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Sudeste Asiático | Forte onda de protestos na Indonésia contra a reforma trabalhista e ambiental

Nesta quinta-feira, ocorreu na Indonésia a terceira jornada de protestos acompanhada de greves de trabalhadores contra uma reforma legislativa que corta os direitos trabalhistas, especialmente para as mulheres, e ameaça o meio ambiente. Essa jornada foi marcada por confrontos com a polícia a qual prendeu 800 manifestantes na capital, onde milhares de pessoas se mobilizaram.

sábado 10 de outubro de 2020 | Edição do dia

Os sindicatos indonésios compartilharam nas redes sociais vídeos mostrando cenas com milhares de manifestantes, em sua maioria com máscaras, em locais como Jakarta, Purwakarta ou Semarang, os três na ilha de Java, cantando o hino nacional. Segundo os sindicatos, pelo menos 2 milhões de trabalhadores participaram dos protestos e da greve desde terça-feira, ao mesmo tempo em que as agências de imprensa EFE, Reuters e Associated Press relataram que somente milhares participaram. Os sindicatos estudantis disseram que também se uniriam a eles.

Em alguns casos, houve enfrentamentos com a polícia e, em um incidente, as autoridades implantaram grupos “antidistúrbios” de controle de motins que usaram gás lacrimogêneo e caminhões de bombeiros quando os manifestantes tentavam quebrar uma barreira policial a uns 750 metro do palácio presidencial em Jakarta, a capital.

O presidente indonésio Joko Widodo estava no estado de Kalimantan em uma viagem a trabalho sobre a segurança alimentar na área, o que provocou acusações de que ele estava fugindo dos protestos na capital, o que seu gabinete negou, mas o presidente não se pronunciou sobre as acusações, relata o jornal Jakarta Post.

As manifestações, em sua maioria pacíficas, começaram na terça-feira em todo o arquipélago asiático. Vários sindicatos chamaram a greve para mostrar sua rejeição a uma bateria de leis aprovadas na segunda-feira pelo parlamento indonésio, que revisava umas 75 leis e regulações, visando, segundo o governo, a criação de empregos e “atrair os investidores”. Trabalhadores de centenas de fábricas se mobilizaram pelas diversas ilhas, centralmente em Java e Papúa. Um exemplo é a greve das 1.100 trabalhadoras, que começou na terça-feira no PT Aneka Tuna Indonesia, uma fábrica de conservas de peixe e a Pasuruan Regency.

Um porta-voz da Confederação Nacional de sindicatos (KSPN) disse: “Vamos morrer pelo coronavírus ou morrer pelo sistema. Não sabemos como morreremos. Mas ainda podemos mudar o sistema. Portanto, vamos marchas até ganharmos”.

A reforma visa atacar os direitos trabalhistas da classe trabalhadora com as novas leis, como o salário mínimo e alguns benefícios de desemprego, e haveria também uma flexibilização das regulações ambientais que terão um impacto destrutivo sobre uma região já muito danificada por inundações e incêndios.

“A Federação Nacional de Sindicatos (KSPN) anunciou na terça-feira ter criado uma equipe especial para estudar a longa bateria de leis com a intenção de ir ao Tribunal Constitucional para contestar os artigos que violem a Carta Magna indonésia e ataquem os direitos dos trabalhadores”, informou hoje o Jakarta Post.

Durante um discurso antes da votação, o ministro de Coordenação para Assuntos Econômicos, Airlangga Hartarto, argumentou que a reforma era necessária para “facilitar o investimento estrangeiro”.

O que diz a lei?

Ademais, a reforma elimina o salário mínimo setorial, em favor dos mínimos estabelecidos pelos governadores regionais e que são mais baixos. Reduzirá a indenização por demissão a um máximo de 19 meses de salário, dependendo do tempo de serviço do trabalhador em seu emprego, enquanto antes o pagamento máximo era de 32 meses. Além disso, um novo fundo governamental proporcionará um pagamento adicional de seis meses aos recém-desempregados, um subsídio que cobre as empresas. As horas extras permitidas serão aumentadas para um máximo de 4 horas em um dia e 18 horas semanais. As empresas deverão dar aos trabalhadores somente um dia livre na semana ao invés de dois, o que é uma violação do descanso e do lazer.

Os regulamentos de subcontratação também foram reduzidos, assim como as restrições aos empregos que os imigrantes podem trabalhar. A lei também relaxa os padrões ambientais, obrigando as empresas a apresentar uma análise de impacto ambiental se seus projetos forem considerados de alto risco.

Entre as 75 leis do projeto de quase 1.000 páginas estão os ataques diretos a mulheres trabalhadoras. As licenças-maternidade e os dias de menstruação já não serão mais pagos. Esse ataque em particular tem mobilizado milhares de mulheres pelas ilhas de Guiné e Java que compõem o arquipélago.

Indonésia, um arquipélago complexo

Indonésia, o quarto país mais populoso do mundo com cerca de 300 milhões de habitantes espalhados por 17.000 ilhas, com uma comunidade muçulmana esmagadora, mas com uma diversidade étnica, religiosa e cultural que honra a sua divisão territorial. Além disso, é a décima sexta economia mundial - tomando como referência o Produto Interno Bruto (PIB) -, estando junto de outros países do sudeste asiático, tais como Vietnã e Tailândia, em termos de investimento estrangeiro.

Nesta região, está ocorrendo uma competição atroz para seduzir o deslocamento gradual de empresas de fabricação simples da China em meio a uma guerra comercial agressiva com os Estados Unidos, o qual busca melhores condições competitivas. O governo indonésio precisa posicionar o país como um atrativo de investimentos as custas de destruir os direitos das classes oprimidas.

Estima-se para esse ano uma diminuição do PIB de 0,6 a 1,7% como consequência das medidas impostas para combater a pandemia do Covid-19, o que supõe a primeira recessão que o país sofre desde a crise financeira do sudeste asiático de 1997-98 que derrubou Suharto. Esta crise será descarregada, como vemos, sobre as costas da poderosa classe trabalhadora indonésia.

A Indonésia também vem das lutas sangrentas de uma juventude combativa que em 2019 enfrentou fortemente a reforma penal que atacava penalmente as decisões sexuais e as escolhas ideológicas. Será difícil o governo de Widodo avançar seus planos.




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