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GUERRA NA SÍRIA | EUA se adaptam ao plano de Moscou na Síria, apesar da guerra de informações

Juan ChingoParis | @JuanChingoFT

sábado 3 de outubro de 2015 | 01:26

Na Síria, como em todo conflito militar envolvendo atores regionais e globais, é importante separar o joio do trigo:

1. Desde o ponto de vista militar, é certo que os bombardeios russos não alcançaram por agora o Estado Islâmico. No imediato, as forças russas estão se concentrando em bombardear as posições fixas da insurgência nas províncias de Homs e Hama na Síria ocidental. Ambas províncias estão próximas a Lakatia onde as forças russas estão implantadas e tem como objetivo deter e assegurar esta região – e a área que a rodea, até a fronteira com a Turquia – frente aos ataques com foguetes improvisados pelas forças rebeldes.

2. Um ataque aéreo russo golpeou a cidade controlada pelos rebeldes de Talbisah, no norte da cidade de Homs. Está cidade está em mão do grupo afiliado a Al-Qaeda na Síria, Jabhat al-Nusra, outros grupos islâmicos duros como Ahrar al-Sham, e grupos rebeldes locais. O paradoxo é que os EUA colocam o clamor por um ataque russo em um fundamentalismo islâmico ligado à Al-Qaeda, ou seja, os mesmos grupos que lutaram no grupo Iraque e no Afeganistão.

3. Mas, além do todo o barulho ocidental, desde o ponto de vista militar estamos na presença de uma intervenção limitada da Rússia. As contradições internas e o fantasma da derrota no Afeganistão que ainda não se tem apagado, põem sérios limites a toda intervenção mais audaz neste terreno, como uma operação terrestre ou a imposição de uma zona de exclusão aérea e menos ainda contra os EUA e seus aliados, ou a utilização do sofisticado armamento, inclusive nuclear, que tem a Rússia.

4. Por outro lado, enquanto os Estado Unidos crítica a Rússia por não atacar – até o momento – o EI, a resolução militar norte-americana contra este grupo é ao menos questionável. Por exemplo, Arábia Saudita tem realizado 2,5 vezes mais ataques aéreos contra Yemen nos últimos seis meses que a coalizão de 62 estados encabeçada pelo EUA contra o EI. Esta falta de decisão nos atuais ataques estadunidense sobre o EI faz duvidar se o objetivo do EUA era mais um intento de regular seu tamanho e comportamento, que uma guerra séria para derrotá-lo. Ao menos até agora, se tem um giro político frente a seus objetivos no conflito sírio.

5. Por isso, o central está no campo diplomático. A realidade é que nos aspectos centrais, Putin tem forçado EUA a aceitar o plano russo. Veja mais sobre os motivos da invasão russa à Síria aqui*.

Na terça-feira, o secretário de Estado John Kerry realizou uma nova declaração, que equivale a uma troca muito significativa na política da principal superpotência. Em uma entrevista televisiva em Nova York e no marco da reunião da ONU, disse que EUA e Rússia estão de acordo em “alguns princípios fundamentais” na Síria.

Kerry assegurou em entrevista ao canal MSNBC que o encontro de 90 minutos entre Obama e Putin em Nova Iorque, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, tem um “acordo de que a Síria deve ser um país unificado, unido e secular, que o EI deve ser desmantelado e que é necessário que haja uma transição controlada”. E acrescentou que as diferenças se manteriam no que seria o resultado dessa transição.

Nunca antes os Estado Unidos haviam declarado que o estado sírio deveria ser secular no futuro, o que é uma bofetada na coalizão dominada pela Irmandade Muçulmana Síria no exílio e a todos os grupos islâmicos financiados e impulsionados pelos estados e monarquias do Golfo Pérsico, que lutavam por um estado baseado na Lei Islâmica. Seguindo esse acordo político fundamental, o Pentágono acordou estabelecer um canal de comunicação especial para coordenar a intervenção militar dos dois países.

6. Dado que nem os EUA nem a Rússia irá colocar todas as suas forças militares na Síria, a questão que se coloca é quem vai derrotar o EI. Embora no momento, todos os olhos estão sobre a Rússia e sua intervenção aérea limitada, o Irã é o único anti-rebelde que poderia pender a balança em uma operação de campo que extirpe o EI.

Atualmente,o Irã tem investido milhões de dólares na Síria, desde armas a combatentes, desde empréstimos a linhas de crédito. Tem intervindo através de agentes; principalmente Hezbolah do Líbano, que perdeu em torno de 1000 combatentes na Síria. Mas também, excepcionalmente, mediante o envio de alguns de seus próprios soldados da Guarda Revolucionária a batalha. Também tem criado milícias independentemente das forças armadas sírias, como xiitas do Iraque, libaneses e recrutas locais. A participação iraniana tem sido tão extensa que, segundo o Institute for the Study of War localizado na América do Norte, a estratégia do Teerã foi desenhada para assegurar que “possa seguir perseguindo seus interesses vitais sem e quando o regime caia”.

Haverá um salto de intervenção iraniana no conflito, aproveitando a janela de oportunidade que se abre com a mudança de posição dos EUA? Os EUA decidiram suspender todos os planos para armar os rebeldes sírios desde o dia 29, depois de saber que esses "rebeldes" deram munições e armas para Al-Nusra, e mais importante, os Estados Unidos deixarão de insistir na saída imediata de Bashar al Assad optando por uma "transição controlada”.

7. Isso não significa que o atrito entre os EUA e a Rússia continua, ainda mais com a lacuna aberta na questão estratégica entre eles, como mostrou a guerra da Ucrânia. Além disso, quando o movimento russo parece colocar esta já a atingir os seus objetivos de um lugar na mesa de negociações regionais e internacionais sobre a resolução do conflito sírio. Contra isso, Obama será cada vez mais confrontado com uma escolha de ferro, quer subir sua própria intervenção militar na Síria, que tem sido relutante em fazer por quatro anos, ou suavizar suas condições de transição governamental, no âmbito de um conflito regional que está perdendo o controle.

*Nota da tradução.




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