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Greve de recenseadores | "Fizemos concurso público pra receber menos que um salário mínimo" declaram recenseadores de Natal/RN

Neste 1 de setembro, recenseadores de todo o país realizaram um dia de greve para exigir o pagamento dos direitos desses trabalhadores e denunciar as más condições de trabalho. Os recenseadores são concursados temporários e recebem por produção, e estão com seus salários defasados conforme o prometido pelo IBGE. As taxas por coleta do Censo variam por região e estão abaixo do Censo de 2010, portanto com mais do que os 12 anos de inflação em déficit. Nós do Esquerda Diário nos solidarizamos ativamente com essa luta e disponibilizamos o nosso jornal para os depoimentos desses trabalhadores.

quinta-feira 1º de setembro de 2022 | Edição do dia

Em Natal/RN, que tem cerca de 2600 recenseadores, houve uma ação na Praça Cívica, em frente à sede do IBGE, onde entrevistamos alguns dos trabalhadores em luta. Confira os depoimentos, os quais garantimos o anonimato desses trabalhadores. Envie você também seu depoimento para o número (84) 999075821

ED: Por que vocês estão fazendo greve hoje?

1) A gente ta fazendo isso por causa da dificuldade da gente receber pagamento né. Que a gente fechou o setor assim, e tão dizendo que a gente só vai receber depois de 15 dias. Aí fica nessa demora. O cartão de passagem também é muito pouco dinheiro, já gastei tudo já em menos de um mês. E ta sendo difícil também andar pelo setor, pelas casas. O pessoal dando recusa e não tendo conhecimento sobre o Censo. A má divulgação do Censo né. Isso tudo ta dificultando o trabalho.

ED: Por que você está aderindo à paralisação do IBGE hoje?

2) Porque todos nós hoje estamos aqui lutando pelos nossos direitos, os nossos direitos são um salário justo, um dinheiro justo pra que a gente receba, por que tem pessoas que não estão recebendo por aquilo que estão trabalhando. Pessoas que passam até mesmo um mês trabalhando no final de semana, no sol na chuva, tomando “não” na cara, pra receber 100-200, 300 reais, que não cobre nem a alimentação que a gente gasta pra se manter no setor, pra comprar uma água, comprar um protetor solar. Nem protetor solar nos forneceram. O dinheiro da passagem nem muitos receberam. Então estamos hoje lutando por esses direitos que são os mínimos né, que é o mínimo dos direitos que estamos pedindo hoje. Então é por isso que estamos aqui.

ED: E como você vincula a atuação do governo com essa situação do IBGE?

2) Deplorável. Deplorável. Da ladeira pra baixo, pode contar mais abaixo, por que a situação é deplorável. Todo mundo aqui estudou pra um processo seletivo, um concurso público, aparentemente governo federal, ou seja, pra não receber um salário mínimo. O IBGE quer retratar o Brasil da melhor maneira possível, mas o nosso retrato tá deplorável. Ta de indignação.

ED: E o que que você acha que devia ser a atitude dos estudantes em relação a movimentação de vocês?

2) Creio que a atitude dos estudantes seria muito importante, até por que aqui no âmbito do IBGE, os trabalhadores a maioria são pessoas que estudam, que até estão concluindo o ensino médio, ou que estão na faculdade, fazendo uma graduação, e pegou esse trabalho como uma forma de suprir uma necessidade que todo mundo hoje ta tendo uma necessidade básica muito grande. Então assim, é muito importante pra gente que todos venham a aderir essa paralisação especialmente os estudantes, que colaborem conosco, por que muitos de nós também somos estudantes.

ED: Por que você aderiu à paralisação hoje?

3) Eu vim reivindicar direitos que a gente tem. Eu fui a segunda turma a entrar né, e até hoje a gente fez um treinamento e no treinamento a gente tinha que receber um valor e até hoje, vai fazer um mês que não recebemos. E também segurança, a gente tem que ter o vale alimentação, a gente passa o dia trabalhando, eu mesmo passo o dia, mas eai, eu tenho que comprar meu almoço e até hoje não recebi nada. E outra coisa, essa história de que a gente tem que fechar o setor todinho pra poder receber o dinheiro, quando você pega um setor grande, muito grande? A gente só vai poder, aí tem as ausências, a gente tem que ir várias vezes naquela casa, naquele domicílio pra aquela pessoa responder o questionário, as vezes a gente não é bem atendido e várias outras coisas que deixam muito a desejar.

ED: A gente do Esquerda Diário acha que é necessário que as centrais sindicais como a CUT e CTB, assim como a UNE convoquem um plano de lutas pra gente poder reivindicar nossos direitos. Inclusive a própria precariedade do contrato de vocês é fruto da reforma trabalhista que tirou nossos direitos. Queria saber o que vocês acham dessa proposta, de que todos os setores que se reivindicam da esquerda exijam um plano de lutas para exigir os nossos direitos.

3) É essencial que exista. E outra coisa, a gente não tem registro na Carteira [de Trabalho]. Recenseadores não tem esse registro na Carteira. Quando a gente terminar aqui a gente num vai receber os nossos direitos que tem né.

ED: Por que você está aderindo à paralisação hoje?

4) Por causa dos baixos salários, porque prometem pra gente um salário que não é compatível com o que ta sendo pago. Por causa do atraso [no pagamento] e também pelas exigências que eles estão fazendo de apenas 5% de ausências e toda falta de suporte. A gente sai pra rua de noite muitas vezes, e não tem ninguém pra ligar quando precise, então a gente tá querendo melhores condições para poder trabalhar.

ED: A gente do Esquerda Diário defende que as centrais sindicais da CUT e CTB construam um plano de lutas né, junto a UNE, pra lutar contra os ataques que estão acontecendo. Até por que a situação do Censo é reflexo da reforma trabalhista, de não ter direitos trabalhistas. Queria saber o que você acha dessa proposta.

4) Ah eu concordo. Inclusive tentei falar com o sindicato do pessoal do IBGE, eles me ajudaram a redigir uma carta pra entregar ao diretor do estadual, que vai ser assinada pelos recenseadores que estiverem aqui. Mas eles não conseguiram mandar ninguém aqui pra participar com a gente. Então eu gostaria que eles pudessem participar mais e ter apoio dos sindicatos, porque nós somos trabalhadores também e os sindicatos é um jeito da gente se organizar e lutar contra essa falta de direitos que tá acontecendo né.

(Carta de reivindicações entregue pelos recenseadores de Natal aos coordenadores do IBGE)

Qual a situação do Censo de 2022?

Sem o Censo não se sabe informações básicas, como o aumento populacional, o nível de emprego e renda, a identificação de cor e raça, dentre muitos outros indicadores sociais, culturais e econômicos. Esse “retrato” do Brasil que promete a pesquisa, depende do trabalho dos recenseadores batendo de porta em porta de todos os domicílios do país. Mas o retrato do trabalho desses recenseadores é de precarização e descaso.

Trabalhando no sol, sem alimentação e tendo que pagar o transporte de seu próprio bolso, o Censo 2022 está praticamente contando com a boa vontade dos recenseadores e recenseadoras. São mais de 200 mil funcionários contratados temporariamente, entre recenseadores, agentes censitários e coordenadores, e todos acumulam uma perda de pelo menos 20% na sua remuneração, para não falar no absurdo que é um recenseador não ter direito ao transporte e a alimentação, que deveriam ser pagos pelo governo federal

Censo 2022 | IBGE atrasa pagamento a recenseadores devido aos cortes de Bolsonaro

O governo Bolsonaro, junto ao Congresso Nacional, reduziu a verba do Censo em mais de R$1 bilhão, passando de R$3,4 para 2,3 bilhões do que estava previsto para a realização da pesquisa. Milhares de recenseadores, como os que conversamos em Natal, sequer receberam o valor do treinamento realizado em julho, de R$40,00 por dia. E em grande parte dos que pediram adiantamento ou até dos que finalizaram os setores (condição preestabelecida para o pagamento), receberam um valor muito abaixo do esperado, ou sequer receberam.

Uma situação que fruto direto desse corte realizado pelo governo. Como denunciavam cartazes pelo país, os recenseadores estão sendo tratados como escravos do Censo, o que se evidencia com a precarização do trabalho desses setores, que tem contratos temporários e pagamento por produção.

Além disso, o IBGE está impondo regras para fechamento do setor que não foram acordadas previamente, como os 5% de ausências/recusas por setor, e inclusive exigindo que os trabalhadores retornem muito mais do que as 4 vezes necessárias para realizar as entrevistas, atrasando ainda mais o pagamento.

Essa realidade de verdadeiro calote do IBGE com os recenseadores é fruto também das condições de trabalho impostas pela reforma trabalhista, que precarizou ainda mais o tipo de contrato de recenseadores, agentes censitários e coordenadores.

É preciso lutar para aumentar o orçamento do Censo, por reajuste de 27% à todos envolvidos no Censo 2022, contratação dos temporários como parte do quadro do IBGE, garantia de pagamento do Vale transporte para o recenseador, e o direito ao vale alimentação para os recenseadores, com reajuste do alimentação para todos, já que atualmente o valor pago é de R$ 458,00 apenas para os Agentes Censitários e deveria ser reajustado para o valor da cesta básica. É urgente que o sindicato do IBGE unifique os efetivos e terceirizados pela reversão dos cortes de Bolsonaro, por reajuste e melhores condições de trabalhado dos recenseadores.

As centrais sindicais, como a CUT e a CTB, precisam romper com a sua trégua eleitoral com Bolsonaro e organizar, junto a UNE, um plano de lutas urgente para unificar os trabalhadores em luta contra os ataques do governo, pela revogação da reforma trabalhista e da previdência. Nenhuma dessas medidas será revertida por um eventual governo Lula/Alckmin, que se compromete junto aos grandes empresários e o capital financeiro a manter esses ataques. Somente a força organizada dos trabalhadores e da juventude, unificando trabalhadores efetivos, temporários, terceirizados, com o conjunto do movimento estudantil e sociais, é que pode dar um combate à extrema-direita e seus ataques, fazendo os capitalistas pagarem pela crise.




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