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O ABORTO E A REFORMA TRABALHISTA | Gestantes em trabalhos insalubres: o direito à vida que é negado pelos patrões

Os falsos “defensores da vida”, que negam o aborto legal, seguro e gratuito, são os mesmos que negam o direito à maternidade com medidas como esta da reforma trabalhista. Enquanto forem submetidas a condições precárias, as mulheres seguirão abortando. E enquanto o aborto for ilegal, continuarão morrendo.

quarta-feira 1º de agosto de 2018 | Edição do dia

(Arte Andrea Freire)

Entre os vários absurdos que carrega a recém-aprovada reforma trabalhista do governo Temer, um dos mais polêmicos é o ponto que dispõe que mulheres grávidas podem seguir trabalhando em locais insalubres de nível baixo e médio, ou seja, locais que apresentam risco de contaminação ao feto. Na última quarta-feira Geraldo Alckmin, dando continuidade aos planos de Temer e seu governo golpista contra os trabalhadores, declarou que seu acordo com os partidos de direita do chamado “centrão” esteve condicionado a manter a reforma trabalhista intocada, mantendo inclusive a questão das gestantes trabalhando em locais insalubres.

Desta forma, os mesmos que se dizem incansáveis defensores do “direito à vida” roubam o direito à maternidade de inúmeras trabalhadoras com esse tipo de medida. E as consequências perversas da reforma trabalhista para as gestantes não param por aí. Caso seja demitida, a mulher terá apenas 30 dias para informar a gravidez à empresa para garantir seu direito de estabilidade, o que prejudica aquelas que descubram suas gestações já em estado avançado. Além disso, anteriormente, nos primeiros 6 meses de vida do filho, a lactante tinha direito a dois intervalos diários de meia hora para amamentar. Após a reforma, que coloca o negociado acima do legislado, servindo na prática para os patrões colocarem sua vontade acima da dos trabalhadores, a definição dos horários para amamentação será feita mediante esse tipo de acordo.

Essa reforma só agrava o descaso ao direito à maternidade, que nunca foi respeitado na realidade. Quantas mulheres não passaram já pela situação de serem barradas nas seleções de das agencias de emprego por estarem grávidas? Ou quando empregadas terem a resposta do RH pra sua licença maternidade através de uma demissão? Nos trabalhos terceirizados, que serão fortalecidos pela reforma trabalhista os permitindo até para serviços-fim, já é uma prática comum esse assédio moral às mulheres, dizendo que caso engravidem perderão o emprego por que a empresa não vai arcar com sua licença maternidade. Além da negação do direito a exercer a maternidade de forma plena vinda através da obrigação da dupla ou tripla jornada de trabalho de muitas mães. O que significa trabalhar as 8, 9 ou até 10 horas em uma empresa e depois ir direto para segunda jornada, cuidando da casa para que a comida, roupas e tudo que seja necessário, esteja garantido para que a família possa voltar a trabalhar para o patrão no dia seguinte. Dentro desses afazeres as mulheres que trabalham precisam dar algum jeito de ter tempo e dedicação para “exercer seu direito a maternidade” cuidando dos filhos, o que com a falta de creches só evidencia mais como é o sistema capitalista quem tira praticamente todas as possibilidades das trabalhadoras de serem mães plenamente.

A trabalhadora da indústria de alimentos, Katy Balaguer, uma das protagonistas na luta pelo direito ao aborto legal que está tomando as ruas da Argentina nos últimos meses, fala sobre as condições precárias que as mulheres são submetidas:

“Trabalhei com companheiras que vinham à fábrica enfaixadas para que a chefia não visse a barriga da gravidez que, embora fosse desejada, poderia ser motivo de demissão. E com outras companheiras que perderam a gravidez devido aos ritmos exaustivos da produção (...). Tive que ajudar colegas de trabalho a aliviar a dor dos seios endurecidos, por ter que voltar à linha de produção e a não poder amamentar. Eu trabalhei com companheiras que queriam ter filhos e não podiam, enquanto nos intervalos líamos revistas onde as mulheres ricas e famosas podiam acessar métodos de fertilização assistida que eram inacessíveis às trabalhadoras. Íamos a consultórios onde os médicos ‘defensores da vida’ se recusaram a fornecer anticoncepcionais ou colocar o DIU gratuito, mas o faziam em clínicas particulares.”

Com tantas condições precárias, a alternativa que muitas mulheres encontram é a de interromper a gravidez, coisa que entretanto é criminalizada em nosso país. Desta forma, as mulheres pobres, que não têm como pagar de 3 a 7 mil reais por um aborto seguro em uma clínicas com médicos de forma clandestina aceitam fazer o procedimento em troca do dinheiro, buscam procedimentos caseiros inseguros ou formas clandestinas absurdamente precárias que levam a estatística de 4 mulheres martas por dia no Brasil, segundo a OMS.

Enquanto essa situação perdurar, as mulheres seguirão abortando. E enquanto o aborto for ilegal, continuarão morrendo. Os falsos “defensores da vida”, que em nada se importam com a vida das mulheres e de seus filhos, se utilizam desse discurso para defender que tudo continue como está: os empresários lucrando com a precarização das nossas vidas e as clínicas clandestinas de aborto lucrando com a triste realidade das mulheres. Não promovem campanhas efetivas e acesso garantido e de qualidade a métodos contraceptivos, para que não seja necessário abortar. Restringem cada vez mais o acesso a educação sexual nas escolas o que serve para que se possa decidir quando engravidar.

O Estado, que não passa de um grande balcão de negócios dos empresários, prefere criminalizar as mulheres que abortam em vez de resolver aquilo que as leva a abortar, pois para isso precisaria garantir melhores condições de vida e de trabalho, o que passaria também por fornecer educação e saúde públicas de qualidade. É sabendo que as mulheres que abortam não podem ser presas ou mortas que precisamos arrancar que o aborto seja legalizado e fornecido gratuitamente. Para isso, é preciso fazer o oposto do que o PT realizou nos seus 13 anos de governo, rifando essa pauta para manter seus acordões, nem podemos ter a mínima ilusão no STF reacionário como pretende o PSOL. Precisamos lutar no Brasil como fazem as argentinas, e a partir da organização de mulheres Pão e Rosas batalhamos para que os sindicatos e organizações coloquem todo o seu peso para construir essa luta e trazerem a maré verde para nosso país.




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