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MÉXICO - PANORAMA POLÍTICO | Eleições no México: cenários e perspectivas

terça-feira 16 de junho de 2015 | 00:01

Um atípico dia de urnas. O massacre de Iguala inaugurou um processo de históricas mobilizações no México e uma importante crise política. Mesmo que nos últimos meses tenha sido contido, o terremoto político que atravessou o país desde outubro se refletiu neste 7 de junho no descrédito das instituições e dos grandes partidos.

Isso se expressou também nas ações de protesto em várias localidades. O governo de Peña Nieto conseguiu contê-las mediante um espetacular operativo que blindou as eleições.

É verdade que as ações de boicote não impediram o processo eleitoral. Porém, deve-se considerar que a militarização das eleições mostrou para milhões em todo o país o caráter profundamente degradado da “paz democrática”. Um nítido símbolo do México de Ayotzinapa e um anúncio do que se pode esperar nos três últimos anos do governo Peña Nieto.

Desgaste político

Perdas e ganhos. O resultado das eleições é revelador pelo desgaste da alternância democrática e dos três principais partidos que caíram dos 81% de votos em 2009 para os 61% atuais.

O Partido Revolucionário Institucional (PRI) conseguiu – junto com seus aliados do Partido Verde e da Nueva Alianza – manter a maioria relativa de deputados, o que lhes permitirá, em acordo com o Partido Acción Nacional (PAN), avançar nos ataques aos trabalhadores. O branco-azul (PAN) se mantém como segunda força. Ambos conservam ou se alternam em diversos governos estaduais.

Mas o resultado tem que ser visto em sua dinâmica. O decréscimo eleitoral do PRI, com 29%, foi seu pior desempenho em eleições intermediárias recentes. Em 2009 obteve 37%. Além disso, perdeu a estratégica governança de Nuevo León e a prefeitura de Guadalajara. O resultado, para Peña Nieto, não é fácil de digerir, pois conseguir o primeiro lugar na eleição não é igual a obter um triunfo político incontestável. Em 2009 os 37% do PRI abriu o caminho para o retorno ao palácio Los Pinos. Os resultados recentes instalam questionamentos sobre a força que terá para encarar os três anos que ainda restam de governo.

O resultado do PAN é indiscutível: caiu para 21% dos votos e se abre um novo capítulo na batalha intestinal entre maderistas e calderonistas.

Entretanto, os custos políticos que estes partidos podem ser eclipsados pela queda vertiginosa do Partido de la Revolución Democrática (PRD).

A sombra de Ayotzinapa ou o ocaso do sol asteca. Em 14 localidades ficou abaixo do Morena. É sua menor votação nos últimos 20 anos, e perdeu importante parcela de sua força parlamentar. No Distrito Federal (DF) deixou de ser quase hegemônico para restar com apenas seis distritos e ficar em segundo lugar. Na Assembleia Legislativa o partido de Miguel Ángel Mancera deverá negociar com o Morena ou então se apoiar em acordos com o PRI e o PAN. Uma encruzilhada, olhando de qualquer ângulo.

Muitos setores populares e da juventude viraram as costas a um PRD “direitizado”, desacreditado por seus vínculos com a “narcopolítica” e o Pacto pelo México. O regime político tem, hoje, um problema quase estratégico: sua ala esquerda já não pode cumprir o papel de contenção dos protestos sociais.

No contexto de uma nova configuração institucional e política, o tripartidarismo tradicional estaria sendo sucedido por um emaranhado político muito mais fragmentado.

As expressões do descontentamento

O ascenso do Morena. Como dizia um analista, o voto ao Morena foi um voto do descontentamento. Centenas de milhares de trabalhadores e jovens votaram nele para castigar o PRD e se opor ao governo.

López Obrador se mantém na mesma política que caracterizou o PRD: democratização do regime e um capitalismo de “rosto humano”. O que muda em tudo isso é que ao passar a ser uma oposição quase “outsider” depois de sua saída do PRD se nacionaliza, adquire peso institucional e inclusive responsabilidade de “gestão”. No DF é a primeira força e governará mais de 2 milhões de pessoas.

Veremos como se ajeitará López Obrador para conciliar sua retórica opositora com sua atividade parlamentar e de gestão na Cidade do México, quando os que o apoiaram fariam uma nova experiência política.

A novidade... os independentes. Em Nuevo León a derrota do PRI alçou Bronco, e em Guadalajara Kukamoto chegou à legislatura. Outros candidatos exploraram o perfil de “renovação da política”, como Alfaro em Guadalajara que ganhou a prefeitura do PRI para o Movimiento Ciudadano. Tudo isso também foi expressão, no terreno eleitoral, do descrédito do PRI-PAN-PRD, gerando novos fenômenos políticos.

Reconhecer esta novidade é diferente de alimentar expectativas. Como dissemos aqui, o programa do ex-priista “Bronco” é conservador e procura o apoio do poder econômico regional, além de possíveis alianças com o PRI e o PAN e aproximação com Peña Nieto. Figuras com outro perfil, como Pedro Kukamoto (de Jalisco), exploram uma “nova política”, mas carecem de uma perspectiva alternativa aos partidos do regime político.

Peña Nieto buscou esconder os efeitos do ascenso dos independentes – a derrota do seu partido em Nuevo León e em Guadalajara – apresentando como demonstração do “caráter democrático” do regime. Um regime tão antidemocrático que nega direitos eleitorais às organizações operárias e de esquerda e que, inclusive no caso das candidaturas independentes, impõe draconianas e desiguais exigências.

Boicote e voto nulo, Ayotzinapa presente. O outro elemento novo foi o amplo movimento de oposição à farsa eleitoral. A abstenção, o boicote e a anulação de votos que foram um fenômeno real que se apresentou como continuidade da luta por Ayotzinapa.

O impacto do movimento pela anulação dos votos não pode se limitar à quantidade de votos nulos, que se aproximou aos níveis de 2009. O impacto foi fundamentalmente político. Diante dos que postulavam o “voto útil”, apareceram com força os que – como o MTS – propuseram um movimento militante pela anulação dos votos como expressão concreta de uma política independente do regime e seus partidos no terreno eleitoral. Tanto foi assim que os intelectuais próximos ao Morena tiveram que levar em conta e, como não se via antes, entabular ácidos debates como os que expressamos no La Izquierda Diario.

Cenários. As eleições mostraram o desprestígio e o descrédito dos partidos principais. A militarização e a repressão do 7 de junho indicam que o governo e o regime político buscarão frear o levante do protesto social e aproveitarão o atraso que significa a fraca entrada do movimento operário na cena política. Uma situação mais dinâmica com novos fenômenos políticos e de luta de classes, marcada, além disso, por nuvens pesadas na economia, pode sinalizar o que será o último triênio de Peña Nieto, abrindo o caminho para a irrupção dos explorados e oprimidos. A construção de uma esquerda socialista e revolucionária surge como uma necessidade inadiável para os próximos combates.




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