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GRÉCIA | Greves e protestos contra o governo Syriza

Diego LotitoMadri | @diegolotito

terça-feira 26 de maio de 2015 | 00:36

A “lua de mel” com Syriza, se é que se pode dizer que houve tal coisa, chegou ao seu fim. Nesta quinta feira, os hospitais públicos gregos celebraram sua primeira greve contra o governo. O respaldo popular à estratégia de negociações do governo com a Troika caiu de 72% a 35% em menos de três meses. A Grécia se aproxima cada vez mais de uma “tempestade perfeita”.

A quinta feira Grega amanheceu com seu sistema de saúde paralisado. Os médicos e os trabalhadores dos hospitais públicos protagonizaram uma greve de 24 horas para exigir do governo Syriza-ANEL que desembolse os fundos prometidos para a já colapsada saúde pública.

Nos hospitais funcionaram apenas serviços mínimos e centenas de médicos e trabalhadores da saúde se manifestaram em frente ao Ministério de Saúde para exigir o cumprimento de suas reivindicações.

A greve é a primeira do setor desde as eleições de 25 de janeiro. Seu objetivo principal é conseguir “um calendário preciso das reformas prometidas pelo novo governo e a destinação de fundos aos hospitais”, declarou Efe Dimitris Varnavas, presidente do sindicato de médicos de hospitais públicos OENGE.

“Necessitamos de financiamento para deixar de ter pacientes em macas nos corredores dos hospitais. Além disso, devem pagar nossas horas extras desde janeiro”, disse Jrisula, maqueira em um hospital de Atenas.

Ao término do protesto em frente ao ministério, os médicos e trabalhadores da saúde marcharam até o Parlamento e a sede do Governo, mas a polícia os impediu de continuar sua marcha até a sede do Executivo.

A rebelião de parte desse setor não responde apenas à dramática situação da saúde grega, que sofreu cortes orçamentais drásticos desde a eclosão da crise capitalista.

O pano de fundo são as novas medidas de “austeridade” impostas pelo governo de Syriza. Ao final de abril, o governo votou no Parlamento uma lei que obriga todos os organismos dependentes do Estado (desde os municípios, para todo os hospitais e todo o sistema de saúde) a colocar a serviço do governo suas reservas em caixa, com objetivo de liquidez para fazer frente ao pagamento de juros da dívida que reclamam seus credores.

A lei provocou a fúria de municípios de toda a Grécia, que recaiu principalmente sobre um de seus vice-ministros de finanças, Dimitris Mardas. Após ficar sabendo da aprovação da lei, uma reunião da União de Municípios (KEDE, sua sigla em grego), que foi até Mardas, resolveu quase por unanimidade por chamar resistência e não entregar um centavo de suas reservas orçamentárias.

A greve da saúde é a primeira resposta dos trabalhadores a esta política do governo. Como também são as manifestações de pensionistas contra os ajustes no sistema de seguridade social que afetam as pensões em Atenas, realizada na quarta-feira passada.

Por enquanto, fundos de pensões e de desemprego estão a salvo, mas ninguém põe as mãos no fogo para dizer que o governo não vai usá-los para o pagamento da dívida.

A queda de popularidade do governo

Apesar de própria formação do governo com os direitistas da ANEL (gregos independentes) ser um primeiro sinal de alarde, o partido do primeiro ministro Alexis Tsipras, Syriza, contava até agora com o apoio popular, que não havia cessado de crescer desde as eleições de 25 de janeiro. Até agora.

Se em março 72% dos gregos respaldavam a estratégia do Executivo nas negociações com a Troika (ou com as instituições, como eufemisticamente chama agora Syriza ao mesmo quadro de poderes imperialistas – a Comissão Europeia, o BCE e o FMI), o índice de aprovação acaba de despencar para 35%, segundo votação realizada pela Universidade de Macedônia.

O debate sobre a possível saída grega da zona do euro, desperta um sentimento dividido. Ainda que lentamente o medo ao “Grexit” começa a perder terreno. Na pesquisa de um mês atrás, 56% dos entrevistados disseram ter medo deste cenário, considerando que agora apenas 50,5% mantém esta posição.

Os 56% dos entrevistados creem que o Syriza não está cumprindo o que disse antes das eleições, frente a 39% que consideram o governo está cumprindo suas promessas. Um conjunto que mostra que a paciência do povo grego está se esgotando.

O prazo de junho: em direção à “tempestade perfeita”?

A chave das negociações estaria centrada nas “condições de cumprimento” do atual programa, que vence em junho, antes da extensão do “resgate” que vai até o outono boreal, segundo um funcionário de alto escalão da Comissão Europeia.

Para chegar a este ponto, o Executivo grego vem fazendo todo tipo de ajustes e concessões. Entre as últimas, a substituição da equipe de negociadores gregos, pondo de lado Yanis Varoufakis após a reunião do Euro-grupo de 24 de abril, o que agradou os dirigentes da UE.

Outra grande medida foi o desembolso de 750 milhões de euros pagos na semana passada ao FMI, para qual Atenas utilizou parte de um fundo especial de urgência do Banco Central heleno e esteve a bordo de tomar emprestado dinheiro dos caixas municipais.

Mas o fato inegável é que Atenas está caindo sem liquidez para enfrentar os 1500 milhões em vencimentos de junho. Por não falar dos vencimentos de julho e agosto da dívida contraída com o Banco Central Europeu, no valor de 6.700 milhões de euros, que pendem sob a cabeça do governo.

Daí que os negociadores estão apressando o ritmo nas últimas horas para evitar que se siga a “tempestade perfeita”: a cessação de pagamentos, combinada com a queda do apoio ao governo entre a população e reverdecer da luta de classes.

Cenários, de mal a pior

Neste marco, crescem as especulações sobre os distintos cenários que se abririam caso a Grécia caia sem dinheiro e não chegue a um acordo com os credores.

Antes de sair do Euro, o Governo de Syriza-ANEL teria várias opções, ainda que nenhuma delas seja muito popular: desde estabelecer um “corralito” ao estilo Argentina pós-2001 que impeça a fuga massiva de capitais de seus bancos, até estabelecer uma “moeda paralela” – outro experimento utilizado na Argentina -, um espécie de neodracma.

No entanto, a ideia que vem ganhando mais força nas últimas semanas é a possibilidade de eleições antecipadas ou de um referendo sobre a política do governo.

Este último cenário contaria a aprovação de muitos dos líderes imperialistas da União Europeia, que veem que a “opinião pública” grega mais conservadora, atemorizada pela possibilidade da “Grexit”, permite a Tsipras consolidar seu giro a direita e legitimar um novo programa de ajustes “a la Syriza”.

Mas seja qual a variante que se imponha, nenhuma delas responde aos interesses da classe trabalhadora e dos castigados setores populares da Grécia.

Desde o acordo com a Troika de uma prorrogação de quatro meses de seu resgate financeiro, no fim de fevereiro, o governo de Tsipras prepara as condições para uma nova capitulação, seja através de um acordo na mesa de negociação ou mediante saídas mais “complexas”, como um referendo que leve a uma nova era de “austeridade de esquerda”.

Até poucos dias, setores da ala de esquerda do Syriza pediram abertamente a ruptura com os credores. “É necessário escolher entre o acordo de austeridade, que se pode advinhar, e a opção de romper com os credores. Syriza não pode transformar-se em um partido que apoie a austeridade, tão pouco o governo pode aplicar o memorando (programa de resgate)”, afirmaram os organizadores de um debate que foi realizada na terça feira em Atenas.

Contudo, essa perspectiva de “ruptura” é estéril se não retomarmos o caminho da luta de classes, nas ruas, nas fábricas e empresas, nas escolas e universidades. Para acabar com a chantagem da Troika e romper com “as instituições” imperialistas da União Europeia e seus memorandos, que jogam o povo grego na miséria e no desespero, é necessário retomar e aprofundar o caminho das mobilizações, com o objetivo de impor a anulação de dívida e um programa de medidas anticapitalistas para que quem pague a crise seja quem a gerou.

As trabalhadoras, trabalhadores e o povo grego, que têm demostrado uma enorme vontade de luta com mais de 30 greves e paralizações gerais, contra a Troika e os governos capitalistas, e agora voltam a sair à luta, são a única força capaz de impor esta saída.

Nesse caminho, desenvolver solidariedade e mobilização internacional dos trabalhadores e dos povos da Europa é a grande tarefa do momento.




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