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ATIVIDADE INTERNACIONAL | Importante atividade com Christian Castillo: crise mundial e as tarefas da esquerda latinoamericana

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

quarta-feira 27 de julho de 2016 | Edição do dia

O MRT realizou nesta terça-feira, em São Paulo, uma importante atividade internacional sobre a crise mundial e a situação da esquerda na América Latina, que reuniu dezenas de companheiros, militantes e independentes, com o referente da esquerda argentina Christian Castillo, ex-deputado estadual pela província de Buenos Aires e dirigente do PTS (Partido dos Trabalhadores Socialistas, organização irmã do MRT).

Castillo contou os grandes avanços feitos pela Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) na Argentina, e do PTS em particular, fruto da preparação do período anterior, de forte inserção na classe trabalhadora e de construção de frações revolucionárias nos movimentos de mulheres e de juventude, que possibilitou aproveitar o “fim de ciclo” dos governos ditos “progressistas” na América Latina para mostrar uma alternativa anticapitalista e socialista de independência de classe frente ao kirchnerismo como força material.

Remarcou-se a importância de que no Brasil tenhamos desde o MRT marcado com personalidade uma correta posição política de independência de classe diante do golpe institucional da direita, que foi fortalecida pelo governo do PT, incapaz de combater o golpe. Essa posição, difundida cotidianamente em centenas de artigos, reflexões e vídeos no Esquerda Diário, preparou o terreno para que possamos avançar na tarefa de construção de um partido revolucionário no Brasil, em meio a um importante processo de reorganização da esquerda no país e a crise política do PT que abre grandes espaços para a intervenção das ideias da esquerda.

Buscar intervir audazmente com as ideias revolucionárias em meio à crise mundial

Uma das principais ideias do debate foi que é preciso trabalhar sobre o fenômeno político em curso no Brasil, um país que passou pelas Jornadas de Junho e pela onda de greves operárias em 2014, e com a continuidade da crise mundial (que se fez sentir com força a partir de 2013) é atravessado por um processo de polarização social e político que coloca em crise os partidos tradicionais, sua casta política e o próprio regime da democracia dos ricos. Para usar os termos do comunista italiano Antonio Gramsci, um período de crise orgânica.

Nas primeiras décadas do século XX Gramsci teorizava que o fracasso de um “grande empreendimento”da classe dominante podia abrir um período de “crise orgânica”, ou seja, um período que diferentemente de “movimentos de conjuntura” punha em primeiro plano contradições fundamentais que não poderiam ser resolvidas pela política habitual. Assim, a crise mundial está desenvolvendo elementos de crise orgânica em alguns países centrais do capitalismo mundial, como vimos no Reino Unido com o Brexit, ou a crise do bipartidarismo tradicional nos Estados Unidos.

Isto leva, segundo a definição de Gramsci, a que amplos setores de massas se separem de suas representações políticas tradicionais e surjam novas formas de pensar. O que se pode ver pela esquerda, com distintas variantes de um neoreformismo “pós-socialdemocrata” (Podemos no Estado espanhol, Syriza na Grécia, ou o fenômeno Sanders nos EUA) que capitaliza provisoriamente o espaço à esquerda da socialdemocracia clássica, tornada social-liberal. Ou pela direita, com partidos xenófobos e racistas como o UKIP (Partido da Independência do Reino Unido) ou a candidatura reacionária de Donald Trump nos EUA.

No caso da América Latina, vemos diferentes níveis de crise orgânica em base à decadência de “grandes empreendimentos” de conciliação de classes como o chavismo na Venezuela, o kirchnerismo na Argentina e no Brasil com o petismo, todos governos de desvio das grandes mobilizações de massas que atravessaram o subcontinente no início do século XXI. Isto se expressa com a chegada ao governo de formações de direita, como o empresário Macri na Argentina, ou Temer a partir do golpe institucional no Brasil.

Portanto, ainda que haja poucas lutas em curso (crise orgânica não implica automaticamente um aumento d aluta de classes) existe um enorme espaço ideológico para intervir com as ideias dos revolucionários. E é preciso intervir em todos os campos de batalha, inclusive no terreno inimigo das eleições.
Castillo relatou como o PTS, em base a sua profunda inserção no movimento operário e as experiências nos principais processos da luta de classes como as experiências de fábricas ocupadas (Zanon, Madygraf, entre outras) e batalhas como Kraft e Lear, emergiu como a principal organização da esquerda argentina também no terreno eleitoral com a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), uma frente política de partidos que se reivindicam trotskistas e que defendem um programa de independência de classe, delimitado dos governos “progressistas” e dos neoreformismos e populismos, com o objetivo de alcançar um governo dos trabalhadores que rompa com o capitalismo e o imperialismo.

A experiência da FIT contradiz a hipótese de que “entrar na política significa corromper-se” ou “não é possível ganhar influência em amplos setores com um programa anticapitalista”. Mostra que é possível conquistar peso em setores de massas sem abandonar a luta para que o movimento operário se transforme em sujeito político, avance das lutas sindicais à militância política e construa um partido com independência de classe que lhe seja próprio.

Mas os elementos de crise orgânica, como dissemos, exigem que os revolucionários não se limitem a participar das lutas que haja e dos processos eleitorais a cada dois anos. É necessário influenciar cotidianamente a subjetividade dos trabalhadores buscando acelerar o avanço da consciência de classe. Por isso lançamos a Rede Internacional de diários digitais La Izquierda Diario, uma experiência inédita na esquerda mundial que combina os meios técnicos mais avançados à disposição do século XXI com a potência das ideias revolucionárias, chegando em 11 países e em cinco idiomas, para fazer um verdadeiro “Leninismo no século XXI”.

A isto chamamos “Leninismo no século XXI”, pois a maior experiência de organização da classe trabalhadora com “seu” partido político foi a que conduziu Lênin entre os anos de 1912-1914 com um periódico revolucionário (Pravda, “A Verdade”) que assentou as bases para uma organização centralizada do marxismo russo, o Partido Bolchevique, no processo que culminou na Revolução Russa de 1917.A “revolução copernicana” que queremos operar em todos os grupos que impulsionam a Rede de diários é gerar e fortalecer uma rede de milhares de colaboradores e correspondentes para que o Esquerda Diário sirva de organizador coletivo da força dos trabalhadores, das mulheres e da juventude, caminho de construir partidos revolucionários a nível nacional e internacional.

Esse sistema combinado de ações em todos os terrenos, fundado na intervenção nos principais processos de luta de classes e aprofundando a inserção nos locais de trabalho e estudo, permite escapar dos dois perigos a um grupo revolucionário, seja rebaixar o programa e abandonar os objetivos estratégicos a serviço de “crescer”, seja preservar os princípios sem qualquer ambição de intervir na realidade com audácia, vegetando num abstencionismo sectário que não enxerga as oportunidades abertas pelos fenômenos políticos.

Após o que foi colocado por Castillo sobre a situação argentina e latinoamericana, abriu-se um debate no plenário a partir de analogias frutíferas com a situação brasileira pós-golpe institucional, e como atuar na realidade nacional.

Discutiu-se que o desafio de impulsionar uma grande ofensiva com o Esquerda Diário e organizar a militância ao redor de uma forte campanha com as candidaturas do MRT está em função de contribuir a que este processo de debates e reorganização da esquerda nacional, que não é nem golpista nem adaptada ao PT, possa se dar em chave revolucionária, o que para nós deve passar por experiências práticas em comum na luta de classes. Além disso, deve passar por debates programáticos e políticos que definam uma delimitação clara de independência de classes tanto frente ao PT, quanto aos governos latinoamericanos e fenômenos neoreformistas (Podemos, Syriza, ou mesmo Sanders e Corbyn). Estes são debates chave a se fazer para pensar qualquer tipo de Frente de Esquerda no país, que para nós não devem repetir os erros grosseiros das “Frentes” já compostas na história recente, mas refletir e pensar o exemplo que é a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores na Argentina.

Nem é preciso dizer a importância de entender o novo cenário pós-golpe institucional no Brasil, que possui relevância para toda a região, bastando ver como a esquerda golpista – em especial o PSTU – saiu muito golpeada durante o primeiro semestre, com uma ruptura de centenas de militantes que conformaram o MAIS – Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista).

No Brasil, lançamos as candidaturas anticapitalistas do MRT (utilizando a filiação democrática pelo PSOL, frente ao regime eleitoral absolutamente antidemocrático) em São Paulo, Santo André, Campinas, Contagem-MG e no Rio de Janeiro para expressar e organizar milhares de vozes anticapitalistas que queiram batalhar contra o golpe da direita a partir de uma estratégia independente do PT, utilizando o Esquerda Diário como poderoso instrumento de difusão destas ideias e como “organizador coletivo” de milhares de correspondentes no movimento operário, de mulheres e da juventude para intervir na realidade e construir essa força material.

A atividade foi uma importante experiência internacionalista para fortalecer a convicção de que as ideias revolucionárias podem se converter em força material em meio à crise mundial, que é também uma enorme crise ideológica da burguesia, e que é preciso preparar-se para os grandes momentos decisivos de revolução e contra-revolução que se avizinham, anunciados pelas barbáries capitalistas de guerras, a crise dos refugiados e a emergência da extrema direita, mas também por importantes expressões de esquerda como a poderosa luta dos trabalhadores e jovens na França ou o ressurgimento da ideia socialistas nos Estados Unidos, que devem rumar a construir as ferramentas políticas dos trabalhadores para acabar com esta sociedade de exploração e opressão e erguer um mundo que mereça ser vivido.




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