarém). Um terço dos efetivos se concentra na Águeda, no distrito nortenho de Aveiro, onde nesta quinta se mantém ativos quatro focos de incêndios graves que preocupam pelo forte vento. Os outros sete focos de grandes dimensões estão nos distritos de Porto, Braga, Viseu, Vila Real e Viana do Castelo. Apesar de não se ter dados da quantidade de hectares chamuscados, esta onde de incêndios faz recordar a dos anos de 2003, 2005, 2010 e 2013, que fizeram de Portugal o Estado da UE mais castigado pelos incêndios.

O Mecanismo de Proteção Civil foi ativado, um programa europeu de resposta imediata a catástrofes, como confirmou a ministra do Interior, Constança Urbano de Sousa. “Estamos sob condições meteorológicas extraordinárias que não são previsíveis, nem possíveis de dominar pelo ser humano”, disse a ministra. A União Europeia mobilizou na tarde de quarta-feira um avião anfíbio Canadair procedente da Itália que se soma aos outros dois enviados pela Espanha. O Governo marroquino anunciou nesta quinta que mandará outros aviões. Os aviões Canadair enviados pelo Marrocos não ajudarão, no entanto, a sufocar o incêndio de Madeira porque a ilha “não tem as condições operacionais”, explicou Urbano de Sousa. Segundo a ministra do Interior, é responsabilidade do Governo regional de Madeira pôr em funcionamento os pontos de abastecimento necessários para que possam operar os veículos aéreos.

O governador de Madeira declarou que o fogo que nesta quarta ameaçava o centro histórico da capital, Funchal, se encontra “sob controle”, apesar de se manter em várias frentes. O Parque Ecológico ficou queimado em mais de 50%. Cerca de mil pessoas foram evacuadas; 600 passaram a noite em uma base militar portuguesa e outros 300 no estádio Barreiros, em Funchal, segundo o prefeito Paulo Cafofo.

O hotel Castanheiro teve que ser evacuado devido às explosões de gás provocadas pelo fogo. Um centro comercial e outro hotel de cinco estrelas nas redondezas de Funchal, o Choupana Hills, foram consumidos pelas chamas. Na capital da ilha principal, em Funchal, três pessoas perderam a vida, outras 300 ficaram feridas. A maioria das pessoas evacuadas já puderam voltar a seus domicílios. Calcula-se que o incêndio queimou 208 casas. As investigações policiais possibilitaram a identificação de um jovem de 24 anos, morador de Funchal, como possível autor de alguns dos incêndios desatados nos últimos dias na ilha Madeira.

Porque ano após ano os incêndios continuam?

O eucalipto, uma espécie muito abundante na ilha Madeira, pode contribuir para que o fogo se propague mais rapidamente, já que deixa muita biomassa no solo, que queima rapidamente. Apesar disso, e de Portugal ser um dos países mais castigados pelos incêndios nos últimos anos, o eucalipto é a árvore que ocupa a maior superfície no país, “em vez do sombreiro o pinheiro”.

Rui Barreira, técnico florestal e membro da organização World Wild Fund (WWF), explica que a existência de duas grandes empresas de celulose no país, Altri e The Navigator Company, são a razão para haver tantas plantações de eucalipto, que é matéria prima para a fabricação da pasta de papel. O interesse econômico reside no rápido crescimento desta árvore, que a torna mais rentável. O ecologista criticou a falta de recursos destinados à prevenção: “Portugal gastou em 2014 setenta milhões na extinção de incêndios, e vinte para preveni-los”, afirma. “Entre domingo e quinta-feira foram queimados entre 40.000 e 50.000 hectares”, disse Barreira.

Assim, destacamos que a falta de meios de prevenção e o mau planejamento econômico e ambiental das terras, são os elementos que favorecem que os incêndios em Portugal se propaguem com maior facilidade e sejam de maiores dimensões. Sobre o excesso de massa florestal de eucalipto, a situação lembra à da Galicia, onde a empresa papeleira ENCE, situada em Pontevedra, é o que faz com que se siga cultivando eucalipto para a fabricação da pasta de papel, com as consequências ambientais que isso supõe.

Por outro lado, também está nítido que tal quantidade de incêndios ativos de forma simultânea e nas piores condições meteorológicas possíveis, somente pode ser obra de planejamento intencional. Está claro que as causas dos incêndios são naturais, em sua maior parte, e não humana, e cabe perguntar se existem interesses econômicos por trás desta barbárie. No caso da Galicia, no Estado espanhol, isso parece claro. Mais ainda quando a nova Lei de Montes permite requalificar o terreno queimado para a construção, favorecendo a especulação imobiliária. Também é possível que haja interesses de companhias mineradoras ou outras empresas que queiram explorar zonas que até então estavam protegidas. O parque natural de Peneda-Gerés, próximo à província de Ourense, foi açoitado pelas chamas nos últimos dias.

O que está evidente é que se trata de um problema estrutural, já que entre 2000 e 2013 Portugal queimou 1,3 milhões dos 3,5 milhões de hectares que queimaram na Europa neste período. A solução não passa somente por ser “mais severo” com o que provoca os incêndios. Mas intervir na prevenção, contratando pessoal durante todo o ano, e por uma distinta organização das terras. Menos eucalipto, mais diversificação agrícola. Por outro lado, uma união das terras, em regime de cooperativa, permitiria aos agricultores e camponeses portugueses aumentar seus ganhos, otimizar a limpeza e a prevenção dos incêndios. E organizar melhor a vigilância contra os incendiários que colocam em perigo sua economia e suas vidas.




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